terça-feira, 24 de novembro de 2020

Autoramas lançam saborosa coletânea de raridades

Marcelo Moreira 



É uma coisa chique e sofisticada lançar álbuns com material alternativo e raro, os chamados B-sides (lados B de compacto/singles, geralmente) ou extras (canções com mixagens diferentes, vocais diferentes, ou mesmo construções diferentes, além de faixas ao vivo).

Esse tipo de expediente, geralmente dirigido a fãs fanáticos ou colecionadores, já foi mais disseminado na nossa música, mas perdeu espaço com a destruição da indústria fonográfica e os downloads indiscriminados e ilegais. Para muitos artistas, não faz mais sentido investir neste tipo de produto.

Ainda bem que os Autoramas não pensam dessa forma. Gabriel Thomaz, o vocalista, guitarrista e ávido colecionador de música, decidiu muita coisa boa nos arquivos da banda precisava ser editada e mostrada ao público e então temos o "B-Sides & Extras vol. 1", o novo disco da turma, compilado e editado em plena pandemia.

Poderia ser um álbum ao vivo, ou mais uma coletânea de maiores sucessos, ou alguma captação de live qualquer, mas a escolha foi acertada: em quase 25 anos de Autoramas, os arquivos de coisas bacanas devem estar transbordando.

Algumas canções são inéditas ou foram lançadas apenas em vinil, outras são de participações em coletâneas e programas de TV, e também versões especiais para rádio e videoclipes.

O provavelmente o nome mais importante do rock independente nacional, ao lado dos Boogarins e do trio The Baggios, mais novos, os Autoramas provaram que é possível ter sucesso e ser autossustentável em um mundo musical degradado, sem gravadoras e com muito menos fontes de patrocínio e financiamento.

Contribuiu para essa solidez artística a mudança do Rio de Janeiro para São Paulo, com as inevitáveis mudanças de formação. 

A dupla que comanda a banda, Thomaz e a vocalista Érica Martins, são casados e moram em Jundiaí, a 60 quilômetros de São Paulo, onde concentram todos os negócios relativos ao grupo. 

Em relativa tranquilidade - a cidade de 500 mil habitantes é um vulcão econômico -, mantiveram a serenidade (e a sanidade) na devastadora pandemia de covid-19 com bom humor e nostalgia. Foram seguidas lives e discotecagens ao vivo, pela internet, animando fãs e amigos. 

Com menos frequência, continuam fazendo isso agora direito do interior da Bahia, onde estão passando uma temporada para rever amigos e dar uma olhada no ambiente. 

Sem shows e com uma agenda mais livre, houve tempo para remexer no baú e encontrar coisas legais, como uma versão de "Blue Suede Shoes", um clássico na voz de Elvis Presley que a banda gravou ao vivo em 2005 em São José dos Campos (SP). A versão é bem saborosa, com a veia rockabilly de Thomaz fazendo a diferença.

Outra pérola é "Chance", sobra de "Nada Pode Parar os Paralamas", disco de 2003. Havia sido disponibilizado somente em um compacto de 7 polegadas pela Split Double Trouble com a banda The Tormento, uma parceria da Monstro Discos com o selo argentino Scatter Records.

E o que dizer de "Comida", dos Titãs, em uma versão bem mais rápida e divertida, embora sem o sarcasmo da versão original. A banda só havia tocado em programas de TV e a versão neste disco foi registrada no começo de 2020.

Outras duas músicas merecem destaque: "Quando A Polícia Chegar" (Acústico), um hit da banda que teve boa aceitação em diversas emissoras de rádio - essa gravação é de 2016; "Carinha Triste" é uma versão remixada pelo cantor Edu K, do DeFalla. A versão só esteve disponível no perfil dos Autoramas na TramaVirtual.

"Hotel Cervantes" e "Paciência" merecem menção por serem canções dos Autoramas registradas por Gabriel e Érika em Buenos Aires, na Argentina, com o apoio da banda local The Tormentos, em versões bem interessantes.

É um lançamento bem saboroso por ser uma coletânea de raridades e uma iniciativa perfeita para esses tempos de pandemia.
 

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