sábado, 19 de dezembro de 2020

Hard rock do bom para espantar o mau humor e o pessimismo da pandemia

 Marcelo Moreira



São várias as manifestações roqueiras que surgiram durante a pandemia de covid-19, que já matou 185 mil brasileiros e destruiu boa parte da economia. A maioria das músicas compostas e gravadas  melancolia e reflexão, sendo que algumas surgiram com raiva e outras, projetando esperança

Para o pessoal do hard rock nacional que canta em português, a perseverança deu o tom, mas também veio a raiva e a gana de mostrar seus novos trabalhos, expelindo a frustração incontida por conta do período sem shows e de confinamento.

Três forças do segmento lançaram singles durante a pandemia - Carro Bomba, Baranga e Golpe de Estado - e uma figura veterana lança um novo projeto para ocupar um espaço que anda meio vago.

"Brizio" é o álbum do projeto homônimo capitaneado pelo baixista Fabrizio Micheloni, ex-Carro Bomba e que aqui toca quase todos os instrumentos e canta. 

O músico foi corajoso ao apostar em uma área em que poucos se aventuram e que tem um apelo menor do que deveria. parece que as guitarras pesadas incomodam bastante os apreciadores de rock do ano 2021.

O som é cru, mas poderoso, trazendo boas ideias que estiveram soltas por aí nos trabalhos da concorrência e dos amigos. Sem firulas, é hard rock estradeiro e para curtir em momentos de diversão.

Quase caseiro, "Brizio" tem como ponto alto a energia e o peso, obtido com a ajuda do pessoal amigo do estúdio paulistano Orra Meu - peso, aliás, é especialidade da casa.

Se a produção enxuta e simples foi um acerto em relação aos instrumentos, os vocais ficaram um pouco deslocados, ora sobrepondo o instrumental, ora ficando um pouco abaixo. Não chega a comprometer, mas é um item que necessitará de ajustes em novas prensagens ou em outros trabalhos da banda.

É inevitável as comparações com o Carro Bomba, mas isso também é algo positivo, pois as referências são positivas. É som pesado e no talo, com o que há de melhor do hard rock atual. 

"Deixa a Canção Rolar" é a declaração de intenções da banda Brizio, abrindo o trabalho e fazendo a cama para a ótima canção "Vá Se Rebelar", mergulhando totalmente no rock básico e estrondoso, como tem de ser.

"Assim Que Te Querem" é igualmente pesada e veloz, propondo uma reflexão sobre assuntos contemporâneos, enquanto que "Recomeçar" fecha o CD em um gostoso southern rock que indica o futuro e a esperança. "Cadê o Amor, Porra" e "Meus Dias de Infância" seguem na mesma toada, e também são destaques.

O Golpe de Estado segue na trilha de recuperação do prestígio mais recente e que foi interrompida pela pandemia. A sequência matadora de shows de março de 2020 indicava que a banda estava em ponto de bala para apresentar material novo - "Direto do Fronte", de 2012, é o último álbum, ainda com o guitarrista Hélcio Aguirra, morto em 2014.

"A Fila Vai Andar" soa mais heavy e veloz, com guitarras poderosas de Marcello Schevano e os vocais ferozes e bluesy de João Luiz (ex-King Bird). É uma banda que dpende, e muito dos riffs, e o que mais temos aqui é isso, uma profusão de riffs. Vai na mesma pegada que o último álbum, com uma letra sarcástica e bem humorada, indicado que o próximo disco promete, e muito.

O Carro Bomba está enfiando o pé no acelerador e lança a terceira música neste ano pandêmico e desgraçado. É outra banda que aposta tudo em riffs estrondosos, como em "Claridão". Curiosamente, lembra os tempos do início do Golpe de Estado.

Rogério Fernandes está soberbo nos vocais que remetem, de leve, a Rob Halford, já que a influência de Judas Priest é imensa nesta canção - já tinha sido assim também nas duas músicas do single "Compactado", que são "Refugo" e "Lama".

É impressionante como a banda acerta em cheio na timbragem das guitarras e do baixo gordo e classudo, lembrando também o bom Accept dos anos 80. Uma das melhores canções do ano.

O Baranga, um dos nomes fortes do rock autoral desde sempre, preferiu não arriscar em "Não Largo o Rock Jamais", canção bacana e de alto astral, uma declaração de guerra a quem diz que o rock está morto e que está entocado ouvindo Morrissey e outros artistas depressivos para suportar a pandemia.

No quesito não quis arriscar, quero dizer que a banda colou de novo no AC/DC, desde a primeira nota até os riffs e solos contagiantes. Será mais uma homenagem à banda inspiradora?

Bacana de ouvir e contagiante, "Não Largo o Rock Jamais" é daquelas músicas despretensiosas que grudam no cérebro e caem como uma luva no combate à pandemia e seus efeitos nefastos. 

Se boa parte do rock nacional não está se engajando em uma luta severa contra o (des)governo genocida que empesteia o Brasil, ao menos se mostra incisivo para espantar o tédio e o mau humor o vírus insiste em espalhar.

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