Marcelo Moreira
"Temos que fazer isso antes que seja tarde." Foi assim que o baterista inglês Carl Palmer relembrou a última vez em que conversou com seus dois parceiros de toda uma vida em um dos mais emblemáticos grupos de rock da história, o Emerson, Lake and Palmer.
"Estávamos prestes a completar 40 anos de nossa fundação e os organizadores sugeriram que nos reuníssemos apenas para aquele show, em Londres. Abrace a ideia e fiz de tudo para dar certo. Acho que acertei", disse Palmer em sua última passagem por São Paulo com a sua Carl Palmer's ELP Legacy em 2017. Ele se referia ao último concerto da banda, no High Voltage Festival, em 2010, um show estupendo.
Palmer, Keith Emerson (teclados) e Greg Lake (baixo, guitarra e vocais) nunca foram amigos, mas também nunca se tornaram inimigos em uma convivência de 45 anos, sendo que, desses, só tocaram juntos por 16 anos. "Vocês não têm ideia do quanto eu respeitava aqueles caras", relembrou o baterista desviando do fato de que não eram amigos íntimos.
Faz cinco anos que Emerson e Lake morreram, enterrando definitivamente as chances de mais uma volta do trio de rock progressivo que se tornou exemplo de grandiosidade e autoindulgência no rock dos anos 70 - além, é claro, de sinalizar o ápice do cruzamento do rock com a música erudita.
Keith Emerson, o showman dos teclados, o Jimi Hendrix das teclas brancas
e pretas, sucumbiu a uma profunda depressão no começo de 2016, em consequência
de uma série de problemas de saúde que culminaram com dificuldades para tocar
como antes. Criticado duramente nas redes sociais e também em fóruns
especializados em música, suicidou-se aos 71 anos em sua casa, na Califórnia.
Ao final do mesmo ano, o discreto Greg Lake sucumbiu a um câncer aos 69 anos. Pouca gente que sabia de sua batalha contra a doença.
A celebração dos 40 anos foi o epílogo de uma trajetória extraordinária onde a qualidade musical e a integridade superaram as várias tentativas de fazer dinheiro fácil. Decidiram parar quando julgaram necessário, voltaram quando quiseram.
Greg Lake (esq.), Carl Palmer (centro) e Keith Emerson em 1972 (FOTO: DIVULGAÇÃO) |
Claro que sempre houve um bom dinheiro envolvido, mas sempre prevaleceu a vontade dos músicos, e foi assim que tocaram em 2010 ela última vez. Não estavam entusiasmados, não faziam muita questão, sabiam que não ficariam milionários, mas entenderam que a ocasião requeria um grande finale. Foi a grande vitória da persuasão de Palmer.
Unidos pela paixão musical e pelo virtuosismo, o Emerson, Lake and Palmer ficou conhecido também como ELP, e quase virou HELP, já que Jimi Hendrix tinha manifestado interesse em participar do então projeto, em meados de 1970. Morreu antes ter a oportunidade de visitar o trio no estúdio.
Foram dez anos de virtuosismo, megalomania, chiliques diversos, discussões homéricas e muita música de qualidade. Com o esgotamento da fórmula progressiva sem guitarras estridentes e assolados pela disco music e pelo punk, a banda acabou em 1980.
Cada um foi para um lado, sendo que Lake embarcou em carreira solo mais comercial e Palmer criou o Asia, ao lado de um supertime de feras - Steve Howe nas guitarras., John Wetton nos vocais e no baixo e Goeff Downes, ex-Yes, nos teclados -, uma experiência de muito sucesso e muito lucrativa.
Nos dez anos seguintes, o trio foi convencido de que faria muito dinheiro se voltassem a se reunir. Havia muita desconfiança e nenhuma vontade, em termos musicais, mas acabaram convencidos por números diversos.
A volta não aconteceu em 1986 porque Palmer não conseguiu se desvencilhar dos compromissos com o Asia, que já não tinha mais Steve Howe, que partiu para o GTR ao lado de Steve Hackett (ex-Genesis).
Emerson e Lake se irritaram porque demorou bastante para serem convencidos. Decidiram continuar em frente com outro P na bateria, o elétrico e talentoso Cozy Powell, ex-Rainbow e Jeff Beck Group. Houve um entrosamento inicial, mas Powell tocava muito pesado. Emerson, Lake and Powell durou apenas um disco e uma turnê americana.
Dois anos depois houve mais uma tentativa, mas desta vez Lake avisou logo no começo que não tinha interesse, desgostoso com o fracasso anterior e ainda bravo com as discussões acaloradas com o tecladista.
Livre do Asia, Palmer sugeriu a Emerson uma experiência com o produtor e multi-instrumentista americano Robert Berry. Estava criado o 3, que lançou apenas um disco, "The Power of the 3", um pastiche de Emerson, Lake and Palmer com Berry nos vocais.
Foi preciso que Palmer dedicasse dois anos de costuras e reuniões intermináveis para finalmente ressuscitar Emerson, Lake and Palmer em 1992 para as gravações de "Black Moon", lançado naquele mesmo anos.
Mesmo longe do auge, fizeram bonito até 1998, lançando mais um álbum de inéditas, dois ao vivo e uma caixa fantástica com canções raras e regravações de clássicos, "Return to the Manticore".
Para os três, era o fim definitivo até a convocação para High Voltage Festival, em 2010. Haveria a chance de alguma reunião após a celebração dos 40 anos?
"Muito pouco provável", disse Palmer em entrevista recente à Classic Rock Magazine. "Era mágico quando estávamos no palco, mas fora dele não conversávamos muito. Ficou a sensação, no High Voltage, que já era o bastante e que tudo estava encerrado. Claro que era uma celebração, mas ao final nos despedimos sem que estivéssemos esfuziantes. Com o perdão do clichê, a missão estava cumprida."
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