O underground proporciona situações inusitadas e uma interação com os fãs que vai além da música: eles viram parceiros, coautores e codiretores de muito eventos e iniciativas - como videoclipes e documentários.
A banda brasileira Dorsal Atlântica é a que mais se beneficia desse aspecto - é provavelmente a única banda de rock nacional com um cartel de minidocumentários que registram os principais shows e participações.
O primeiro show da Dorsal Atlântica em 24 anos, em fevereiro de 2022, no Circo Voador, no Rio de Janeiro, ganhou um tratamento profissional e narração do próprio vocalista e guitarrista, Carlos Lopes, a partir de vídeos enviados por fãs e amigos. Foi a abertura de um show do Sepultura, que escolheu o trio carioca para abrir o evento.
O show foi o que faltava para que a banda decidisse retornar aos palcos cm mais assiduidade, com direito a show em São Paulo depois de mais de 25 anos - palco foi o Parque da Juventude Città di Maróstica, em São Bernardo do Campo (ABC Paulista), fechando um minifestival gratuito de que reuniu mais de 5 mil pessoas.
O show paulista também virou um minidocumentário cm material colaborativo, evidenciando a importância da banda nas celebrações dos 40 anos de seu surgimento. Lopes quase não conseguiu deixar o palco diante de tamanho assédio dos fãs de todo o ABC.
"É natural que utilizemos esse expediente, eu recebo mito material de amigos e apreciadores do trabalho da Dorsal Atlântica e temos tido sucesso e utilizar essas imagens, ainda que de forma urgente e sem grande tratamento", diz Lopes. "Deu certo quando fizemos de forma quase artesanal o documentário sobre as gravações de nosso último disco, 'Pandemia'."
Com uma infinidade de acessos, o filme sobre "Pandemia" serviu para aproximar ainda mais os fãs e foi o empurrão que faltava para que o trio decidisse por retornar, mesmo que de forma cautelosa, aos palcos. A receptividade calorosa no Circo Voador e em São Bernardo foram a melhor prova de que a decisão foi acertada.
Sentindo-se em casa e desfilando pancadas sonoras em pouco mais de uma hora, Carlos Lopes se sentiu à vontade para mandar muitos recados e ministrar "aulas" de história e realidade diante de uma plateia majoritariamente jovem no ABC.
Em um, evento organizado pelo Coletivo Rock ABC e pela Prefeitura de São Bernardo (administrada pelo PSDB) e por um prefeito adversário ferrenho do PT, teve de se controlar, mas foi ovacionado e celebrado como uma das vozes mais ativas e engajadas politicamente do rock na atualidade, não deixando a desejar em relação a uma figura controversa, mas importante, como Tico Santa Cruz, dos Detonautas Roque Clube, que anda mais reservado ultimamente.
"Eu entendo o ponto de vista de quem organizou festival no ABC sei das implicações de se fazer 'campanha eleitoral antecipada', O foco principal é evitar a continuidade desse governo odioso e desumano", explicou o guitarrista, que foi acompanhado por Braulio Drumond na bateria e Alexandre Castellan no baixo, substituindo temporariamente Claudio Lopes, irmão de Carlos.
O evento foi histórico porque foi um respiro diante das trevas em que o país se encontra e um grande grito pela liberdade de expressão e em defesa da democracia.
A série de minidocumentários retrata com fidelidade o underground d rock pesado no Brasil e deixou claro, também, que eventos gratuitos bem organizados podem cumprir amplamente seu papel de difundir cultura de qualidade, engajada e impactante. E que bom que a juventude compareceu em peso.
A seguir, assista ao minidocumentário sobre o show de São Bernardo. em seguida, os outros dois citados neste texto:
https://www.youtube.com/watch?v=Es6VW_Tvb7U