O gaitista paulista Ivan Marcio costuma se apresentar ao ´público como um musico de blues e o "único brasileiro a gravar três discos solo em Chicago", que muitos consideram a cidade sagrada do blues e do jazz.
Capital? Existem muitas outras que reivindicam o título, como Austin (Texas), Nova Orleans (Louisiana), Los Angeles (Califórnia), Memphis (Tennessee) e Saint Louis (Illinois), mas nenhuma tem a aura de Chicago, que abrigou Muddy Waters, Willie Dixon, Robert Nighthawk, James Cotton, Buddy Guy, Junior Wells, Little Walter...
Chicago tem uma das cenas musicais mais empolgantes dos Estados Unidos. Portanto, faz sentido que Chicago também seja uma das melhores cidades do mundo para ver música ao vivo. Dito isto, não importa qual gênero seja o atual rei da cena musical de Chicago, esta cidade sempre será considerada peça central do blues e do jazz. A música de Chicago é simplesmente incomparável.
Rola a lenda de que foi nos lendários estúdios da Chess Records que Keith Richards, guitarrista os Rolling Stones, que ele viu um operário pintando as paredes para que os próximos clientes, os próprios Stones, fizessem algumas gravações em uma de suas primeiras excursões pelos Estados Unidos, na primeira metade dos anos 60.
Em entrevista a uma revista americana, ele contou que ficou chocado uando descobriu que o operário era Muddy Waters, então fazendo um bico em tempos de vacas magras.
Por vias tortas e estranhas, aquilo era, de certa forma, o espírito de Chicago, blues em estado puro. Nunca foi nada fácil para quem optou pelo blues. E outro paulista corrobora essa afirmação: o baixista Rodrigo Mantovani, atualmente músico e homem de confiança de Nick Moss, um dos mais prestigiados guitarristas de blues da atualidade.
Músico requisitado no Brasil e na Europa, celebrado pelas principais estrelas do blues, não pensou duas vezes antes de se mudar para Chicago e assumir o baixo da Nick Moss Band. Levou a mulher, a cantora paulista de blues e jazz Bia Marchese e está feliz da vida há mais de cinco anos n cidade.
"Conheci Moss em turnês ao longo dos anos pela Europa e ficamos muito amigos. Na primeira vez que me viu tocar ele afirma que ficou muito impressionado, a ponto de falar para a banda dele: 'Esse cara toca muito melhor do que nós' (risos)", disse certa vez em entrevista ao Combate Rock. "Quando surgiu a oportunidade de morar em Chicago e tocar com ele não pude dizer não. Foi uma decisão das mais acertadas".
"Chicago respira e transpira blues. A vida cultural é tão riquíssima que a gente aprese só de passear pelas ruas e ouvir os sons que surgem de todos os lugares", afirma o guitarrista paulista Giba Byblos, outro fã confess da cidade, que também considera o solo sagrado do gênero.
Ivan Marcio diz com todas as letras que jamais seria o músico que hoje, prestes a completar 30 anos de carreira, se não tivesse passado algumas temporadas em Chicago, tocando alguns dos maiores ídolos seus do blues em estúdio e nos bares.
"Sabe que é você curtir música que ama no balcão e, do seu lado, vem um senhor negro idoso e brica com todo mundo depois de um silêncio? E então Buddy Guy para do meu lado, pega uma bebida, me cumprimenta e puxa conversa", comenta o músico brasileiro. "Como não amar Chicago?"
Durante a Grande Migração (1910-1970), os afro-americanos migraram para Chicago vindos dos Estados do Sulista após o fim da Guerra Civil Americana (1861-1865), que opôs o Norte progressista e liberal ao Sul escravagista, racista e atrasado.
A guerra acabou com a escravidão dos negros, mas não conseguiu integrá-los à sociedade, tal como no Brasil. Os negros oram libertados, e abandonados à própria sorte na miséria. Sem empregos ou assistência social, foram expulsos das fazendas. Sem ocupação por conta da imigração europeia, engrossaram o êxodo para as grandes cidades do Norte, Meio-Oeste, Texas e Califórnia.
Por conta de sua melhor estrutura e tradição de receber migrantes, Chicago acomodou muitos dos que encararam o êxodo, ainda que não oferecesse boas condições de acomodação.
"No entanto, ainda assim era melhor do que no Sul, onde a violência e a miséria eram a tônica nos anos 30", contou Muddy Waters (1913-1983), em uma das biografias a seu respeito - ele nasceu na então paupérrima Issaquera, no Estado do Mississippi.
Trazendo o jazz e o blues do Sul, o povo que migrou estabeleceu novas raízes de uma música urbana. Com a fusão de estilos e o surgimento de uma nova classe operária nas periferias das cidades grandes, como Chicago, a urbanidade aflorou e tomo conta, ao mesmo tempo em que a música eletrificada avançava.
A guitarra elétrica se torna padrão nos anos 50 no blues, enquanto s big bands do jazz perdem fôlego e os quintetos e sextetos de jazz tomam conta dos clubes. Esses gêneros se tornaram populares em pequenos clubes no lado sul da cidade.
Com as mudanças sociais e culturais rápidas, logo Chicago estava atraindo lendários músicos de jazz como King Oliver, Jelly Roll Morton e Louis Armstrong; e notáveis artistas de blues como Muddy Waters Buddy Guy, James Cotton e Junior Wells.
Explorando o jazz ao estilo de Chicago
Chicago é uma cidade com uma rica e vibrante história na cena do jazz. Na verdade, durante grande parte da década de 1920, Chicago foi a capital mundial do jazz. Durante esse tempo, o ponto focal do jazz mudou de Nova Orleans e Mississipi Delta para Chicago.
Costuma-se dizer que, embora o jazz tenha nascido em Nova Orleans, ele cresceu e floresceu em Chicago. Durante esta década, o jazz passou por uma transformação fundamental que continua a influenciar profundamente a música até hoje. Os Jazzmen de um século atrás foram pioneiros em novas formas de criar música e, ao fazê-lo, entrelaçaram a essência da cidade em seu próprio ser.
Certos aspectos da estrutura e do ritmo do som diferenciam o estilo da música de Chicago nesta época, como baixo e guitarra de cordas pesadas, solos mais longos e tempos rápidos. Jazz e Chicago estão para sempre ligados. Não há melhor exemplo desse vínculo do que o Festival de Jazz de Chicago.
No verão de 1974, o grande compositor/líder de banda Duke Ellington faleceu. Apenas algumas semanas depois, dezenas de músicos de Chicago realizaram um festival para homenageá-lo, no antigo palco na extremidade sul do Grand Park. Dez mil amantes da música compareceram, marcando o primeiro do que se tornaria concertos comemorativos anuais que atraíram multidões de até 30 mil pessoas.
Então, em 1978, músicos que trabalhavam com o Conselho de Belas Artes de Chicago realizaram o primeiro John Coltrane Memorial Concert no Grant Park, outro sucesso popular.
No ano seguinte, o Jazz Institute of Chicago começou a planejar seu próprio festival em agosto. Isso significava que três grupos diferentes de jazzistas estavam trabalhando para apresentar shows no final daquele mês.
As autoridades da cidade propuseram a solução: reunir-se para criar o primeiro Festival de Jazz de Chicago. Teve uma noite de Ellington, uma noite de Coltrane e cinco outros programas organizados pelo Jazz Institute e foi realizado no novo Petrillo Music Shell.
E então 125 mil pessoas foram para ouvir, dançar, fazer piquenique na grama e curtir o nascimento do que viria a ser o maior festival gratuito jazz do mundo. Todos os anos, desde então, o Festival de Jazz de Chicago é realizado.
Festival de Jazz de Chicago - 31 de agosto a 3 de setembro de 2023
O mais antigo dos festivais de música gratuitos à beira do lago de Chicago possui uma programação incrivelmente diversificada, que inclui concertos gratuitos nos bairros e que antecedem o show principal no Millennium Park, além da programação adicional em toda a cidade no primeiro fim de semana de setembro.
Por mais de 40 anos, moradores e visitantes de Chicago se reunem para ouvir apresentações gratuitas de nomes como Miles Davis, Ella Fitzgerald, Stan Getz, Count Basie, Sarah Vaughan, Dizzy Gillespie, Ramsey Lewis e muito mais.
Além do renomado Festival de Jazz, os visitantes encontrarão clubes contemporâneos e espaços icônicos que dão destaque a sonoridades surpreendentes e atraem músicos de todo o mundo. Aqui está uma lista de apenas alguns dos melhores lugares para ouvir jazz na cidade.
Um dos locais mais lendários da cidade, o Green Mill é uma parada obrigatória no circuito de jazz de Chicago há mais de um século. Um bar clandestino durante a Lei Seca, era o local favorito de Al Capone (os visitantes ainda podem se sentar em seu lugar preferido no fundo do bar).
Hoje, os visitantes encontrarão a mesma vibração emocionante, além de música ao vivo todas as noites da semana - desde clássicos dos anos 30 e 40 até a vanguarda de hoje - tocando até as primeiras horas da manhã.
O Jazz Showcase é um clássico clube de jazz de Chicago que entretém o público desde a década de 1940. Ao longo dos anos, o palco do Jazz Showcase foi agraciado por alguns dos maiores nomes do gênero, desde estrelas internacionais (como Ira Sullivan, Count Basie, Richie Cole e Dizzy Gillespie) até talentos locais. O local conta com shows sete dias por semana, incluindo sua matinê familiar aos domingos, quando as crianças entram de graça.
O jazz lota a casa do Andy's desde 1977. Seja qual for o dia da semana, você encontrará amantes da música curtindo música ao vivo, coquetéis artesanais e pratos inspirados na culinária cajun.
Os fãs de música que procuram aquele som de jazz direto, devem ir ao Winter's Jazz Club em Streeterville. O aconchegante clube oferece apresentações seis noites por semana em sua sala de audição com 100 lugares.
Progressivo, experimental, improvisado, contemporâneo — os visitantes encontrarão tudo isso no Cinstellation. Este local inovador é dedicado a promover o crescimento artístico, o que contribui para alguns shows verdadeiramente únicos. O espaço inclui dois espaços íntimos para apresentações e um bar completo.
Explorando o blues ao estilo de Chicago
Ninguém canta blues como Chicago. Visitantes de todo o mundo vêm ouvir os sons distintos do blues urbano eletrificado da cidade onde nasceu.
Também após a Grande Migração que inspirou o jazz ao estilo de Chicago, os migrantes negros sulistas introduziram na cidade um novo tipo de música - falando sobre provações e tribulações, tristezas e sucessos.
Mas os músicos tiveram que se adaptar para competir com todo aquele barulho urbano, dando origem a uma versão amplificada que ficaria conhecida como Chicago style blues.
As principais características que distinguem o blues de Chicago das tradições anteriores, como o blues Delta, é o uso proeminente de instrumentos eletrificados, especialmente a guitarra elétrica e o uso de efeitos eletrônicos, como distorção e overdrive.
Músico de renome, Muddy Waters, migrou para Chicago em 1943, juntando-se ao estabelecido Bill Bill Broonzy, onde desenvolveram um estilo distinto de música blues.
O blues de Chicago alcançou uma audiência internacional no final dos anos 1950 e início dos anos 1960, influenciando diretamente não apenas o desenvolvimento dos primeiros músicos do rock and roll, como Bo Diddley e Chuck Berry, mas também cruzando o Atlântico para influenciar o blues britânico e os primeiros artistas do hard rock. como os Rolling Stones, Led Zeppelin e Eric Clapton. Músicos de blues ao estilo de Chicago são responsáveis por algumas das melhores músicas já feitas.
O lendário Buddy Guy foi indicado ao Hall da Fama do Rock and Roll, vencedor de vários prêmios Grammy e um dos primeiros a adotar o som de blues eletrificado de Chicago. Seu clube de Chicago, o Buddy Guy's Legend, é uma parada obrigatória para os fãs de blues de todo o mundo.
Os visitantes podem até assistir à apresentação de Buddy ao vivo todo mês de janeiro. No resto do ano, você ainda ouvirá incríveis blues ao vivo todas as noites da semana, além de sessões acústicas gratuitas durante o almoço e o jantar.
Um epicentro do blues local, o Kingston Mines, é conhecido por seus shows de blues ininterruptos todas as noites da semana. O jogo do lado norte começou em 1968, tornando-se o maior e mais antigo clube de blues em funcionamento contínuo de Chicago.
A configuração do local apresenta dois palcos, onde os sets alternados das bandas mantêm a música tocando bem depois das 3 da manhã todas as noites.
Tanto os novos quanto os experientes fãs de blues se sentirão em casa no Rosa's Lounge, um ótimo clube de blues e um clássico bar de bairro. O Rosa's foi fundado por um imigrante italiano que viajou para Chicago em 1978 após um encontro que mudou sua vida com Junior Wells e Buddy Guy em Milão.
O lounge familiar, inspirado no espírito dos clubes do lado sul onde o blues de Chicago recebe artistas tradicionais e modernos em seu palco.
O speakeasy do Bassment apresenta música ao vivo todas as noites em que abre, com destaque para o blues. Basta encontrar a porta secreta dentro do The Hampton Social e, em seguida, descer as escadas para o elegante salão repleto de detalhes em ouro e sofás de couro.
Pegue um lugar no palco para estar perto da ação, ou fique nos fundos e saboreie coquetéis exclusivos. De qualquer maneira, os visitantes têm a garantia de ouvir um ótimo blues.
Vale a pena visitar em um itinerário de blues de Chicago a Willie Dixon's Blues Heaven Foundation, localizada no histórico Chess Records Building. O edifício histórico da Chess Records foi restaurado em 1993 por Marie Dixon, viúva de Willie Dixon, para abrigar a Blues Heaven Foundation e vários programas para crianças, estudantes, músicos de blues e entusiastas da música.
O endereço histórico abriga o único Blues Museum em Chicago, bem como a Blues Heaven Gallery, onde muitos fotógrafos exibiram seus trabalhos. Eles estão abertos de terça a sábado, com passeios a cada hora.
Finalmente, e definitivamente digno de menção para os visitantes que planejam uma viagem a Chicago, o Chicago Blues Festival é realizado anualmente desde 1984, no aniversário da morte de Muddy Waters, como forma de preservar e promover esse gênero musical.
No início do verão, não há lugar melhor para um amante do blues do que o Chicago Blues Festival gratuito no Millennium Park. A programação de três dias celebra o passado, presente e futuro do gênero - incluindo sua influência na música soul, R&B, gospel, rock, pop e hip hop.
O festival é uma tradição de Chicago há mais de três décadas, então você sabe que já viu alguns grandes nomes do blues de todos os tempos - B.B. King, Bo Diddley, Buddy Guy, Stevie Ray Vaughan, Etta James e muito mais.
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