sábado, 4 de maio de 2024

Madonna e a arte de empobrecer o espetáculo

 Nunca foi pela música. No começo até pode ter sido Mas, fundamentalmente, a música era apenas um veículo para outros objetivos. Madonna elevou a outros patamares o que o Kiss inaugurada na década anterior. Só a banda que iniciou o marketing massivo e agressivo nunca se desviou da música. 

Madonna e uma série de artistas do mesmo segmento optaram por outro caminho, por isso não surpreende que faça um show demais, só com playback - e isso não causa escândalo, é considerado até normal...

Em um momento de  suprema desvalorização de formas diversas de arte - em que guitarra se tornou coisa fora de moda, coisa de velho -, faz sentido que artistas que sempre enganaram continuem enganado, seja de verdade ou "conceitualmente". 

Madonna nunca escondeu que não tinha músicos em suas turnês, mas também nunca fez questão de informar os fãs disso. Não que estes se importem, já que as reportagens de TVs adoram mostrar gente acéfala que viaja 10 mil quilômetros  para ficar cinco dias na fila...

Estamos no tempo da audição ansiosa, em que os jovens e os nem tão jovens não escutam mais do que um minuto de uma canção qualquer e que acham que show de musica em casa noturna ou estádio é "balada". Músicos tocando? Ora, isso é apenas um detalhe...

Seria escandaloso, mas está sendo tratado como algo absolutamente normal. Um dos argumentos é> "É um show gratuito, o que vale sensação e o privilégio do evento" Um outro imbecil qualquer vomitou qu "serpe foi assim,, não faz diferença..."

ara esse tipo de idiota, arte é u conceito tão vago quando o de um buraco negro na astronomia, ou o Bóson de Higgs. É esse tipo de idiota que paga caro para ver um DJ "supostamente tocar" e, mesmo depois de descobrir que o som veio de um pen drive, e que o tal DJ famoso apenas dublou a si mesmo, finge que nada aconteceu e normaliza a coisa toda.

As facilidades tecnológicas que em parte foram disseminadas pela música eletrônica de pista de danceteria criou essa espécie  de apreciados de música pouco exigente e mais preocupado com "sensações" do que com a arte.

Em com isso o rock e a música pop bem feita, por artistas e por músicos, morre um pouquinho a cada dia em um mercado degradado que ainda não encontrou seu rumo neste século para se tornar rentável e sustentável.

Não é de hoje que artistas de vários calibres simulam concertos imensos sem a presença de músicos, ou de muitos músicos. Há pelo menos 20 anos Madonna usa esse artifício em determinadas situações. Também é raro ver músicos no palco de divas plastificadas do hip hop e rhythm & blues dos Estados Unidos ou das funkiras brasileiras como Anitta, iza, Ludimila e outras do mesmo naipe. Por qu a indignação atual?

Gostaria de acreditar que seja um momento em que as pessoas perceberam que os rumos da cultura e do entretenimento estão errados e que é preciso valorizar a cultura e arte que escapam da inteligência artificial. 

A realidade, no entanto, é que essa indignação é apensas seletiva, originada de um campo intelectual que adora demonizar o popular e o que é moda - de gente pouco disposta a realmente discutir o problema e propor soluções.

O debate se tonou lateral, quando deveria ser o principal. Um megaespetáculo movido a playback e dublagem porca  qu e custou caríssimo aos cofres públicos e patrocinadores tinha o dever de respeitar os espectadores e oferecer o melhor possível.

Não se trata de desprezar o valor artístico de Madonna - ele existe, ainda que seja minguado e superdimensionado, Ela criou esse padrão de megasshow esfuziante onde tudo é mais importante do que a música - coreografias, troca de figurino, luzes, telões, tecnologia e etc, Em algum momento ela perceberia que a música se tornaria secundária e os músicos, desnecessário. 

.Se musicalmente Madonna é sofrível e fraca, ainda que tenha uma penca de hits amados por gente que exige pouco ou nada, em termos institucionais se tornou uma figura relevante e poderosa, um ídolo para uma geração de jovens mulheres e pessoas da comunidade LOBTQIA+ dando visibilidade para a causa.

Por conta disso, sua atuação em prol da assistência aos doente de Aids e no financiamento de pesquisas para encontrar a cura da doença é de uma importância sem tamanho. Usou seu talento como dançarina, performer e ativista par alcançar feito jamais alcançados por outros artistas. Inegavelmente, é um ícone pop.

Alcançou esse patamar, merecidamente, também porque foi rebelde, ousada e inovadora ao manter uma postura contestadora, quebrando paradigmas e mexendo em tabis da cultura ocidental, principalmente os religiosos, desprezando-os e debochando deles (o que fez muito bem). Só por isso merece uma estátua.

Diante de tudo, torna ainda mais inquietante e incômodo o desprezo que ela dedica á músia e aos músicos. Parece assumir, finalmente, que nunca foi lá essas coisas como cantor e que sobreviveu nos palcos como atleta da dança. 

Menos ousada e mais conservadora aos 60 anos, e mais preocupada em manter o carisma e a fama, Madonna é um sintoma mais do que evidente das transformações da cultura e do entretenimento no século XXI. 

Seu show hoje revela a predominância do lucro e do corporativismo capitalista sobre a arte, algo que não é novo, as que avança a passos lagos dentro do mundo do entretenimento. pelo menos essa relação é mais equilibrada nos megaeventos de artistas como Rolling Stones, U2 e Iron Maiden, ou mesmo dos recentes show "Titãs Encontro".

O conservadorismo liberal de Madonna no negócios contrasta com o "conservadorismo" artístico de apreciadores que ainda insistem no "disparate" de exigir músicos de verdade em concertos e megaconcertos e que desprezam qualquer tipo de DJ impostor que se acha "músico" ao fazer barulho em seus equipamentos.

São outros tempos, mas ainda é possível e saudável exigir que se faça boa música com músicos usando instrumentos musicais, ainda sejam artistas pretensioso pretensamente visionários como os do trio Muse e seus instrumentos esquisitos, o Minitry, com seu metal industrial claustrofóbico, ou o Kraftwerk, o precursor de toda essa zona, com seus computadores. 

Madonna, há muito tempo, está colocando a cultura e o entretenimento  a serviço da conveniência tecnológica e dos negócios, quando deveria ser o contrário. Do jeito que é hoje, um show de Madonna empobrece o espetáculo.

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