sábado, 14 de dezembro de 2024

Iron Maiden transita entre presente, passado e futuro em show memorável em São Paulo

Flavio Leonel - do site Roque Reverso



O Iron Maiden se apresentou em São Paulo na noite desta sexta-feira, 6 de dezembro, no Allianz Parque, e trouxe, mais uma vez, para o público brasileiro um show memorável. Para uma Arena do Palmeiras lotada e quente devido ao calor elevado na capital paulista, a instituição britânica de heavy metal transitou entre presente, passado e futuro e saciou os sempre devotados fãs com um espetáculo repleto de efeitos especiais, cenários da mais alta qualidade e, claro, muito do bom e velho rock and roll que fez a banda se tornar uma das maiores da história.

O trânsito entre passado, presente e futuro se encaixa dentro da “The Future Past World Tour 2024”, uma sequência da “The Future Past Tour” iniciada em 2023 e que teve como principal foco a mesclagem de músicas inéditas ao vivo do álbum mais recente do Iron Maiden, “Senjutsu”, de 2021, com faixas do clássico disco “Somewhere In Time”, de 1986.

Enquanto “Senjutsu” se encaixa no tipo de som que o grupo passou a adotar nos álbuns do Século XXI, o álbum “Somewhere In Time” se encaixa num contexto histórico dos Anos 1980 rico culturalmente não apenas na música como no cinema, com filmes clássicos e inovadores, como “Blade Runner”, de 1982, e “De Volta para o Futuro”, de 1985.

Não por acaso, detalhes do álbum “Somewhere in Time” e da turnê de divulgação do disco trouxeram elementos que fazem referência aos dois filmes, com destaque maior para o primeiro.

São Paulo, por sinal, além de ser a única cidade brasileira a receber a banda em 2024, foi a escolhida para receber os dois últimos shows da turnê – os ingressos para o show extra do dia 7 de dezembro no mesmo Allianz Parque também se esgotaram numa arena cuja lotação máxima para apresentações musicais fica entre 45 mil e 50 mil pessoas.

O show

Após um show de respeito da banda dinamarquesa Volbeat, o Iron Maiden subiu ao belo palco para trazer mais um espetáculo de qualidade à capital paulista.

Antes, porém, vale destacar que, entre a tradicional música gravada que costuma sinalizar o começo do show (“Doctor Doctor”, do UFO) e a faixa de início da apresentação, o Iron Maiden inseriu a música “End Tittle”, pertencente à trilha sonora exatamente do filme “Blade Runner”.

Para quem viveu os Anos 1980 plenamente (como é o caso deste jornalista), a sensação de voltar ao tempo já começou ali mesmo, pois o sucesso da trilha sonora do saudoso compositor grego Vangelis (responsável também pela trilha de “Carruagens de Fogo”, de 1981) foi um dos acontecimentos musicais mais marcantes daquela década, fazendo com que o disco com as faixas de “Blade Runner” fosse quase que um item obrigatório nas prateleiras dos amantes da boa música na época.

A sensação absolutamente nostálgica deu lugar a uma mistura de nostalgia e ineditismo com a primeira música executada no show. “Caught Somewhere in Time” jamais havia sido tocada no Brasil e, só por este detalhe, o ingresso para esse show já valia muito.

Com suas “guitarras sintetizadas” marcantes na introdução e com o público fazendo um coro que tomou o Allianz Parque por completo, a música já entrou logo de cara para um dos grandes momentos da apresentação, com a banda subindo ao palco com uma disposição invejável para senhores pra lá de sexagenários.

Outro detalhe que não passou batido foram os óculos escuros futuristas do vocalista Bruce Dickinson, grande mestre de cerimônias do show e que, mesmo com quatro décadas após o lançamento de “Somewhere in Time”, conseguiu ao longo da apresentação manter a qualidade dos vocais nas músicas do álbum.

“Stranger in a Strange Land” foi a segunda da noite e outra música inédita no Brasil e também pertencente ao álbum da fase clássica do Iron Maiden.

Mais lenta que a anterior, serviu para o público contemplar toda a riqueza de detalhes dos cenários sempre caprichados da banda britânica.

A contemplação também valeu para o solo magistral de guitarra de Adrian Smith, em um de seus melhores momentos na noite.

Outro momento durante a música foi a primeira das três entradas da noite do mascote gigante Eddie. Ele subiu ao palco com uma capa preta em sua incorporação no estilo “Blade Runner”, empunhando uma arma. Eddie se apoio na estrutura do palco, só observando a banda, como se estivesse num balcão de bar de Faroeste e mostrou a arma para todos os presentes, bem no estilo do filme clássico dos Anos 1980.

Na sequência, o Iron Maiden decidiu trazer seu álbum mais recente “Senjutsu” para o show e tocou de uma vez só três faixas: “The Writing on the Wall”, “Days of Future Past” e “The Time Machine”.

A primeira delas já havia sido tocada em São Paulo no show que o grupo realizou no Estádio do Morumbi pela turnê “Legacy of the Beast”. As outras duas foram executadas pela primeira vez por aqui e seguiram o prometido na turnê atual, fazendo com que o público tivesse a boa experiência de conhece-las ao vivo.

Antes de “Time Machine”, Bruce perguntou para a plateia quem havia nascido depois de 1986. E a resposta no Allianz Parque deu a entender, pela quantidade de pessoas, que a maioria do público presente ali era de fãs que vieram ao mundo depois da data de lançamento do “Somewhere in Time”.

Quem prestou a atenção no cenário de fundo do palco viu que a banda reproduziu, no estilo “De Volta para o Futuro” o painel de datas do carro DMC De Lorean usado como máquina do tempo no filme.

As datas ali marcadas eram de 25 de dezembro de 1975, 3 de setembro de 2021 e 29 de setembro de 1986. As duas últimas remetiam ao lançamento, respectivamente, dos álbuns “Senjutsu” e “Somewhere in Time”. A primeira remetia nada menos ao que se considera a data de fundação do Iron Maiden.

E como o trânsito entre passado, presente e futuro era a marca do show, o grupo tirou do baú um de seus sucessos do álbum clássico “The Number of The Beast”, de 1982. A ótima “The Prisoner”, que já havia sido tocada em São Paulo no show que o grupo fez na Arena Anhembi em 2013, serviu para uma geração mais nova conhece-la ao vivo, enquanto os veteranos de longa data voltavam a se emocionar com a inclusão desta faixa em um set list do show do Iron Maiden.

De volta para o futuro, ou, no caso, o presente (passado se pensarmos que o álbum é de 2021), a banda tocou outra faixa inédita ao vivo no Brasil do disco “Senjutsu”. Depois de uma micro aula de História do professor Bruce Dickinson sobre os celtas, o grupo trouxe “Death of the Celts”.

Com seus mais de 10 minutos de duração, ela foi muito bem recebida ao vivo pelo público e chamou a atenção por contar com solos dos três guitarristas da banda. Primeiro com Janick Gers, depois com o Dave Murray e, na sequência, com Adrian Smith.

Mais cinco clássicos

A volta ao passado se consolidaria nas cinco faixas seguintes, todas de álbuns clássicos da banda. Foram tocadas “Can I Play With Madness”, do álbum “Seventh Son of a Seventh Son” (1988); “Heaven Can Wait” e “Alexander the Great”, do “Somewhere in Time”; “Fear of The Dark”, do disco de mesmo nome de 1992; e “Iron Maiden”, do álbum de estreia de mesmo nome do grupo lançado em 1980.

De todas elas, “Alexander the Great” era a única inédita no Brasil e a mais esperada entre 9 de 10 fãs do Iron Maiden na noite. Tocada finalmente ao vivo pela banda a partir da turnê “Future Past”, a belíssima música deixou o Allianz Parque hipnotizado, especialmente com os solos de Adrian Smith e Dave Murray. Privilegiados dirão daqui a alguns anos que viram e ouviram ao vivo este momento.

Vale destacar que, antes dela, “Heaven Can Wait” proporcionou um dos grandes momentos da noite por vários motivos.

O primeiro deles foi o show à parte do público que cantou e pulou (puxado pelo grande baixista Steve Harris) nas partes que exigiam um coro de respeito, fazendo com que o Allianz Parque vibrasse como poucas vezes na apresentação e mostrando para quem ainda não tinha ido a um show do Iron Maiden o quanto o seu público é contagiante.

O segundo foi a segunda entrada da noite de mascote gigante Eddie, mas desta vez para entrar num duelo de armas futuristas com o vocalista Bruce Dickinson. Daqueles momentos que só um show do Iron Maiden é capaz de proporcionar no rock, o duelo teatral dos dois foi daqueles para entrar para a história dos shows em São Paulo, com direito a disparos no mais alto estilo hollywoodiano.

“Fear of The Dark” é considerada por alguns fãs mais exigentes uma faixa mais desgastada ao vivo pela presença contínua nos set lists do Iron Maiden. Mas não há como não se empolgar a cada execução que a banda faz dela. Para muitos, o grupo poderá colocá-la em todos os shows que não haverá problema. A emoção sempre estará presente.

O clássico “Iron Maiden” é outro presente no repertório, mas costuma sempre trazer alguma surpresa de cenário. E, desta vez, não foi diferente, com uma aparição de uma cabeça gigante do mascote Eddie com temáticas japonesas e na cor vermelha que impressionaram o fã mais acostumado aos shows da banda. O próprio Eddie voltou pela terceira vez ao palco para fazer seu duelo já tradicional com o inquieto guitarrista Janick Gers.

O bis

Pausa rápida para um brevíssimo respiro e o bis veio com três faixas: “Hell on Earth”, do álbum “Senjutsu”; “The Trooper”, única da noite do álbum clássico “Piece of Mind”, de 1983, e nada menos que “Wasted Years”, do “Somewhere in Time”.

A primeira delas, com pouco mais de 11 minutos de duração na gravação original, deixou uma excelente impressão ao vivo, apesar de longa. Com efeitos pirotécnicos que esquentaram ainda mais a vida de quem estava próximo ao palco, ela contou com aprovação do já cansado público.

Velhas conhecidas de várias gerações de fãs que presenciaram shows ao vivo do Iron Maiden no Brasil, “The Trooper” e “Wasted Years” fecharam a grande apresentação do Iron Maiden com chave de ouro e deixaram muita gente com gosto de “quero mais”.

Considerações finais

Houve quem reclamasse de ausências meio incomuns, com da faixa “The Number Of The Beast” e também da falta de músicas do sensacional álbum “Powerslave”, de 1984.

Mas a proposta da turnê era outra e não se podia esquecer que o grupo adaptou o set list recentemente para o grande baterista Nicko McBrain, após ele ter sofrido um AVC. Imaginar, por exemplo, ele tocando a rápida “Aces High” seria, no mínimo desumano, com este guerreiro do heavy metal e figura tão importante para o Iron Maiden.

Considerações à parte, o fã que vai a um show do Iron Maiden tem que pensar que é, no mínimo, um sujeito de sorte. Sorte de poder presenciar uma das maiores bandas da história do heavy metal ao vivo. Sorte de escutar alguns dos maiores clássicos do estilo ao vivo. E, mais do que isso: sorte de ter vivido no mesmo tempo de existência desse espetacular grupo.

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