Marcelo Moreira
Fazer rock instrumental é algo diferente no Brasil, por mais que novos nomes tenham surgido e se "insurgido" nesta área. O que dizer então dos corajosos que decidem pelo metal extremo sem vocais?
É o caso de dois músicos em que sobram talento e coragem para descer a lenha nas seis cordas: o paulista Tuto Hallgrim e o baiano Natan Cunha.
Os dois instrumentistas passaram no teste de aliar melodias cativantes com um instrumental pesado sem que este soterrasse o restante com milhões de notas e uma distorção do tipo "estrebuchante".
Hallgrim é músico de talentos múltiplos. Consegue variar suas abordagens sem que esbarre na redundância.
O seu thrash metal é coeso, assim como a pegada nas canções ainda mais velozes e pesadas. É possível identificar ecos de Chuck Shuldiner (da banda Death, morto em 2001) e também coisas bem mais técnicas, do tipo que se convencionou chamar de "math metal".
Ok, ele frita um pouco, no álbum "Do It Yourself", só que a música é a prioridade e o instrumentista mostra bastante talento ao equilibrar as coisas, como em "Devastation Storm". Há ótimos fraseados e a rapidez aqui impressiona.
Hallgrim também gosta de versatilidade e de uma certa imponência, e na interessante "Drakkar" ele carrega um pouco na dramaticidade, com bastante peso.
"Rebellion Thrash" é outra canção que merece elogios. É thrash metal na essência, mas incorpora outros estilos musicais que acrescentam um colorido bastante especial. Lembra Slayer, mas também passeia pelos estilos do Overkill e do Testament.
As demonstrações de amor pelo rock continuam com "Nightmares", que passeia pelo heavy tradicional, e "Living in the 80's", onde o hard rock com tonalidades de blues emocionam os amantes de Whitesnake, Ratt, Skid Row e até Bon Jovi.
Já em "A Traveler's Journey" temos um verdadeiro passeio por várias vertentes do heavy rock, com um predomínio bacana de ares progressivos nos solos e nos riffs.
O instrumentista, assim como a maioria dos guitarristas e tecladistas brasileiros que enveredam pelo lado instrumental nos últimos tempos, tomou a sábia decisão de privilegiar a música em detrimento da técnica e da velocidade. É quase um disco de jazz, se formos falar em conceito - uma de suas influências e que também aparece conceitualmente no mais recente disco de Kiko Loureiro, do Megadeth. Tem bastante improvisação e privilégio de linhas melódicas não tão complexas.
O guitarrista impressionou em "Do It Yourself" pelo bom gosto pelas boas ideias, especialmente por se tratar de um disco "quase caseiro", digamos assim. Com uma produção digna do guitarrista muito bom que é, colherá frutos ainda mais saborosos.
Natan Cunha, por sua vez, segue por uma escola mais tradicionalista dentro do metal instrumental, apesar de ser mais jovem - tem 21 anos. No entanto, assim como o paulista Hallgrim, tem recursos de sobra e boas ideias, mas preferiu restringir a sua área de atuação, ou seja, os temas que compôs não são tão diversificados.
Seus trabalhos mais recentes, "Synaptical Omnifarious" e "The Art of Existence", são consistentes e criativos, revelando influências variadas do prog metal e do metal extremo.
Claro que não poderiam faltar ecos do mestre Chuck Shuldiner, mas também há fraseados que certamente podem ter sido inspirados nas boas bandas de metal extremo instrumental, como Animal As Leaders e Blotted Science.
"Synaptical Omnifarious" é o disco mais interessante, pois é mais variado e não cai tanto no metal extremo. "The Magic of Madness" é um colosso de virtuosismo aliado a um feeling que remete ao monstro Tosin Abbasi, do Animal As Leaders, São riffs matadores e fraseados velozes, mas em que a técnica não se sobrepõe à melodia.
"Biohackers" é uma canção bem trabalhada, perfeita para a rilha sonora de um filme de ficção científica. Traz elementos que nos remetem à efeitos tecnológicos e faz do caos sonoro uma parte integrante importante da canção.
"Mental Crutch" e "Pandora Tomorrow" resgatam alguns elementos do primeiro álbum, "The Art of Existence", como levadas de jazz e uma sonoridade quase punk nas segundas partes.
O álbum é bem interessante, repleto de referências e com arranjos inusitados, especialmente para a segunda guitarra e para o baixo. Já pode ser considerado um dos melhores instrumentistas do rock pesado brasileiro, demonstrando ser bastante promissor.
Cunha nasceu em Seabra, um município do estado da Bahia. Segundo seu perfil no site Everybodywiki.com, teve seu primeiro contato com a música desde cedo, pois seu pai Eliel mais conhecido como (Pica Pau), vivia da música.
Aos 9 anos de idade ganhou do pai um violão para estudos de música erudita e clássica, mas logo debandou para o rock pesado. Aos 12 anos , sua paixão eram canções de Iron Maiden, Metallica e Death. Seu fascínio por guitarristas como Chuck Schuldiner Death, Chris Risola e Jason Becker era de igual tamanho ao interesse pela música erudita.
Na adolescência tocou nas bandas Domus From Hell e Rollfly (ainda mantém seu posto nesta última, formada por amigos e que lançou um EP, gravado em seu próprio home studio). É um nome para ser visto e ouvido com atenção.
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