Marcelo Moreira
Ela despontou como uma “musa” do metal nacional, um rótulo que lhe caía bem, segundo a maioria, mas que era pouco, muito pouco para representar a sua essência e seu talento. Só que foram necessários dez anos para que a formatação definitiva de seu trabalho florescesse.
“Break the Chain”, a estreia solo da guitarrista e cantora Isa Nielsen, coroa uma trajetória interessante dentro da música brasileira, juntando a persistência de uma musicista do underground e a necessidade de entender as novos exigências do mercado as múltiplas maneiras de atingir o público em tempos de pouca atenção e paciência para artistas novos.
Talento precoce nas seis cordas, a menina sonhava em ser cantora e direcionou a carreira neste sentido até que a guitarra cruzasse o seu caminho. O rock ganhavam mais uma fera para romper as fronteiras do gênero e impor a presença das mulheres em um período em eu elas estavam chutando as portas.
“É legal saber que contribuí para que o interesse das garotas pelo rock e pelo instrumento tenha aumentado. Já foi o tempo em que chamávamos a atenção no palco or sermos mulheres tocando. Hoje as coisas estão mais ‘normais’, digamos assim”, disse a guitarrista em conversa exclusiva como Combate Rock;
O trabalho solo foi um caminho natural depois de muitas experiências tocando em bandas de vários segmentos. Chamou a atenção, em todos os sentidos, quando integrou As Musas do Metal, banda só de mulheres que acompanhava Detonator,o vocalista do Massacration em versão solo. Depois tocou na banda Volkana e com o ás da guitarra Robertinho de Recife
O projeto As Musas do Metal, por mais que tivesse um viés satírico e humorístico – Detonator é um personagem criado pelo cantor Bruno Sutter -,representou um grande avanço profissional para Isa, que encarou com serenidade o complicado pacote que envolve a questão, incluindo doses de misoginia e machismo.
Sua postura foi tão íntegra e elogiada que o rótulo de “musa” foi, aos poucos, descolando de sua imagem. Lidou com a questão de forma espontânea e descontraída. “Foi um período de aprendizado e de muito trabalho. O viés satírico não ofuscou a seriedade do que estávamos fazendo e fomos muito respeitadas pelo que fizemos. Além disso, já faz muito tempo.”
“Break the Chain” é uma coleção de temas que corrobora o fato de o rótulo impregnado na época do trabalho com Detonator perdeu o sentido. É um álbum maduro e bastante polido por anos de lapidação. Ela reconhece que demorou para lançar diante da expectativa de fãs e mercado.
“Saiu quando tinha de sair. Tive o tempo necessário para trabalhar, retrabalhar e regravar. Claro que a andemia de covid-19 contribuiu para isso, mas as coisas fluíram de forma natural e segura “, celebra a musicista.
De forma resumida, é um álbum de hard rock, com a guitarra na cara e timbres muito bem escolhidos. As influências estão evidentes em cada nota: Lita Ford, Joan Jett, Vixen e L7, além de uma infinidade de elementos do grunge- afinal, ela é uma admiradora do cenário efervescente do som pesado underground dos anos 90.
A faixa-título, talvez a mais pesada das nove faixas, transpira som grunge por todos os lados como se tivesse saído de um álbum do L7- até os vocais emulam os principais trabalhos da banda.
A voz de Isa Nielsen é grossa, quase rouca e gordurosa, exalando perigo e sensualidade. De forma calculada, soa um pouco desleixada, como se Amy Winehouse resolvesse imitar Courtney Love , da banda Hole. Courtney, aliás, é uma influência confessa, fato explicitado na canção “Waiting for the Break on Down”.
Não é um disco festivo, mas tem um clima positivo. Trata de empoderamento e de liberdade, mas sem dogmatismos ou engajamento explícito. Escapa de um viés feminista para enveredar por um caminho mais simples, evitando armadilhas e campos minados do identitarismo.
“Quase todos os temas têm a ver com experiências pessoais e e a forma como eu lido com assuntos mais prosaicos”, explica Isa. “São temas mais comuns ao hard rock? Pode ser, mas é aquilo que nós vivemos no dia a dia. Talvez não seja tão confessional quando as letras de /Courtney Love, mas tem bastante a ver como que ouvi a vida inteira e ouvi Lita Ford bradar.”
De fato, a simplicidade de Lita Ford é uma inspiração no disco, como é possível perceber em “High Gain” e “Rollercster”,duas músicas poderosas que trilham um caminho mais tradicional do hard rock. O trabalho termina de forma veloz e potente com “Take Control”, um a exaltação raivosa da liberdade e do livre arbítrio.
É uma estreia solo digna de figurar entre as mais expressivas no rock pesado nacional nos últimos tempos. Curiosamente, apesar de todo um ambiente em que as influências são americanas, ela trabalha com uma gravadora e auxílio de produção de profissionais portugueses.
Imaginava-se que ela poderia incorporar mais influências europeias – afinal, ela nasceu no interior da Dinamarca, filha de pai dinamarquês e mãe brasileira, e vive aqui desde os dois anos de idade.
“É uma questão de ‘timing’,de momento. Sou bastante eclética e escuto de tudo, mas estas canções do álbum reflete um longo período de composição em que incorporei as influências mais latentes, por enquanto”, aponta a guitarrista.
“As limitações que enfrentamos não são apenas aquelas impostas por forças externas, mas também as barreiras criadas dentro de nossa própria mente”, afirma Isa Nielsen. “A vida, em sua natureza, muitas vezes nos coloca em um estado de reação automática, onde os desafios parecem ditar os parâmetros de nossa existência. No entanto, ao despertar para nossa verdade interior, tornamo-nos capazes de olhar além da superfície e transcender os condicionamentos da rotina.”
Isa continua: “Com o uso do conhecimento e a aplicação da sabedoria universal, podemos quebrar as correntes que limitam nossa capacidade de ver e experimentar o mundo de maneira mais ampla. É necessário abandonar a zona de conforto e abrir a mente para as verdades ocultas do universo, permitindo-nos acessar uma compreensão mais profunda e transformadora da vida e de nós mesmos.”
“Break the Chains” reúne grandes nomes que contribuem para enriquecer as composições. A faixa-título conta com Valdson Leme no baixo, enquanto “Wild Soul” apresenta Denison Fernandes no baixo, Paul Pesco no segundo solo de guitarra e Caio Gaona na bateria. Em “Waiting For The Break of Dawn”, Dy Moob ajuda Isa com os backing vocals e Kebras a guitarra.
Em “You’ll Go Too Far”, Jairo Fajer complementa com o baixo. A produção do álbum ficou a cargo de Kebras, que também assinou as mixagens e masterizações, garantindo um som autêntico e cativante. Gravado em home studio, o trabalho se destaca pelo ambiente criativo e intimista, proporcionando uma experiência sonora única.
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