Ricardo Alexandre – especial para o Combate
Rock
Quando
apareceu para o grande público no início dos anos 2000 a bordo da Cachorro
Grande, Marcelo Gross emitia um sinal ao mesmo tempo de rápida
assimilação e traiçoeiro: com seu terninho mod impecável, seu chapéu de
pescador grego inspirado em John Lennon, e sua guitarra Rickenbacker
perfeitamente timbrada, estávamos diante de uma banda retrô. Que grande engano!
Apesar do
conhecimento enciclopédico dos garotos e do sem-fim de referências aos anos 60
e 70, o que estávamos assistindo era muito mais a construção de uma obra
sólida, baseada não no passadismo, mas na autoridade sobre as diversas
linguagens e subgêneros do rock, de todos os tempos, de todos os lugares.
Quase 25
anos depois da estreia da banda e mais de uma década de uma carreira solo
musculosa “Grossroads – Marcelo Gross Ao Vivo” parece colocar as coisas em sua
perspectiva correta.
O álbum foi gravado ao vivo no Teatro de Câmara Tulio Piva em Porto
Alegre nos dias 21 e 22 de março de 2024, em duas noites que também renderam um
explosivo registro audiovisual, com 10 músicas, das quais cinco já estão
disponíveis no canal oficial do artista no Youtube.
Com Eduardo Barretto (baixo), Lucas Leão (bateria) e Jimmy Pappon (teclados),
Gross defende suas mais de duas décadas de contribuição ao pop brasileiro como
cantor, compositor e guitarrista de forma serena, espontânea e segura.
Em cima do palco, em ambiente aconchegante, emerge o óbvio: em sua
música e performance, há rock beat, há baladas stoneanas, há britpop, há new
wave of new wave, há ecos a Erasmo e Mutantes, mas Gross flutua por sobre tudo
porque está claro que não estamos diante de um retransmissor, mas de um criador com
cada versículo do grande livro do rock escorrendo misturado a seu suor.
As duas músicas inéditas do repertório são como
peças-chave para entender isso: “Linguagem
dos Sinais” é um rock estradeiro de amor levemente surrealista que resume
boa parte das aventuras musicais de Gross desde seus tempos na banda de Júpiter
Maçã, em meados da década de 1990.
A versão para “Cosas Imposibles” intitulada “Coisas Impossíveis”,
tributo ao gigante latino Gustavo Cerati (ex-Soda Stereo), uma referência
autoexplicativa tanto a outro guitarrista-compositor que renovou seus
horizontes em carreira solo, quanto às ligações do pop gaúcho com o pop
argentino, fronteira poucas vezes cruzadas pelos brasileiros. Herbert Vianna
(uma das exceções) costuma dizer que os argentinos tocam rock com tanta
propriedade e confiança como se eles próprios tivessem inventado o
estilo.
Ouvindo o álbum fica difícil não aproveitar o trocadilho do título e
imaginar Marcelo Gross em alguma encruzilhada do Mississipi inventando o rock,
ou o folk-rock, a Swinging London, a psicodelia ou qualquer movimento
desdobrado a partir daí.
A maior parte do repertório de GROSSROADS é pescado dos dois primeiros
álbuns solo de Gross: Use o Assento Para Flutuar, de 2013 (“Eu
Aqui e Você Nem Aí” e “A Hora de Levantar”) e Chumbo e Pluma, de
2017 (“Me Recuperar”, “Alô, Liguei”, “Quase Fui” e “Purpurina”).
Duas músicas são clássicos da Cachorro Grande: “Dia Perfeito” (de 2001)
e “Sinceramente” (de 2005). É significativo como todas elas, no calor valvulado
da performance ao vivo, revelam um corpo-de-trabalho coeso e arejado.
“Grossroads” é projeto-irmão do recém-lançado
livro “Grosswords”, uma reunião de uma centena de letras de
toda a carreira do músico gaúcho. O álbum chega às plataformas digitais em 25
de outubro de 2024, em um lançamento da Imã Records.
As 10 canções do disco ao vivo:
1. Me Recuperar
2. Alô, liguei
3. Eu Aqui e Você Nem
Aí
4. Coisas Impossíveis
5. Dia Perfeito
6. Quase Fui
7. Linguagem dos
Sinais
8. A Hora de Levantar
9. Sinceramente
10.
Purpurina
Ficha Técnica
Voz e guitarra: Marcelo Gross
Baixo: Eduardo Barreto
Teclados: Jimmy Pappon
Bateria: Lucas Leão
Gravação e mixagem: Fernando Dimenor
Assistente de gravação: Rafael Pacheco
Masterização: Marcos Abreu
Produção executiva: Antonio Meira
** Ricardo
Alexandre é jornalista, escritor e criador do podcast “Discoteca Básica”
** Texto cedido
gentilmente por Marcia Stival Assessoria
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