segunda-feira, 30 de setembro de 2024

Com o blues visceral, Eric Clapton resgata o melhor de sua carreira

 Marcelo Moreira e Magnus Craven (especial para o Combate Rock)

“Trouxe minha carteira de vacinação para qualquer ‘eventualidade’”, brincou a psicóloga Bia Fontes na fila para entrar no Allianz Parque, em São Paulo, no último domingo. Ela e outros fãs de Eric Clapton zombaram do negacionismo do músicoe só queriam saber de ouvir um bom rock and roll.

 

E não foi bem um rock que ouviram na maior parte do tempo no estádio lotado do Palmeiras em uma tarde/noite memorável e com temperatura agradável.  Guitarrista inglês resolveu incorporar todos os mestres do blues e emocionou a plateia com solos precisos e riffs inspirados, Mostrou o porquê de ser “deus”l como diziam as pichações em Londres em 1965.

 

Muita gente inteligente tinha bons argumentos para boicotar um dos últimos sobreviventes da era de ouro do rock e do pop, seja pelo negacionismo em relação à vacinas, seja pelo lamentável episódio de racismo/xenofobia manifestadas no palco em 1976 ( ao que consta, foi a única vez no palco, situação pela qual se desculpou mais tarde).

Quem preferiu separar obra das bobagens proferidas foi premiado com um grande show, em que o artista de 79 anos expôs todo o feeling e maestria para desfilar fraseados emocionantes e solos pungentes e encharcados e blues até o talo.

 

O clichê vale para este caso: vimos a história passando pelos nos olhos no palco do Allianz Parque naquela que deve ser a última passagem pelo Brasil de Clapton.  Ele estava em forma, com agilidade nos braços e no raciocínio, e ofereceu um espetáculo digno de sua altíssima categoria.

 

Com algumas alterações no repertório em relação ao show de sábado, no Vibra, mais intimista, Clapton privilegiou o blues e clássicos que ganharam nova vida nas suas cordas, como Crossroads”, do mítico Robert Johnson, o “Jey to the Highway”, de Charles Sugar e regravada por milhões de pessoas.

 

A introdução de “Sunshine of Your Love”, de sua antiga banda Cream, enganou, mas ele deu de presente outra do trio maravilhoso, “Badge”, parceria com George Harrison.  E teve também “Hoochie Coochie Man”, de Muddy Waters, que surpreendentemente causou alvoroço no público.

 

O set acústico veio logo no comelo do show e deu uma esfriada, causando alguns apupos e reclamações. O guitarrista não deu bola e mostrou-se exímio violonista, ancorado por uma bada de craques e com a participação especial do de um amigo recente, o violonista brasileiro Daniel Santiago, que vive em Nova York.

 

“Rinning on Faith” é uma peróla da carreira do músico, assim como a nem tão reente “Change the World”, que ganhou uma roupagem mais intimista e leve. O blues “Nobody Knows You When You’re Down and Out”, de Jimmy Cox, ponto alto do seu CD “MTV Unplugged”, antecedei à participação de Santiago, que brilhou em “Lonely Stranger”, “Believe in Life”, e no megahit “Tears in Heaven”, talvez a única que a maioria do público conhecia na íntegra;

 

Como concessão ao mundo pop, “Old Love” e “Cocaine”, e J.J. Clae, satisfizeram uma “necessidade” de algo mais palatável e “FM”, mas o bis tratou de recolocar as coias no lugar com o blues manjado e maravilhoso “Before You Accuse Me”.

 

Não foi tão intenso e urgente quanto às apresentações anteriores dele no Brasil, mas esteve bem adequada a apresentação ao momento em que Clapton vive, à beira dos 80 anos de idade e ensaiando uma redução drástica de atividades, principalmente em relação a turnês. Continua sendo um dos nomes fundamentais da música de nosso tempo

 

Na abertura, a acertada escalação do guitarrista norte-americano Gary Clark Jr, um nome máximo do blues atual, ao lado de Eric Gales e Joe Bonamassa. Seu bçues é mais atual e experimental, com a presença de elementos diferentes, de bases eletrônicas e, em alguns momentos, com uma pegada rap e rhythm and blues.

 

Claro que a plateia estranhou um pouco, mas pareee que a intenção de Clapton era essa mesmo, pois houve estranhamento em outras praças onde a turnê passou. Foi essa música “diferente” e com estruturasinusitadas  que provocou um misto de curiosidade e indiferença na plateia.

 

Com alguns ecos de Jimi Hendrix (1942-1970) e do amigo Eric Gales, Clark apostou em um início mais roqueiro e depois foi abrandando, preferindo temas mais “politizados” e sua discografia de seis álbuns, com destaque para “When My Train Pulls In”, “This is Who We Are” e “What About the Children”, além de “Bright Lights”, talvez o seu maior hit até agora.


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