segunda-feira, 29 de agosto de 2022

Eleições de 2022 reforçam a 'normalização' da Cultura como coisa supérflua

Todo mundo sabia que seria assim. É assim desde sempre. a Cultura, com maiúscula, mais uma vez ficou bem minúscula em qualquer discussão eleitoral nas eleições gerais de 2022.Pandemia, corrupção crises econômicas permanentes, desemprego e violência, além das óbvias Saúde e Educação, continuam pautando as "prioridades". Mas poderia ser diferente?

Em circunstâncias normais, em períodos de crise menos profunda e em que a democracia não estivesse ameaçada, tinha de ser diferente. A Cultura não só faz parte do jogo mas, como é possível observar, na maioria das vezes, é o próprio jogo.

O perigo de compreendermos as necessidades prementes do momento e estabelecer como prioridades as de sempre é que, mais uma vez, "normalizaremos" a Cultura com atividade/situação supérflua na vida, algo que, na realidade nunca foi. 

Da mesma forma que a Cultura "não é prioridade" no momento, como pregam muitas pessoas - o argumento é considerável e compreensível -, de outra é importante questionar essas mesmas |"prioridades" e a "normalização" do "rebaixamento da cultura, como se ela não gerasse riqueza e milhões de empregos. em alguns bons tempos de economia menos problemática, a Cultura empregava mais do que toda a cadeia automotiva.

´:E m assunto delicado e, aparentemente, sem conclusão definitiva, mas não deixa de incomodar  fato de a Cultura ficar de fora dos debates e das prioridades nos programas de governo dos candidatos, como bem salientou o jornalista Julio Maria em "O Estado de S. Paulo":

A falta do assunto “cultura” nas entrevistas e no debate com os presidenciáveis não mostra insensibilidade apenas dos candidatos à presidência com relação ao setor com o maior nível de paralisia de todas as pastas. 

A ausência de perguntas sobre o tema aponta também para uma preocupante normalização de sua condição de “quinta categoria”. 

Até quem em tese tem como premissa observá-lo, reportá-lo e fiscalizá-lo, os jornalistas, perdem a oportunidade de levar o assunto com todas as suas questões urgentes e abrangentes para tentar fazer com que os candidatos exponham alguma salvação.

O tempo é curto e corrupção, saúde, economia, religião e educação são mais urgentes, responderão os perguntadores, sem saber que embutem nessa lógica enviesada o próprio empobrecimento do debate.

Um entrevistador começa a perder o jogo quando pergunta apenas sobre o assunto que o candidato se preparou para responder. 

Como nenhum dos candidatos acredita que alguém fará qualquer questão sobre Cultura, e eles tristemente estão certos, não há preparação. Aí estaria a magia que tantos procuram com suas perguntas eloquentes mas de respostas quase sempre evasivas. 

Levar ao menos uma pergunta sobre Cultura em um debate de três horas de duração renderia, além da possibilidade de início de um debate importante, o elemento surpresa, sempre mais difícil de se desviar com algum improviso que não soe um flagrante fracasso mental.

Perguntas não faltariam. Das provocativas? Bolsonaro, fale sobre o aparelhamento da Secretaria Especial de Cultura sob sua gestão, recusando projetos que não tenham alinhamento ideológico com suas convicções.

 Lula, não foi um desperdício deixar que os pontos de cultura que sua própria gestão criou minguassem até o fim? Das propositivas? Bolsonaro, qual é o seu plano para o destravamento da Cultura?

Ou, simplesmente, para evitar fuga pelo viés negacionista ou por sua usual incapacidade de entendimento de questões mais elaboradas: Bolsonaro, se reeleito, qual será o seu plano para Cultura a partir de 2023? Lula, se eleito, o que o senhor faria com a travada Lei Rouanet? 

Ou algo mais detalhado, para forçá-lo a não sair pelo viés passadista ou pelo cânone de si mesmo: Lula, gostaria que o senhor esquecesse do passado nessa pergunta e respondesse bem objetivamente: Além dos conselhos estaduais que o senhor disse que vai criar se for eleito, qual será o seu plano para a Cultura?

O apagamento da importância da Cultura no único instante em que um político é obrigado a se curvar a seus eleitores, o debate eleitoral, registra uma mensagem subliminar que mata a reconstrução de um setor antes mesmo que ela comece. 

Ao não ser questionado uma única vez sobre o assunto, quem quer que suba a rampa do Planalto em janeiro terá o silêncio de jornalistas que estão ali para levar questões que representem o interesse do eleitor como um aval de apatia. 

Cultura pode não ser mais importante do que Saúde, Economia, Segurança, Religião e Educação, mas é a única que está em todas elas.

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