quinta-feira, 29 de abril de 2021

A guitarra de Ace Frehley, 70 anos, faz parte do melhor de nossas vidas

Marcelo Moreira




Ele foi o maior nome da guitarra nos anos 70 para a garotada. Ninguém se espelhava em, ou queria ser, os "dinossauros" Eric Clapton, Jimmy Page, Ritchie Blackmore, Tony Iommi ou os ases do rock progressivo. O astro da vez a ser inimitável era Paul "Ace" Frehley, o mago das seis cordas do Kiss, banda mais quente entre 1976 e 1979 nos Estados Unidos.

Com um feeling extraordinário e um blues natural correndo nas veias, foi a mola propulsora do rock festivo e mágico do quarteto mascarado de Nova York. O Kiss era rock, era circo, era teatro e o mais enlouquecedor entretenimento musical.

Ace Frehley chega aos 70 anos de idade como um dos mais cultuados instrumentistas do rock. Bem longe do auge, é verdade, mas ainda conservando uma aura de herói e venerado por músicos de todas as idades e com todos os tamanhos de carteiras.

Foram quase três décadas de quase ostracismo, tocando razoavelmente bem aqui e ali e lançando alguns discos interessantes, como os dois últimos, "Origins", volumes 1 e 2, onde recriou alguns dos maiores hits da história com sua pegada característica.

Ace foi o grande ás enquanto o Kiss era visceral e avassalador. Era um dos raros instrumentistas reconhecíveis pelo timbre e pelo ataque da mão direita. Foi o senhor da guitarra até ser destronado por um holandês meio baixinho que morava na Califórnia. E o surgimento do deus Eddie Van Halen coincidiu com a derrocada do Kiss e da submersão de seu guitarrista solo ao inferno.

Ainda assim, até hoje Frehley é um dos símbolos do rock, figura icônica e mascarada que tanto fez pela música em geral. Timbre, máscara e fogo selvagem o transformaram no ícone que nem mesmo os inúmeros problemas pessoas conseguiram soterrar.

Era a peça que faltava para que o Kiss levantasse voo a partir de 1974 e se tornasse uma máquina de fazer dinheiro até 1979, quando o esgotamento do rock circense e pesado obrigou o grupo a buscar novos caminhos. 

A opção pelo rock quase progressivo e conceitual na ópera-rock "The Elder", de 1980, foi o começo do fim para deus da guitarra mascarado. Insatisfeito com os rumos da banda e mergulhado nas drogas e no álcool, era uma questão de tempo até que fosse demitido pelos "patrões" Gene Simmons (baixo e vocais) e Paul Stanley (guitarra e vocais) em 1982. 

Já fazia tempo que tocava em poucas músicas nos álbuns, sempre substituído por músicos de estúdio, e se mostrava desinteressado nos palcos. Sua demissão não foi surpresa, assim como a de Peter Criss, o baterista, cerca de dois anos antes por quase os mesmos motivos.

Fora do Kiss a estrela brilhou pouco. A sua Frehley's Comet, banda que prometia ofuscar o próprio ex-conjunto, ficou apenas na promessa. A carreira solo empacou nos anos 90, e então veio o convite para participar, como convidado especial, ao lado de Criss, do especial "MTV Unplugged", em 1995.

Os cifrões falaram mais alto e a formação clássica e original do Kiss voltou à ativa, e pareceu que Ace iria renascer. Os ressentimentos e os velhos problemas, entretanto, abreviaram o retorno dele e de Criss.

Ainda voltaria a tocar ocasionalmente nos anos seguintes com os ex-companheiros, mas tudo acabou melancolicamente, ao mesmo tempo em que as farpas entre eles cresciam na imprensa.

A carreira no século XXI não foi aquela beleza, alternando bons momentos com recaídas bravas na bebida. São fartos os relatos de que subia frequentemente bêbado nos palcos cada vez menores e menos assistidos. Mas ninguém nunca negou: por muitas vezes o velho e bom Ace do Kiss dava as caras e alegrava as crianças que ainda habitavam muitos roqueiros adultos por aí.

Foram inesquecíveis as cenas de Ace tocando bem e concentrado no autódromo de Interlagos, em São Paulo, em noite fria e chuvosa de 1999. Não tínhamos ideia, mas ali era o começo do fim daquele "recomeço".

Solos incandescentes, ataques frenéticos e riffs poderoso pareciam sair como fogo de sua guitarra, em uma performance mágica e contagiante. Era a primeira, e única, vez do Kiss original e clássico, mascarado, no Brasil. 

Ninguém estava a fim de ouvir "Psycho Circus", o apenas razoável disco da vez. O palco era de Ace, todos queriam ver Ace, e o viram em boa forma e tocando bem, por mais que houvesse apreensão. O herói apareceu, e transformou 50 mil roqueiros em, crianças novamente.

A guitarra de Ace Frehley faz parte de nossas vidas e seus 70 anos serão celebrados de forma esfuziante mesmo em tempos de pandemia. Rock and roll all night and party everyday...

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