terça-feira, 19 de setembro de 2023

Lançamentos selecionados: Torture Squad, Attractha e Warshipper

Heavy metal de qualidade foi o que pandemia de covid-19 produziu enquanto os músicos brasileiros estiveram confinados por conta do isolamento social. em meio a lives e jornadas exaustivas no estúdio, muita coisa boa foi composta e gravada, e fomos agraciados com algumas das peças mais interessantes de metal extremo em 2023 neste semestre.

O quarteto paulistano Torture Squad prometeu e cumpriu: "Devilish" é o melhor álbum de sua carreira de de mais de 30 anos; "Lex Talionis", dos também paulistanos do Attractha, aposta na inovação em em um conceito diferente de oferecer e consumir música; do interior paulista vem o Warshipper, que investiu em um metal extremo competente e interessante.

- Foram tempos sombrios e de muita paciência, mas também de reenergização e ressurgimento. O Torture Squad tinha muitos planos, como todo mundo, e também alguns sonhos. Uma pandemia de covid-19 congelou o mundo, e transformou as nossas vidas. Muitos se perderam, e outros se concentraram.

"Desconfio que fizemos o nosso melhor disco", comentou o baterista Amílcar Christófaro em conversa com o Combate Rock no ano passado. Ele anunciava uma enxurrada de novidades pós-pandemia, que envolviam álbum novo, disco ao vivo, caixa com raridades e vídeos e direitos de áudios dos shows do festival Wacken de 2007, 2008 e 2009 adquiridos.

"Devilish", o disco de inéditas, o segundo com a formação que está junta desde 2015, chega aos streamings e lojas virtuais com o poder de um grande trabalho, e com as desconfianças do baterista se tornando realidade: é o melhor álbum da banda, o que e perfeito para comemorar as mais de três décadas do Torture Squad.

O primeiro single, que na verdade era uma música inédita de estúdio que foi incluída no álbum ao vivo "Tortura En La Iglesia - En Vivo", indicava o caminho. "The Fallen Ones" adicionava novos elementos musicais ao death metal violento e soturno, mergulhando em temas de horror. A canção é forte e muito pesada, mas agregando toques de metal progressivo, com passagens intrincadas e complexas.

"Mabus", a canção seguinte, realmente a primeira de "Devilish", levou adiante as premissas de "the Fallen One" e mostrou novas possibilidades. A construção de riffs densos e os arranjos tétricos transformaram a canção em um pandemônio sonoro - e apavorante.

"Hell Is Coming" é a que mais se parece com o Torture Squad que estamos mais acostumados, um metal acelerado e muito pesado, sem dar refresco u pausa para respiro.

Com as cartas na mesa, "Devilish" desfila bom gosto e qualidade, evidenciando que a pandemia e a parada obrigatória deram à banda o tempo necessário para testar inúmeras possibilidades, com destaque à variação de timbres e tonalidades vocais de Mayara Puertas.

A cantora que é referência de vocal agressivo e extremo no Brasil passou por outras paragens e foi muito bem na agressiva Warrior", que é um pouco mais cadenciada, mas que traz um acento quase bluesy/hard rock com um vocal mais rasgado.

A canção mais surpreende e uma das melhores do disco - ao lado de "Warrior" - é aquela de que mais destoa do tradicional death metal violento que a banda sempre destilou. Climática e lenta, com a primeira parte da canção feita com voz limpa, "Find My Way" é aterrorizante, assentada em uma bel trilha sonora de filme de terror.

O peso toma conta da segunda parte, transformando a música por completo, deixando evidentes todas as influências de rock progressivo que Christófaro sempre fez questão de adicionar ao som do Torture Squad.

Outra surpresa é a enigmática "Uatumã", cantada em inglês, português e trechos de idiomas indígenas. Fugindo um pouco do tema horror, é um libelo em prol da preservação das florestas e dos povos originários, misturando a violência do metal extremo com arranjos tribais e sonoridades das culturas indígenas. Aqui há um discurso do líder indígena Raoni Metuktire.

"Buried Alive" (com a participação de Andres Kisser, guitarrita do Sepultura), "Thoth" e "Sanctuary" também são destaques, pois são extremas e assentadas em bases mais complexas, com variações de riffs e solos de guitarra ótimos, mas tudo muito veloz. Dificilmente deixará escapar o primeiro lugar nas listas de melhores do ano, em um 2023 que tem o excelente "Eldorado", de Edu Falaschi, como destaque. E olhe que o novo do Angra vem aí...

- A banda paulistana Attractha decidiu inovar e lançou uma revista que dá suporte a um álbum - ou será o contrário? É um trabalho conceitual que foi lançado em conjunto para que o ouvinte tenha uma experiência diferente dentro do heavy metal.

"Lex Talionis" é o nome do projeto recém-lançado. São dez músicas de um ótimo metal tradicional e com produção excelente de Adriano Daga (produtor renomado do Brasil e baterista da banda Malta). É uma história de terror tendo a vingança como pano de fundo, com suspense e um desfecho, de certa forma, surpreendente.

Comprando a revista em quadrinhos - que tem um formato de livreto -, é possível acessar o álbum por meio de um QR Code e escutar enquanto corre a leitura das 64 páginas de uma história de horror sobrenatural que não tem muita originalidade, mas é interessante por misturar a história de terror com o cotidiano da violência urbana brasileira.

Só é possível ouvir "Lex Talionis" pelo celular ou um computador que tem leitor óptico de QR code. Ainda não há previsão de uma produção substancial de CDs físicos ou de venda separada de forma digital.

O metal bem feito e poderoso do Attractha, tem musculatura e não depende da revista. Temas como "I See You" e "Today" são fortes e diretos, com letras simples e riffs de guitarra muito legais.

A captação do som de bateria é um dos destaques - Daga é um ótimo baterista e um produtor experiente - e acrescenta um colorido diferente em um país onde a bateria, muitas vezes fica abafada ou escondida. Tudo bem, o cérebro da coisa toda na banda é o baterista, mas isso é somente coincidência...

"Tomorrow Is Too Late" é uma balada com acento clássico e bons arranjos orquestrais e de piano, uma música um tanto surpreendente. É uma canção bem-feita, ajuda a dar um tom dramático e melancólico a "Lex Talionis" ( lei de Talião, aquela do "olho por olho, dente por dente", talvez o primeiro código legal da humanidade). Uma história de vingança, então, tem tudo a ver...

"The Past Is Gone" é o resumo musical do álbum, com um metal consistente, guitarras bem timbradas e pesadas e bons riffs, sem abuso nos solos.

Na mesma linha vai "The Time Has Come", que tem arranjos grandiosos e riffs bem construídos. O final, como álbum de metal tradicional, épico e poderoso, deixando aberta a porta para uma eventual continuação da história.

O projeto teve bastante gente envolvida. O baterista Humberto Zambrin fez o roteiro original, criando a história, além de coordenar o design do álbum e a da graphic novel. Mozart Couto cuidou da arte/ilustração e DeCastro fez o roteiro final.A colorização ficou a cargo de Guilherme de Martino. A revista foi editada pela editora Universo Fantástico.

O quarteto - Zambrin, Ricardo Oliveira (guitarra), Guilherme Momesso (baixo) e Cleber Krichinak (vocais) - arriscou bastante ao fazer uma ópera-metal lastreada em uma história também concebida pra ser um livro/história em quadrinhos.

- De Sorocaba (SP) vem a locomotiva Warshipper, que já tinha se destacado ao lançar o álbum "Barren..." em 2021. lança um álbum ainda melhor, "Essential Morphine", oito músicas que mostram um death metal refinado e técnico. É o quarto disco da banda em dez anos de carreira."Temos sido bem-sucedidos ao atingir uma sonoridade extrema de infinitas potencialidades, onde o brutal e a sensibilidade versam juntos", diz o vocalista e guitarrista Renan Roveran, que confirma que a busca de uma sofisticação nas composições chega a er uma obsessão da banda.

Além de Roveran formam o grupo Rodolfo Nekathor (baixo e vocal), Rafael Oliveira (guitarra) e Theo Queiroz (bateria). "Essential Morphine" foi gravado no Casanegra Studio em São Paulo, com mixagem e masterização de Rafael Augusto Lopes e produção do próprio Warshipper. O álbum foi lançado em CD Digipack especial com pôster encartado pela gravadora Heavy Metal Rock.

A lista de músicas tem "Religious Metastasis", "Migrating Through Personality Spectra", "Perfect Pattern Watcher", "Morphine", "The Night of the Unholy Archangel", "The Twin of Icon", "Magnificent Insignificance" e "Guilt Trip" (bônus).


É um conjunto bem equilibrado, em que se destacam a violência sonora de "Religious Metastasis", um exemplo de música extrema bem feita e bem produzida, e "The Night of the Unholy Archangel", que já é um clássico da música extrema brasileira.

"The Night Of The Unholy Archangel"e "The Twin Of Icon", esta última violentíssima, que também foram lançadas como single, são, respectivamente, regravações do Zoltar e Bywar, bandas anteriores de Rodolfo Nekathor e Renan Roveran.

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