quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024

Ana Cañas homenageia Belchior celebrando a vida e o amor

Ana Canãs é uma cantora brasileira das mais versáteis e gosta de frisar que não se prende a rótulos e que seus projetos são definidos pela qualidade do repertório e, em muitos casos, pela sofisticação do material envolvido.

Ela está encerrando uma temporada em que revisitou o cancioneiro de Belchior, cantor cearense de MPB que mais se aproximou do rock entre seus contemporâneos e que morreu aos 70 anos, em 2017.

A temporada termina em São Paulo com uma apresentação no Tokio Marine Hall em 10 de março. O bem-sucedido começou em sua primeira apresentação: uma live, em plena pandemia, assistida por mais de 600 mil pessoas. 

“Essa turnê me emocionou tanto... é o momento mais bonito de toda a minha carreira! Encerrá-la com apresentações especiais em casas incríveis, acima de tudo, é o que o Belchior merece! Vai ser muito emocionante!”, diz a artista.

Devido à imensa repercussão e pedidos acalorados do público, o que era para ser uma apresentação única se transformou no show que já passou por mais de 150 palcos pelo Brasil e recebeu o prêmio de Show do Ano pela APCA - Associação Paulista dos Críticos de Arte.

Em entrevista ao Combate Rock, Ana Cañas comentou mais a respeito de sua conexão com o o cantor e compositor cearense  e o próprio rock and roll.

O culto a Belchior aumentou bastante depois de sua morte, o que rendeu muitas homenagens, mais do que merecidas. O que você pensou em fazer de diferente para os shows atuais?

O que mais aprendi nessa travessia, cantando a obra de Belchior, foi "Eu sou como você que me ouve agora" ("Fotografia 3x4"). Demorei um pouco para entender esse verso numa camada mais profunda, mas hoje o enxergo como um convite à própria essência. Entendi que não havia outro caminho para chegar a qualquer coração humano, brasileiro, que não fosse pela verdade e entrega absolutas. Trazer o feminino, ressignificando minha própria jornada - dos bares há 20 anos, das pedras e dores da vida, na interpretação. Simplifiquei os arranjos para colocar a palavra no centro de tudo e o encaixe da dicção foi muito importante para alcançar isso. No resto, foi deixar a emoção aflorar. Não houve um único show - nesses 150 até aqui, que não fui às lágrimas, muitas vezes, ainda na passagem de som. 

Qual foi o impacto da obra do cantor Belchior em sua carreira?

Imenso. Houve um reentendimento da palavra "artista" - que perpassa pela própria jornada humana da vida de Belchior, a aproximação com os filhos (Camil e Mikael) e uma nova compreensão do fazer musical, do compositor. Alterou estruturas muito profundas sobre a vivência musical e um olhar muito mais amplo sobre o país em que vivemos - dicotomias, paradigmas e subjetividades. Pude alcançar cidades muito pequenas do interior do Brasil aos maiores teatros nas capitais com esse projeto e muita coisa mudou na minha cabeça e no meu coração.

Muitas canções de Belchior são reverenciadas por artistas de rock por conta de suas similaridades com o estilo e pelos temas que ele abordava. Você pensa dessa forma? Acredita que as músicas de Belchior a aproximam um pouco do rock?

Com certeza! Elas se aproximam pelas temáticas das canções, pela visceralidade na sua personalidade e nos versos diretos e atuais. Belchior era muito autêntico, único e isso o coloca em diálogo com a metafísica do rock. Em diversos shows, observamos pessoas que amam o rock presentes, cantando suas letras, com camisetas que remetem à grandes bandas (Misfits, Led Zeppelin, Stones, Beatles, Metallica) e é um grande barato essa conversa. Muitos chegam sem conhecer o meu trabalho, vão pelo Belchior mesmo e sempre foi interessante notar essa emoção peculiar, eu adoro!

Seu trabalho é conhecido pela versatilidade e pela simplicidade em arranjos para grandes canções. Houve algum desafio a mais para adaptar as músicas e Belchior ao seu estilo?

As letras do Belchior são um grande desafio a qualquer intérprete. Elas contam histórias que são profundamente dele, mas que servem à todos - e esse é o poder mágico dos gênios e da arte. Então, com letras grandes e até difíceis de memorizar, são um convite a encontrar a sua própria voz, do contrário, seria apenas um "cover". É como se fossem um grande espelho existencial e, aí, cabe a cada um escolher como o fazer. 

 Houve um momento neste século em que muitas cantoras apareceram dentro dos estilos pop e MPB mostrando variedade e ousadia em muitos casos. No entanto, muitos ainda insistem em que todas são iguais, cantam as mesas coisas e mesmo umas imitam as outras, misturando  na mesma praia Ana Carolina, Tupia Ruiz, Ana Cañas, Vanessa Moreno e até Sandy. Chega a ser bizarro, mas tem gente no mercado que compra essa ideia. Marina de la Riva chegou a reclamar em uma de suas apresentações há uns dois anos. Isso te incomoda?

Eu acredito que isso seja um reducionismo exacerbado de quem ouve. Não acho uma crítica totalmente infundada, pois existem "nortes energéticos" que nos interseccionam, mas é bastante superficial a leitura de que essas vozes são a mesma! Todas possuem idiossincrasias lindas em seus trabalhos (independente se a pessoa gosta ou não) e totalmente assimiláveis. 

Como surgiu a sua parceria com Ney Matogrosso?

Ney é um amigo muito especial que a vida me trouxe. Nos conhecemos há 15 anos e ele possui um papel importantíssimo na minha vida, muito além do encontro musical. Conselhos, afetividade, presença, amizade profunda e verdadeira. Sou muito grata por tudo que ele fez e faz na música brasileira e também no espectro particular. É um ser humano belíssimo, sensível, de muito caráter e um artista verdadeiramente entregue à sua arte. Me ensina muito e estou muito feliz que vamos dividir o palco mais um vez, no derradeiro show em São Paulo.

 Seu prestígio está em alta ao receber uma canção inédita de Belchior de presente dos filhos dele. O que representa isso em sua carreira?

Foi uma emoção imensa ouvir canções inéditas de Belchior, na sala de minha casa, trazidas por Camila e Mikael (seus filhos). Eles estão realizando um trabalho belíssimo e recuperando o acervo inédito do pai. Escolhi, dentre algumas que ouvi, a que mais me identifiquei chamada "Um Rolê no Céu". Ela foi escrita em 1987 com seu querido e profícuo parceiro, Gracco. Me parece ser uma mensagem dele do astral, citando o amor como mote essencial da vida e trazendo a ideia de que os computadores teriam um papel importante em nossas vidas. É simplesmente genial! Tocaremos ela nesse shows finais.

Depois de Belchior vem o que a seguir?

O projeto cantando Belchior se encerra dia 26 de maio com o último show, no Rio de Janeiro, no Vivo Rio. Vou lançar um especial - um show gravado em Sobral (CE), sua cidade natal, como registro definitivo do projeto (no Youtube e Plataformas Digitais). Nesse momento, estou em estúdio gravando um disco novo que sai no segundo semestre, retomando o autoral. Estou muito feliz, cercada de pessoas competentes que estão contribuindo muito nesse novo capítulo, vivendo o momento mais bonito de toda minha vida / carreira e só agradeço à todos que nos prestigiaram, fazendo parte dessa caminhada, que nasceu de uma live na pandemia. O amor vence!

Serviço:

Participação especial: Ney Matogrosso
10 de março, 20h
Tokio Marine Hall
End.: R. Bragança Paulista, 1281 – Vila Cruzeiro
Informações:(11) 2548-2541 | contato@tokiomarinehall.com.br
Ingressos: A partir de R$ 120,00
Vendas online: https://www.tokiomarinehall.com.br/compre-seu-ingresso/?esid=3553840

Nenhum comentário:

Postar um comentário