terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

Eloy Casagrande: as diferentes réguas para medir importantes decisões pessoais

No futebol costuma ser mais comum do que se imagina: o carque do time está sossegado, como destaque do campeonato, mas aí, de uma hora para a outra, o Real Madrid, time mais rico do mundo e melhor da década, faz aquela proposta irrecusável para todos: salário 30 vezes maior e valor irrecusável para o clube.

O jogador será chamado de mercenário, de traidor, mas seguirá o seu caminho, será eleito melhor do mundo e multicampeão. Alguém lembra de Vinícius Jr.? Neymar?

Ainda sem ter a totalidade das versões e das informações, é o que podemos especular a respeito da saída do baterista Eloy Casagrande do Sepultura, a maior banda brasileira de todas, mas que está em processo de encerramento de suas atividades. 

Às vésperas do início da importante turnê mundial de dois anos de despedida, o baterista pediu para sair de forma imediata, afirmando que tem outros projetos em vista.

Claro que a decisão e a mudança trazem complicadores para o Sepultura, até porque a decsião de parar e se despedir por dois anos do público foi muito planejada e organizada, só que nunca dá para prever quando vai aparecer um Real Madrid da vida para alterar os planos.

A comoção pela saída de Eloy está sendo grande, assim como a solidariedade aos outros integrantes da banda - e suas vitimizações. O ex-baterista se tornou um vilão, um ingrato, um sacana, alguém que "não cumpre contratos" e que larga os companheiros na mão - tudo tão previsível quanto infantil em casos semelhantes.

É o típico caso em que a régua usada para medir a coisa - no caso, condenar imediatamente Casagrande - é inversamente proporcional ao comportamento ético que cada um dos críticos teria se estivesse no lugar do músico que, aparentemente, largou tudo em prol de uma proposta mais vantajosa em todos os sentidos.

Ora, ora, não exatamente o que Eloy Casagrande fez quando surgiu adolescente como baterista da banda André Matos e a trocou pela banda Gloria, então grande sensação do rock pesado/emo brasileiro lá pelos idos de 2010, inclusive com o baterista se apresentando com o grupo no Rock in Rio no ano seguinte? 

E, curiosamente, não foi o que o mesmo baterista fez no final daquele ano ao sair do Gloria em direção ao Sepultura? E o que dizer de Kiko Loureiro quando aceitou o convite para tocar no Megadeth, em 2015? E o que dizer de Marcelo Barbosa, que saiu do Almah para substituir Kiko no Angra?

Com paixões demais e informações de menos na área, as condenações se tornam fáceis, assim como as injustiças; Os tribunais da internet funcionam a todo vapor e não hesitaram em rotular Eloy Casagerande como vilão, enquanto os "coitados" do Sepultura só tiveram 20 dias para achar um substituto, Greyson Nekrumat, americano que toca no Suicidal Tendencies.

Não se trata aqui de querer minimizar o tamanho do problema causado e da suposta quebra de confiança entre os antigos companheiros. mesmo no fim da carreira, o Sepultura estabeleceu uma marca importante: o quarteto Eloy, Andreas Kisser (guitarra), Paulo Xisto Jr (baixo) e Derrick Green Ovocais) foi a formação que mais tempo tocou na banda, superando a clássica, aquela que tebv os irmãos Cavalera (Max, guitarra e vocais, e Iggor, bateria, os fundadores), entre 1987 e 1996.

É muito justo que os integrantes da banda estejam muito irritados, como demonstraram na nota oficial de anúncio da saída onde elencam todo o processo longo e trabalhoso para planejar a despedida e a imensa turnê final. É compreensível que estejam bravos e que sintam que Eloy foi ingrato, mas não dá para ignorar o fator "Real Madrid".

Que o comportamento infantil dos f]as mais radicais predomine, como na eterna discussão sobre a volta dos irmãos Cavalera, é até esperado e também compreensível, mas vai passar. Cabe, de certa forma, à banda colocar um certo imite no processo de "demonização" do ex-integrante.

Foi o que o Sepultura fez, de forma elegante, em 2011, quando o baterista mineiro Jean Dolabella, que substituiu Iggor Cavalera, anunciou a sua saída. Rapidamente os integrantes cortaram pela raiz o boato de que Jean tinha "sucumbido" a uma exigência da esposa para excursionar menos pelo mundo, algo impensável.

O nome de Eloy Casagrande é frequentemente cotado para substituir grandes instrumentistas em bandas importantes, isso pelo menos desde 2019. Em 2023, surgiram rumores nos Estados Unidos de que poderia ser convidado para integrar o Slipknot, banda americana de nu metal e ainda hoje um gigante do rock.

Os boatos se intensificaram quando os americanos demitiram Jay Weinberg e, semanas depois, o Sepultura anunciou que iria encerrar as atividades em 2025. 

Por mais que a decisão do Sepultura tenha sido consensual ao ser anunciada, sempre ficou aquela dúvida a respeito do futuro dos integrantes. Andreas, Paulo e Derrick são pessoas maduras, com idades variando entre 53 e 56 anos de idade, com larga quilometragem, dentro do rock. Eloy tem ao menos 20 anos a menos de idade e um futuro mais do que promissor . 

Faz bastante sentido que ele tenha recebido uma ótima proposta de quem quer que seja e tenha, por exigência, que abandonar de imediato o Sepultura embicando para o fim - ainda que isso implicasse atrapalhar bastante o planejamento do Sepultura. O que você faria na mesma situação?

Muitos fãs mais radicais do Angra questionaram Kiko Loureiro por ter trocado a banda pelo Megadeth; Como assim? Mesmo hoje alguém aina tem dúvidas a respeito da diferença de tamanho entre as duas bandas? Da mesma forma que hoje, dá para ter alguma dúvida a respeito do tamanho entre o Sepultura e o Slipjnot?

Tudo era previsível assim que o anúncio da saída de Eloy surgisse. Paixões viriam à tona e as sentenças do tribunal de internet seriam proferidas imediatamente. No entanto, é lamentável que tais comportamentos sejam vistos também em declarações e comentário de jornalistas especializados que deveriam prezar pela informação completa e pela análise imparcial.

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