A má vontade e o desejo de censura que é inerente ao brasileiro do século XXI, tano á direita quando à esquerda, jogam na lama um debate importante e cada vez mais atual - e necessário: a liberdade de expressão e o uso do poder público para retaliar quem diverge ou supostamente "ofende" grupos ou instituições.
Já faz tempo que as escolas de samba de Rio de Janeiro e São Paulo fazem as críticas sociais mais contundentes dentro da cultura brasileira em seus enredos, enfurecendo os de sempre: políticos corruptos, péssimos gestores, fascistas de todos os tipos, presidentes, governadores, prefeitos, militares e chefes de qualquer aparato policial e de segurança. Quem dera artistas de rock e MPB tivessem a mesma coragem e ousadia.
A escol de samba Vai Vai, de São Paulo, em uma de suas alas, criticou a violência policial ao representar na avenida policiais militares de batalhões de elite coo opressores de pobres e populações periféricas, alguns com chifres e asas de diabos. O enredo celebrava a cultura do hip hop e outras manifestações negras de periferia, retratando coo essa população sempre foi alvo da OM paulista.
É claro que os fascistas de sempre criticaram o desfile - até aí tudo bem, críticas fazem parte -, que aproveitaram para defender a censura, por supostas "ofensas" aos policiais e aos aparatos de segurança. Mais ainda? deputados federais, estaduais e vereadores de direita estão pedindo publicamente ao prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), e ao governador do estado, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que cortem a verba pública para a escola em 2025.
Essa gente é incapaz de suportar qualquer tipo de crítica, muito menos a social, e faz elogios à violência policial que mata em massa jovens negros de periferia, com estamos cansados de saber por conta de pesquisas e relatórios mensais e anuais da violência urbana.
Se a crítica faz parte, exigir a censura e retaliação por conta de uma denúncia de mazelas sociais não. Além do mais, é preciso saber interpretar letras de música, poesias e textos diversos para evitar as mesmas generalizações que essa gente de viés fascista tanto critica.
Em vez de criticar a tentativa de calar a critica social, jornalistas travestidos de comentaristas em sites e emissora de rádio relativizam as tentativas de retaliação e tentam "equilibrar" a discussão, ao criticar o enrendo e o desfile do Vai Vai por "generalizar" a questão da violência policial com batida expressão "nem todo policial é bandido".
Houve um sacripanta, em uma grande emissora de rádio de São Paulo, que ousou afirmar que a violência policial contra cidadãos da periferia, a maioria negros e pardos, não é disseminada e generalizada, e que as pesquisas (quais?) dizem que a população dos bairros periféricos coloca a segurança pública no topo das reivindicações, "querendo cada vez mais polícia nos bairros para combater a violência e o crime organizado".
Esse tipo de argumentação beira a "fale news" e a má fé, no mínimo. É óbvio que a população como um todo, e não só na periferia, reivindica melhorias na segurança pública e jamais vai recusar um reforço no patrulhamento e na presença ostensiva onde quer que seja. A
questão é que, desde sempre e em todas as cidades grandes do Brasil, a polícia reprime e oprime a população pobre e negra, em um comportamento totalmente diferente quando se trata de agir nas áreas mais ricas.
É o preconceito social misturado com o racismo que move a ação policial em quase todas as abordagens na periferia, evocando todo o racismo estrutural que sustenta a desigualdade social brasileira.
Usar o argumento de que " a periferia deseja mais policiamento e maior presença da polícia nos bairros" para criticar a "generalização" promovida pelo Vai Vai é absurdo e soa como justifica para as ações mortíferas em operações como a Escudo, em todo o estado, onde policiais militares "investigam" autores de crimes contra os próprios policiais - e muitas vezes aproveitam para promover uma espécie de vingança contra supostos bandidos.
As mais recentes operações na Baixada Santista, em fevereiro de 2024, narra uma série de "confrontos" onde policiais são "recebidos a tiros" nas comunidades. São confrontos em que morrem 20 de um lado e nenhum do outro. Onde está o confronto? Que polícia é essa que enfrenta confrontos diários sem baixas?
Os relatos de abuso policial e de assassinatos de inocentes durante muitas dessas operações - senão em todas - mostram como é alta a letalidade policial no estado; É essa a polícia militar ou civil que a periferia quer e deseja?
Apenas alguns dados para deixar claro coo funciona a abordagem policial, principalmente na periferia de São Paulo. o estado registrou aumento de 34% no número de pessoas mortas em 2023, de acordo com levantamento do G1 feito com base nos números do Grupo de Atuação Especial da Segurança Pública e Controle Externo da Atividade Policial, do Ministério Público.
Em 2022, 248 pessoas foram mortas por policiais militares em serviço, contra 333 em 2023 (até 20 de dezembro de ambos os anos).
As mortes cometidas por policiais militares em serviço no estado de São Paulo aumentaram 86% no terceiro trimestre de 2023, se comparado ao mesmo período do ano anterior, de acordo com dados divulgados pela Secretaria da Segurança Pública
Portanto, falar em generalização no enredo e nas alas do Vai Vai soa como uma ofensa ao bom senso e à inteligência, não encontrando lastro na realidade.m Qualquer tentativa de justificar censura u retaliação neste caso é mais uma imensa violência contra a sociedade, a democracia e á liberdade de expressão.
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