quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

Vinte anos sem Joe Strummer, do Clash: o rock perdia um de seus maiores símbolos

 O menino filho de diplomatas se sentia parte do mundo, mas não se encaixa naquele lugar em que os pais chamavam de "pátria". A Inglaterra já era um país cosmopolita, mas havia algo que deslocava o jovem na hostil Londres dos anos 60 e 70. Sabia que queria ser artista, mas a sua insatisfação e "inadequação" ao mundo atrapalhavam a sua escolha.

E então veio o movimento punk, e o jovem Joe encontrou a sua razão de viver depois de ver shows de Ramones e outras bandas furiosas em espeluncas londrinas. 

Sua banda sem futuro, 101ers, desapareceu quase que instantaneamente para dar lugar a The Clash. O movimento ganhava a sua principal banda e seu principal mentor intelectual ainda em 1976. 

Joe Strummer, vocalista e guitarrista do Clash, morreu há 20 anos em consequência de um ataque cardíaco. Já não era mais a liderança punk que tinha embalado sonhos de inúmeros moleques e garotas por toa parte. Tinha voltado a ser um artista underground om sua banda Mescaleros e afirmava que estava confortável naquele papel. Desapareeu precocemente, aos 50 anos de idade. 

The Clash foi a banda que definiu o punk inglês, indo além da iconoclastia ás vezes estéril dos compatriotas dos Sex Pistols, que se mostravam delinquentes e desajustados, mas com boa dose de marketing e um comportamento ultrajante bastante calculado - tanto que não durou dois anos.

Qando Strummer se uniu a Mick Jones (guitarra e vocais) e Paul Simonon (baixo), estava claro que eram desajustados e, até certo ponto, delinquentes. Mas eram também contestadores e nada alienados. Queriam que The Clash tivesse m propósito e praticamente deram visibilidade ao rock engajado como nunca antes havia acontecido.

Havia um propósito, e Strummer orientou a produção de conteúdo com viés político de esquerda e de protesto - como não admirar uma banda que lança um álbum triplo com o nome de "Sandinista", o movimento esquerdista que derrubou a ditadura de extrema-dieita da Nicarágua em 1979? (Moimento que, infelizmente, foi desvirtuado ao longo do tempo e que hoje não passa de uma ditadura fétida...)

Os vocais não tinham polimento, mas eram urgentes e criaram uma "linhagem" de artistas que abusavam dos berros, do sarcasmo e da ironia. Ele e Jones debochavam de uma sociedade elitista, classista e capitalista, principalmente depois que a primeira-ministra ultraliberal Margaret Thatcher assumiu o governo britânico, em 1979.

A seu modo, o Clash se tornou uma máquina de matar fascistas, parafraseando o artista folk americano de protesto Woody Guthrie. Abraçou as causas antifascistas e antirracistas e mergulhou fundo som jamaicano, indo do reggae ao ska, do dub a outras manifestações da música negra, como forma de combater o racismo e as práticas sociais discriminatórias contra negros africanos e caribenhos, paquistaneses, indianos e latino-americanos.

É difícil encontrar uma canção importante da banda que não seja política - "White Riot", "London Calling", "London's Burning", "Spanish Bombs", "Rock the Casbah"... E tinha a veia pop por excelência, como "Should I Stay or Shoud I Go", "Train in Vain", Lost in the Supermarket"... E tinha o experimentalismo, como o terceiro disco de "Sandinista", recheado de sons eletrônicos e tentativas de brincar com o dub jamaicano.

Como toda boa banda punk, The Clash se autoconsumiu e implodiu em poucos anos. As contradições entre ser um artista famoso e líder d um segmento e ver uma gravadora faturar alto - e seus bolsos, vazios - causou um racha na banda em 1983. 

O quarteto queria ser melhor remunerado, com razão, mas os integrantes discordavam quando ao destino do dinheiro e ao direcionamento artístico naquele momento em que o punk estava quase extinto.

 O baterista da formação clássica, Topper Headon, tinha saído após imensas brigas, e Mick Jones seria expulso logo em seguida, destruindo a mística que ainda envolvia grupo. a banda vira um quinteto, em 1984, mas sem gás e sem criatividade - o motor furioso não funcionava sem a guitarra de Jones.

"Cut the Crap", de 1986, foi o último suspiro e então The Clash morreu para sempre. Supostas tentativas de reativar a banda teriam ocorrido, mas Jones e Simonon nunca se interessaram. Strummer criou os Mescaleros, Jones o Big Audio Dynamite e Simonon zanzou por vários projetos.

Aparentemente, os membro voltaram a ter contato nos anos 90, principalmente depois que Strummer reconheceu que foi injusto ao expulsar Jones da banda. 

Politizado e engajado, Joe Strummer era considerado um intelectual do rock e transformou o Clash em uma potente máquina de propaganda progressista a favor dos direitos humanos e da democracia. Será sempre um dos símbolos maiores do movimento punk.

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