O tsunami de rock pesado de abril passou e o mundo do entretenimento tratou de fazer as contas e decretar que o rock voltou com tudo, ao menos entre os aficionados. Até que ponto é rescaldo da pandemia de covid-19, que trancou o mundo em casa entre 2020 e 2021?
O Knotfest, em dezembro passado, já indicava que os festivais programados para este ano, assim como turnês sul-americanas de artistas de médio porte, teriam bons resultados.
Monsters of Rock e Summer Breeze (e também o Lollapalooza) surpreenderam pelo astral nas alturas e pelas vendas excelentes de ingressos e podem fazer supor que o Brasil vai retomar o lugar de meca do rock pesado mesmo com taxas de juros elevadas e preço do dólar quase proibitivo. Isso tudo é sustentável?
Especialistas no mercado de entretenimento dizem que sim, independentemente do que vier acontecer om a economia - ainda há otimismo em relação ao governo Luiz Inácio Lula da Silva, que está reconstruindo o pais depois da devastação bolsonarista (em todos os sentidos).
Em uma fase de transição em relação aos grandes astros do classic rock - são pequenas as chances de vermos de novo Kiss, Deep Purple e Scorpions, por exemplo -, a enxurrada de festivais tem o grande mérito de nos lembrar de outras bandas importantes, mas não gigantes - ao menos do tamanho das já citadas.
É sempre bom ver o Blind Guardian fazendo um show espetacular, ou o Grave Digger mostrando 40 anos de grandes hits - para não falar de Symphony X, Winery Dogs e algumas novidades como Parkway Drive.
A consolidação desses grandes eventos têm o grande mérito de trazer um público jovem que andava afastado do rock desde que esse deixou de frequentar as emissoras de rádio e de receber investimentos das finadas gravadoras.
Este talvez seja o grande feito da nova era de atrações musicais pós-pandemia. E isso anima demais empresários receosos de que os preços altos de ingressos pudessem decepcionar os negócios.
Longe disso. A banda inglesa de rock progressivo Jethro Tull remarcou sua turnê brasileira de 202 para 2024 e os preços dos ingressos foram divulgados. Tem ingresso a R$ 900 e já se espera que se esgotem rápido, a ponto de haver a especulação de um show extra em São Paulo.
Algumas comparações com o afluxo de público em estádios de futebol modernos para jogos de Palmeiras e Corinthians, além da lotação nos jogos do São Paulo que ainda surpreendem, não são descabidas.
Dá para falar em uma certa "elitização", com uma mudança de público em relação aos grandes eventos dos aos 90 e 2000. Tudo ficou mais sofisticado, melhor e, obviamente, bem mais caro.
Existe uma "casta" que dispõe de recursos para frequentar Lollapalooza e Rock in Rio, em vários dias, e ocorre o mesmo e relação ao rock pesado.
O rock voltou? Dá para dizer que sim, mas tenhamos um pouco de cautela. O mercado ainda se recupera do baque da pandemia e é necessário um pouco mais de tempo para que possamos analisar melhor o quadro.
Produtores médios de shows ainda sofrem com o mercado inflacionado de cachês e custos diversos, por exemplo. Artistas nacionais e internacionais antes acessíveis a festivais menores como Se Rasgum, Porão do Rock e Abril Pro Rock estão sendo bem remunerados (com justiça) nos eventos gigantes e, com o novo padrão de remuneração, ficaram impraticáveis.
Mesmo para promotores de turnês artistas internacionais menores a coisa está mais complicada, e a relação cachê inflacionado-dólar alto (este aliado a taxas de juros altíssimas e credito escasso) obriga a essa fatia do mercado a mudar hábitos e negociações.
Não dá para falar em canibalização dos shows menores, já que estamos falando de públicos diferentes para evento diferentes. Nos festivais, a parcela que tem um comprometimento real com a miríade de artistas à disposição é menor, como ocorre no Rock in Rio, mas é inegável que temos um retorno paulatino de público de rock para os eventos.
Talvez as comparações sejam indevidas, mas temos de ressaltar que uma banda internacional underground, como Brian Jonestown Massacre, lotou o Cine Joia, em São Paulo no abril coalhado de shows. Parece que ainda sobrou dinheiro para muita gente se divertir na turnê conjunta do alemão Udo Dirkschneider (ex-Accept) e Tim Owens (Judas Priest).
Os tempos difíceis parecem estar no passado, embora ainda seja cedo para comemorar. Se o mercado de shows está se recuperando, ao menos em relação aos grandes eventos, precisamos voltar os olhos para a área menos afortunada, aquela que foi abandonada pelo governo federal nefasto anterior e ficou de fora da concessão de ajuda financeira oficial.
O rock não voltará a ocupar o espaço que já teve, mas é ótimo perceber a volta do interesse de uma parcela jovem considerável pelo estilo.
Quem sabe seja o primeiro passo para revigorar o underground roqueiro e permitir melhores condições para que as bandas brasileiras que não são Sepultura, Krisiun, Angra, Crypta e Nervosa recebam mais atenção do público nacional fora dos grandes eventos.
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