A reclusão forçada por conta da pandemia de covid-19 gerou ansiedade, depressão, reflexão e muito trabalho entre as bandas de rock underground - e algumas obras de ótima qualidade em todas as áreas.
No metal latino-americano, o ano de 2022 foi o ano da recuperação e da readaptação, preparando o terreno para este ano despontar como o mais prolífico e intenso dos últimos cinco anos, pelo menos, a julgar pela qualidade dos trabalhos que estão sendo lançados nos primeiros cinco meses.
É o caso da ótima banda de rock progressivo chilena Aisles, que acaba de lançar "Beyond Drama", com um som moderno e antenado com o que de melhor se faz no segmento no mundo.
Cainhando em uma praia frequentada pelos britânicos do Haken e dos suecos do Soen, o sexteto faz uma mistura de estilos que chama a atenção dos mais atentos para o trabalho coeso de guitarras e teclados. Também é possível identificar traços e influências dos poloneses do Riverside.
Se as referências são ótimas, não há como o som ser ruim."Fast" e "Megalomania", que abrem o CD, já valem a audição por traduzirem o melhor do rock progressivo atual. Os riffs de guitarras expõem boas ideias, enquanto os solos econômicos soam ora agressivos, ora melódicos.
"The Plague" é mais obscura e climática, com passagens marcantes entre as partes e refrão principal. "Surrender" e "Needsun" são mais pesadas, apostando na intensidade das guitarras e em riffs pulsantes de baixo, enquanto que "Time (A Conversation With My Therapist)", melancólica e um pouco sombria, mostra a diversidade do som da banda.
Outro destaque é "Thanks to Kafka", um prog rock nem tão ambicioso, que oferece boas ideias em ambiente um pouco mais acessível ao ouvinte não tão enfronhado no mundo do rock pesado ou mesmo do progressivo.
O selo norte-americano Presagio Records é o responsável pelo lançamento nas plataformas de streaming (https://farolatino.ffm.to/beyond-drama), em mais uma aposta em bandas que fazem sons ecléticos e que almejam algum tipo de inovação.
"Nosso maior desafio foi tentar não fazer disso uma demonstração de virtuosismo, porque isso é muito frio para nós", afirma Germán Vergara, guitarrista, tecladista e segunda voz. "Queríamos dar muita atenção às melodias e isso tem sido uma característica nos corredores desde o início."
Mais do que exibições virtuosas excessivas, Aisles aposta na excelência instrumental que lhes deu o reconhecimento na Europa e nos Estados Unidos. "É um álbum de crise. Durante o processo composicional estávamos interpretando uma crise de polarização, de uma pandemia, de uma certa desolação pelo confinamento”, reflete.
O músico tem orgulho em afirmar que Aisles é, provavelmente, a banda de rock latina que mais influências de música brasileira apresenta em parte de seu som.
"Nossa história com o Brasil começou quando formamos a banda – o primeiro tecladista era brasileiro. Tem artistas que me marcaram muito, Egberto Gismonti, Hermeto Pascual, Elis Regina, a riqueza harmônica da música brasileira e sua sofisticação muitos nos marcaram", enumera o tecladista.
A produção e mixagem do disco é assinada por Angelo Marini e Germán Vergara, enquanto a masterização é de Randy Merrill.
Também do Chile vem a banda Sobernot, que faz um thrash metal moderno encharcado de groove. O grupo estreou o novíssimo videoclipe em primeira pessoa inspirado no filme "Exterminador do Futuro" para a música "Tyrant Machine", presente no álbum mais recente, "Destroy".
Para isso, o diretor Francisco Callejas usou várias câmeras GoPro fixadas aos instrumentos e, também, presas às cabeças dos músicos simulando algo inspirado nos filmes da franquia "Exterminador", estrelado pelo ator Arnold Schwarzenegger.
O intuito disso foi baseado na letra de "Tyrant Machine", que aborda pelo ponto de vista das máquinas o fato delas poderem se tornar autoconscientes e perceberem que a humanidade é a principal ameaça ao planeta Terra.
Quanto ao som, há semelhanças com o que bandas americanas coo Fear Factory fazem, com pitadas de peso típico do thrash britânico ao estilo de Evile e Gama Bomb. O groove está presente mesclado a uma violência old school que lembra algo de Anthrax. É música pesada de alta qualidade.
"Tyrant Machine" não é inovadora, mas tem uma pegada interessante e solos bem construídos. "No Mercy" descamba para algo mais próximo do Exodus, mas também resvala no hardcore furioso em cima de riffs rápidos e bem timbrados.
"Destroy" foi gravado no Estúdio Gabelo e Prestafuego, com a coprodução de Franco Gabelo e Pablo La Ronde, enquanto a masterização foi feito no Estúdio Fascination Street (Suécia), pelas mãos de Tony Lindgren (Opeth, Kreator, Sepultura, Leprous etc). A formação tem César “Vaigor” Vigouroux (Vocal), Pablo “Chespi” La’Ronde (guitarra), Joaquín “Yakls” Quezada (baixo) e Piero “Pyro” Ramírez (bateria).
"Destroy" foi gravado no Estúdio Gabelo e Prestafuego, com a coprodução de Franco Gabelo e Pablo La Ronde, enquanto a masterização foi feito no Estúdio Fascination Street (Suécia), pelas mãos de Tony Lindgren (Opeth, Kreator, Sepultura, Leprous etc). A formação tem César “Vaigor” Vigouroux (Vocal), Pablo “Chespi” La’Ronde (guitarra), Joaquín “Yakls” Quezada (baixo) e Piero “Pyro” Ramírez (bateria).
Da Venezuela vem o Cultura Tres, que nem é novidade para os brasileiros, já que seu baixista é Paulo Xisto Jr, do Sepultura., em seu projeto musical latino - assim comoo guitarrista Andreas Kisser integra o De La Tierra.
"Camino de Brujos", distribuído pela Outono / Universal Music nas Américas e Bloodblast Records no restante do planeta, foi lançado em abril e marcou as estreias de Paulo e do baterista Jerry Vergara Cevallos. Eles se juntam aos irmãos Alejandro Londoño Montoya (vocais e guitarra) e Juanma de Ferrari Montoya (guitarra).
A proposta é fazer um som extremo mais experimental na linha de Soulfly e Gojira, mas com elementos de metal industrial. "The World Its Lies" é uma canção forte, que incorpora elementos do que o Sepultura vem fazendo nos últimos anos.
"Signs" e "Zombies" seguem na mesma linha, preparando o terreno para um eventual apocalipse. O som das guitarras é inovador, que casa bem com o baixo ultradistorcido de Paulo Jr, totalmente à vontade com seu baixo na cara.
Seu instrumento também é privilegiado na mixagem da ótima canção "19 Horas", sombria e muito pesada, embora mais cadenciada, o que acentua o clima de destruição.
A faixa-título também é monstruosa, incorporando ainda mais elementos modernos e arranjos do tipo noise. É um som diferente e para que tem disposição de conferir coisas novas.
Em material promocional, o músico brasileiro contou como se juntou ao grupo. “Em 2019, depois de ouvir sobre os planos para uma nova formação do Cultura Tres, ofereci Ale e Juanma para me juntar à banda. A música é muito orgânica. Há muita influência dos anos 1990 e um pouco de hardcore também. Pessoalmente, para este novo álbum, me inspirei nos baixistas que eu mais amava lá nos anos 1970.”
Fundado em Maracay, Venezuela, no ano de 2006, o Cultura Tres, em ua essência, funde thrash e sludge metal a influências progressivas e psicodélicas, além de contar com influências de música tradicional sul-americana. O grupo já excursionou por Europa e Japão, ganhando status de revelação em publicações como a conceituada revista inglesa Metal Hammer.
Fundado em Maracay, Venezuela, no ano de 2006, o Cultura Tres, em ua essência, funde thrash e sludge metal a influências progressivas e psicodélicas, além de contar com influências de música tradicional sul-americana. O grupo já excursionou por Europa e Japão, ganhando status de revelação em publicações como a conceituada revista inglesa Metal Hammer.
Da Argentina vem o Awkanya, banda de heavy metal instrumental que tem elementos de stoner e de rock progressivo. 'Awkanya", o disco, é bastante interessante, com guitarras velozes e bem balanceadas, com algumas semelhanças com o trabalho solo de Kiko Loureiro (guitarrista do Megadeth, ex-Angra).
Em alguns momentos, como em "Cosmos", o som vai direto para o jazz na primeira parte e, sem seguida, engata uma base hard rock para o som da guitarra solo. "En Las Venas" o peso dá o tom, com a versatilidade e a habilidade nas guitarras impressionando bastante.
As boas ideias surgem em profusão também em "Dulce Cáliz" e "Tirando El Carro", que também mesclam jazz e rock pesado com muita competência. A lisérgica "Awkan" bem que poderia estar em qualquer disco dos pernambucanos do Anjo Gabriel.
Também da Argentina e na mesma praia instrumental é o Black Expression, que aposta em uma sonoridade um pouco mais pesada e retrô. O recém-lançado álbum "Forgotten Kings" não é tão direto quanto o do Awkanya, e faz questão de ressaltar a qualidade dos arranjos.
É o caso de "Tuesday in August", uma peça que mistura Yes, Jethro Tull e Black Sabbath com sabedoria e inteligência. Guitarras e teclados duelam com maestria e competência.
A banda paulistana Stratus Luna continua referência na América Latina para esse tipo de som, mas esses argentinos trilham um caminho interessante. Há partes de jazz como interlúdios e o recurso caiu bem na canção, como também climática "The Ignorant Seed". Outra canção longa e totalmente progressiva é "Strenght", onde se sobressai o excelente trabalho de guitarras.
Para finalizar, outra banda do mesmo estilo. "Fractal Cósmico" é o novo álbum dos mexicanos do Frod. É instrumental e mais calcado no rock progressivo, embora a base sonora misture hard e heavy metal.
Os teclados estão mais presentes, como na abertura, "Caos", que é um legítimo som ao estilo Pink Floyd do início dos anos 70. É psicodelia pura, e muito bem feita.
"Cabalgada en el Infierno" mergulha ainda mais fundo no som psicodélico, e tem arranjos mais elaborados, com guitarras que chegam a lembrar o estilo do brasileiro Fabio Golfetti (Violeta de Outono, Gong). O bom gosto impera, assim como o emaranhado de referências progressivas.
"Trance" visita uma área mais próxima do que os ingleses do Wishbone Ash fizeram, mas sem cair nas tais guitarras gêmeas. E mais curta e direta, mas mantém o clima lisérgico, da mesma forma que "Tormenta", que é mais clássica.
"Sentir", com alguma vocalização ao fundo de uma guitarra dedilhada, dá o clima folk da obra, enquanto que "Recuerdos" mostra a fusão do progressivo com o jazz latino, em que o piano dá as cartas e a percussão dá o clima hispânico com extrema competência.
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