terça-feira, 30 de maio de 2023

Pete Townshend relança seus 'primeiros' álbuns solo do final dos anos 70

 Na ressaca do fracassado projeto "Lifehouse", a ambiciosa segunda ópera-rock de The Who que nunca existiu, e de uma exaustiva e tens turnê americana, o guitarrista inglês Pete Townshend estava à beira de mais uam depressão severa.

Enfurnado no estúdio caseiro, toma hectolitros de qualquer coisa ao lado de alguns amigos naquele ano turvo de 1972 e queria compor algo, mas não conseguia. Dois desses amigos o ajudaram a superar o bloqueio criativo - Ronnie Lane, baixista dos Faces, e um cantor desconhecido chamado Billy Nicholls, que transitava entre o pop e o folk.

Das muitas horas de estúdio gastas em canções meio "chutadas", os três compilaram algumas canções em uma fita demo (de demonstração), mas Townshend considerou tudo muito ruim e aa abandonou. 

Meses depois, Lane e Nicholls o convenceram a lançar um LP do jeito que estava, então surgiu "Who Came First", aquele que seria o primeiro disco solo do guitarrista. Só que o próprio nunca levou a sério aquele "trabalho" de 1972, qu vendeu quase nada. Poucos ficaram sabendo de sua existência na época.

Não foram pouca as entrevistas em que Townshend considera "Rough Mix", de 1977, o seu verdadeiro primeiro disco solo. O problema é que não é um disco solo, mas feito - e creditado - a uma parceria como amigo Ronnie Lane. Cada um ficou com metade do álbum, e só trabalharam juntos de verdade em uma única canção.

"Rough Mix" e "Empty Glass" (1980), o terceiro álbum do guitarrista ( o segundo, já que ele "desconsidera" "Who Came First") ganharam nova edição neste mês de maio - mais uma vez remixados e remasterizados, mas sem os bônus que uma edição do passado trouxe.

São dois registros importantes da carreira do líder de The Who em um momento de distanciamento entre os membros do grupo.

 O vocalista Roger Daltrey se dividia entre os álbuns solo (até aquele momento, 1977, eram três) e a carreira de ator. O baixista John Entwistle estava ocupado com a trilha sonora do que viria a ser o filme-documentário "The Kids Are Alright"; já o baterista Keith Moon estava mais interessado em curtir  vida de rock star e tomar todas.

"Rough Mix" acabou sendo uma válvula de escape tanto para Townshend como para Lane, ambos em busca de um sentido para suas carreiras. Cada um gravou suas músicas e suas partes separadamente. A única verdadeira colaboração dos dois, "Heart to hang On To", uma bela balada folk de Townshend, era a penúltima do trabalho e é a melhor do álbum.

Alguns amigos estrelados participaram, como o guitarrista Eric Clapton e o baterista Charlie Watts (dos Rolling Stones), mas não foi o suficiente para transformar o LP em algo memorável.

"Misunderstood", de Townshend, é uma canção inteligente e com boa letra, caindo mais para um pop com levada de guitarra meio frenética. "April Fool", de Lane, segue a trilha folk tradicional que ele tanto amava e fazia desde que saíra dos Faces, em 1972.

"Rough Mix" é um tema instrumental composto pelos dois protagonistas, mas com uma presença um tanto tímida de Lane. "My Baby Gives It Away", de Townshend, foi uma tentativa de criar um hit pop, mas não deu certo, embora seja alto astral e divertida.

"Keep Me Turning" é um country folk lento e com ótima letra, mas mas peca pelo desânimo do guitarrista ao registrá-la, como se tivesse fazendo uma obrigação contratual. 

"Street in the City" tem o guitarrista enveredando por uma área mais "erudita", enfiando um naipe de cordas e tentando emular uma canção americana de Ira Gershwin ou Ira Berlin, grandes compositores americanos dos anos 30 e 40. Ficou interessante, mas não passa de uma curiosidade.

"Empty Glass" esteve bem longe de ser um passatempo. Denso e melancólico, quase pesado em relação ao clima em que foi gravado, tem músicas que originalmente foram compostas para um álbum de The Who., en

A questão é que Townshend não sabia o que fazer da vida no pós-morte de Keith Moon, o insano baterista, em 1978.A banda seguiu em frente com um amigo na bateria, Kenney Jones (Small Faces e The Faces), engatou uma turnê americana e outra europeia entre 1979 e 1980, mas o clima estava azedo, esquisito, e ele temia pelo fim da banda.

Mergulhado no álcool e nas drogas, e temporariamente separado da mulher e das duas filhas, o estúdio serviu de casa, literalmente, sempre abraçado a uma garrafa de qualquer coisa.

Era o prelúdio para a obra de arte solo que viria dois anos depois. "Empty Glass" foi praticamente gravado porn inteiro pot Townshend, ao estilo Paul McCartney em álbuns dos álbuns solo deste. Tocou todos os instrumentos e mexeu pouco nas gravações originais.

Lançado em abril de 1980, recebeu vários elogios da crítica pela qualidade das canções, embora nem tanto pela produção mais crua. 

Seus primeiros hits solo estão ali: a pesada e urgente "Rough Boys", uma homenagem tardia ás bandas punks, que o idolatravam, e "Let My Love Open the Door", uma das várias tentativas bregas de pedir perdão à mulher pelas pisadas na bola. É uma canção pop por excelência, mas que funcionou na época.

Tem autocomiseração, como a melancólica balada "I Am An Animal" e a excelente "A Little is Enough", a melhor do trabalho, com seu belo arranjo de sopros e teclados uelando com a guitarra bem sacada.

Roger Daltrey, o companheiro de Who, nunca teve meias palavras para criticar Townshend. Quando do lançamento de "Face Dances", em 1981, o pior disco da banda - o primeiro de inéditas sem Moon -, o vocalista reclamou que o guitarrista tinha guardado as melhores canções para o disco solo. Mal sabia ele que o próximo solo de Townshend, "All The Cowboys Have Chinese Eyes", de 1982, teria músicas ainda melhores.

Para quem tem curiosidade arqueológica a respeito de uma época diferente, com trabalhos diferentes, de artistas gigantes do rock, os dois álbuns reeditados de Pete Townshend são ótimas pedidas, assim como o primeiro álbum solo do guitarrista David Gilmour, do Pink Floyd ("David Gilmour", de 1978), "Too Late the Hero" (1981(, o quinto de John Entwistle (baixista do Who), e os discos de Jon Anderson, ex-vocalista, na época, do Yes.

O pacote de Townshend prevê ainda, na mesma toada, o relançamento de "All The Cowboys Have Chinese Eyes", mas ainda não previsão de quando isso ocorrerá.


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