O mundo globalizado potencializa os casos de boicote e cancelamento, e a principal vítima recente no mundo da música é uma banda brasileira que, supostamente, tinha encerrado as atividades após o vocalista e líder ter se envolvido em um rumoroso caso de negacionismo e eventual anipulação de dados a respeito de casos de covid-19.
O grupo paulista Armored Dawn, de power metal, com passagens em grandes festivais como Monsters of Rock e Rock in Rio, está sendo bombardeado quando o nome surgiu como "convidado especial" da turnê norte-americana da cantora finlandesa Tarja Turunen (ex-Nightwish). Ela tem 12 shows agendados nos Estados Unidos em julho.
Muitos fás brasileiros invadiram as redes sociais da cantora para alertá-la sobre o chamado "escândalo da Prevent Senior", operadora de planos de saúde e dona de hospitais que têm como donos os empresários Eduardo e Fernando Parrillo. Eduardo é médico e foi vocalista das bandas Armored Dawn e Doctor Pheabes (o irmão Fernando integrava a segunda).
A Prevent Senior ficou conhecida como uma empresa que oferecia serviços razoáveis, a preços mais baixos do que os da concorrência, para idosos. Cresceu mito rápido neste século, a ponto de se tornar patrocinadora de festivais de rock e de ser a empresa responsável pelos serviços de saúde dos mesmos eventos.
Em 2021 a empresa foi alvo de denúncias e acusações de manipular dados sobre mortes e tratamentos de covid-19, entre outras coisas, evidenciando um alinhamento com o descalabro que foi a gestão Jair Bolsonaro na pandemia.
Por questões ideológicas e de apoio a teses equivocadas, a empresa teria, inclusive manipulado dados e endossado um suposto "estudo" em que, baseados em casso atendidos por sua rede, minimizava a gravidade da pandemia de covid-19.
Foram várias as investigações abertas contra empresa - inquéritos na Polícia Civil de São Paulo e Ministério Público, sindicâncias no Ministério da Saúde e CPIs (Comissões parlamentares de Inquérito) na Câmara dos Deputados e na Câmara Municipal de São Paulo.
A banda em ascensão, a Armored Dawn projetava um crescimento internacional após turnês pela Europa, mas foi abatida pela série de denúncias, que causaram a sua exclusão de festivais e cancelamento de shows.
Com as acusações pesadas contra Eduardo Parrillo (também conhecido como Eduardo Parras), a banda anunciou o seu fim no fim de 2021 quando era um septeto. Era o auge das acusações, feitas por ex-funcionários e parentes de vítimas da covid atendidas pela Prevent Senor, de omissão de dados sobre mortes de covid, além da aplicação de tratamentos ineficazes comprovadamente, o que foi interpretado como um alinhamento ao governo negacionista e irresponsável de Jair Bolsonaro.
As CPIs reuniram fartos indícios de irregularidades e recomendaram investigações e indiciamentos de médicos e proprietários da empresa, mas os inquéritos da Polícia Civil paulista e investigações do Ministério Público não encontraram elementos para abertura de processos cíveis e criminais, desprezando, de certa forma, os relatórios finais das CPIs.
É com base nestes relatórios que muitos parentes de vítimas da covid-19 e médicos que um dia trabalharam na Prevent Senior ainda hoje bradam contra o arquivamento de inquéritos e processos e fazem de tudo para que as acusações não caiam no esquecimento.
Parte desse pessoal é responsável pelas mensagens enviadas a Tarja Turunen nas redes sociais. Atribuem a uma certa ingenuidade e desconhecimento do caso o fato de os gerentes da turnê terem escolhido a banda brasileira como abertura dos shows. Até o momento ela não se manifestou sobre a questão.
Um ano após o fim da banda, surgiram indícios de que a Armored Dawn estava ativa, reformulada e prestes a embarcar em shows no exterior.
O curioso é que um segredo forte sobre a questão foi mantido, sendo que internautas brasileiros não tinham acesso a nenhum link ou site vinculado a essa volta. Não havia informações, nem para estrangeiros, sobre a formação e qual seria a empresa de agenciamento.
Era uma banda fantasma, mas a suposta volta causou indignação em parte do meio musical brasileiro e, aparentemente, as "atividades" esfriaram - até a divulgação da turnê de Tarja nos Estados Unidos, com o o nome da banda colocado de forma discreta. Será que alguém achou que passaria "batido"?
Alguns sites ativistas e engajados brasileiros encabeçam uma campanha de boicote contra a manutenção da Armored Dawn na turnê da cantora finlandesa. São muitas as mensagens cobrando uma posição da cantora e a exclusão da banda. Aparentemente, os relatórios das CPIs ganharam mais credibilidade do que os inquéritos e investigações arquivadas.
É bom frisar: algumas das conclusões das CPIs não foram validadas por investigações do Ministério Público e da Polícia Civil. Entretanto, os indícios colhidos são preocupantes.
Chama a atenção deste caso a forma de como a banda está agindo de forma sigilosa, quase em segredo total, para voltar definitivamente à ativa, e sempre, de preferência, bem longe do público brasileiro.
A Prevent Senior sofreu, mas resistiu e praticamente deu a volta por cima, sem que o faturamento e o luro tenham sido duramente afetados. Sendo assim, qual o receio de anunciar publicamente a volta às atividades?
O Combate Rock tentou entrar em contato com Eduardo Parrillo e com alguns músicos da última formação da banda, mas não obteve retorno.
Será bem difícil o Armored Dawn recuperar o prestígio que tinha, que lhe garantiu boas vendas e turnês no exterior, além de quatro álbuns bem razoáveis.
Não se trata de torcer contra, mas de constatar como a realidade pode ser impiedosa e não perdoar alguns tipos de deslizes. Neste caso, infelizmente, os deslizes apontados e aventados são gravíssimos, o que certamente pode inviabilizar qualquer tipo de perdão.
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