terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

Nina Simone, 90 anos: ninguém cantor a dor, o sofrimento e a redenção com tanta dignidade

 Ninguém fica impassível depois de ouvir Nina Simone. Mais do que um sentimento, é uma profecia proferida por um grande mestre do blues brasileiro, Paulo Meyer, que morreu em fevereiro deste ano,  A sentença era tão impactante que ninguém ousava refutá-la.

Há quem diga que chega a ter vontade de chorar ao ouvir o canto de lamento - e de força - da diva negra do blues de todos os tempos. suas interpretações carregadas de sentimento, dor e paixão a catapultaram ao Olimpo das vozes do blues e do jazz. 

Se estivesse viva, estaria completando 90 anos - morreu aos 70, em 2003, em decorrência de um câncer de mama. Poucas conseguem ombreá-la em relevância - Billie Holiday, Big Mama Thornton, Sista Rosetta Tharpe, Ella Fitzgerald... Todas negras e maravilhosas.

Nina Simone parece ter carregado todo o peso do mundo ao cantar sobre qualquer coisa. Seja em inglês, seja em francês, ela mostrou como imprimir sentimentos em cada nota, em cada som, em cada silêncio. Quando tocava piano, cada nota soava como uma martelada no cérebro e no coração.

Difícil não fazer uma analogia com a nossa Elza Soares, nossa diva que morreu no ano passado, aos 90 anos. As duas nasceram no planeta fome, ralando tudo e mais um pouco para sobreviver nas periferia da vida e superar as enormes pedras jogas no caminho. A carne negra é a mais barata do mercado? Nina Simone assinaria embaixo.

Ouvir Nina Simone é padecer junto com o sofrimento e saborear a redenção da volta por cima de uma cantora que ousou quebrar regras e paradigmas, que se sentia no direito de se comportar como diva porque era uma, e não suportava o tratamento desigual dado às cantoras e atrizes de cinema brancas. 

Se ela cantava a dor, também cantava o orgulho da negritude e incentivava o empoderamento negro e feminino, com a força vocal e moral de um James Brown ou um Otis Redding, ou uma Tina Turner. 

Eunice Kathleen Waymon sempre soube que era talentosa como compositora e cantora, mas foi tocando piano e já como Nina Simone que mostrou a sua imponência intimidadora. Foi uma ativista pelos direitos humanos e civis e muito antes de o tema ganhar as manchetes dos jornais americanos. 

 Encontrada na Igreja por uma professora que a ensinou sobre música erudita, foi parar na escola famosa Juilliard, em Nova York, onde ela se tornou uma das primeiras alunas negras. Ganhou fama rápido, mas também sentiu na pele, literalmente, como o racismo pode moldar e tentar definir vidas e carreiras.

Seu ativismo e militância fizeram com que ela fosse rejeitada pelo mercado. Mas ainda assim ela não desistiu. Destacou por posicionar-se contra o racismo na crescente onda que tomava os Estados Unidos na década de 1960. Devido ao seu engajamento, cantou no enterro de Martin Luther King.  

Ao menos uma vez por ano surge um disco de Nina Simone com reciclagens de clássicos do blues e do jazz. Neste mês de fevereiro saiu mais uma, "Great Women of Songs Nina Simone", um álbum básico, contendo só parte das principais canções, como o hino "I Put a Spell on You", "Don’t Let Me Be Misunderstood" e "Ne Me Quitte Pas". É um bom começo para mergulhar na farta e estimulante discografia da grande dama do blues.

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