Marcelo Moreira
A maldição do rock clássico brasileiro atinge o seu auge em 2025 para desespero do mundo underground musical, que ainda pena para se recuperar da tragédia da pandemia de covid-19.
Não bastasse ser este ano o possível período em que mais teremos bandas internacionais tocando por aqui, há uma série de bandas nacionais que comemoram 30 ou 40 anos que anunciam turnês comemorativas com a perspectiva de lotações esgotadas e lucros certos.
“Há um certo descompasso mercadológico, coisa que acontece há alguns anos”, constata um importante unitarista paulistano que toca em bandas boas de rock – pediu para não ser identificado. “É reclamação ou lamúria? Pode ser, mas o fato é que os grandes eventos estão sugando/drenando recursos que eventualmente poderiam abastecer artistas menores. Se não fosse o circuito Sesc, seria um deserto total.”
Ele evita culpar a preferência do público – ou seja,o desprezo pelos artistas do underground e a prioridade para os grandes eventos. Sabe que é um tiro no pé. “É uma falácia que há público para todo mundo. Não há, e percebo isso quase toda noite em que toco, seja em bar, seja em casa noturna em todo o Brasil. A maioria das pessoas não hesita em gastar R$ 500, no mínimo, para ver banda gringa ou banda antiga, dos anos 80. Mas se recua a gastar R% 40 ou R$ 50 para conhecer coisa nova ou diferente.”
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Ira! em formação mais recente (FOTO:DIVULGAÇÃO) |
A queixa procede, pois é um hábito arraigado há tempos nos grandes centros. Músicos alternativos, sobretudo os de rock, padecem com um interesse reduzido, assolados pela concorrência internacional, dos clássicos nacionais e das bandas que fazem versões, as bandas covers que infestam os barzinhos.
A concorrência é pesada. Artistas novos, como a banda paulista Malvada, até formaram um público razoável, mas terão pela frente uma agenda de concorrentes que vi de Sepultura a Angra, de Paralamas do Sucesso a Ira!, A Mlvada chega aos cico anos com um CD no portfólio e outro a ser lançado,alémde participações de grandes festivais, mas isso tudo ainda é insuficiente para enfrentar o rock clássico.
Sepultura está encerrando as atividades com turnê gigantesca, e o Angra vai dar um tempo, mas antes vai tocar pelo Brasil inteiro. Paralamas do Sucesso, com sua turnê que antecipa os 45 anos de existência, lota arenas, assim como o Ira!, que comemora os seus 454 anos com uma turnê acústica para relembrar os 20 nos do “Acústico MTV”. Plebe Rude e Inocentes, ambas beirando os 45 anos, vão pelo mesmo caminho, assim como Lobão. que estendeu a sua turnê de c50 anos de carreira.
“Mas tem banda pequena e média que consegue viver, e bem, da música, com carreira internacional, inclusive”, dizem alguns desinformados que desdenham das queixas dos artistas do chamado underground. Os exemplos são sempre os mesmos: Boogarins, Autoramas, The Baggios, O Terno, Tim Bernardes, Ego Kill Talent...
O problema é que esses exemplos não passam de exceções - mal enchem uma mão. A realidade é a de bandas como Ratos de Porão e Korzus, as duas com mais de quatro décadas, mas que penam para manter uma agenda ativa e recheada, obrigando seus integrantes a s desdobrar em atividades paralelas.
João Gordo e Jão, dos Ratos de Porão, são donos de restaurantes e casa de shows, enquanto no Korzus seus integrantes se desdobram dando aulas de música ou trabalhando com artes gráficas.
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Inocentes (FOTO: DIVULGAÇÃO) |
Há poucos dias, por exemplo, Marcello Pompeu, o vocalista do Korzus, foi às redes sociais, pela segunda vez, pedir emprego de forma pública ao menos até março por conta da seca de shows e procura por seus trabalhos de produtor musical.
Não se trata de apontar culpados ou de procurar quem está certo ou errado. É uma constatação de uma realidade de mercado. O espetador de shows escolhe quem quiser ver e ninguém tem nada com isso. É direito o dele optar por grandes festivais ou astros internacionais.
O problema é que a cada ano cresce o número de sacripantas que afora vomitar nas redes sociais, que são uma grande fossa nesse sentido, que “não tem coisa nova rolando, não tem banda legal e diferente de rock” e por aí vai.
São os mesmos que nem de graça aparecem em shows de bandas de amigos ou festivais gratuitos promovidos por coletivos ou prefeituras. A grande profusão de atrações do rock clássico nacional aprofundou essa crise.
A polarização política do país piora as coisas ao exacerbar opiniões equivocadas de que todo músico é de esquerda e que se locupleta de “incentivos fiscais e dinheiro público. É um cenário bizarro, mas que não é nada engraçado.
Não é uma situação simples de ser amenizada com editais públicos de governos estaduais e municipais, por exemplo. É questão de hábitos culturais e de uma ação efetiva para mudar paradigmas.
Vários governos de direita e extrema-direita, avessos à cultura e com pavor de críticas, só aprofundaram esse pântano social. O rock clássico não é culpado, e só evidencia o buraco em que o cenário musical alternativo está metido.
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