terça-feira, 5 de janeiro de 2021

Cinco anos sem Bowie: até na morte músico produziu uma obra de arte

 Marcelo Moreira

David Bowie em cena em um dos últimos videoclipes que gravou (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Em um dos atos do musical "Lazarus", que fez sucesso nos últimos na Broadway, em Nova York, um dos personagens canta que a vida é breve, mas que deve ser muito intensa e valer a pena, como se antevisse a própria morte. Em vez de piedade, o verso é cantado com sentimento de esperança e como um exemplo a ser seguido.

Essa passagem não poderia ser mais icônica em relação ao seu autor, o cantor David Bowie, morto em janeiro de 2016 dois dias depois de lançar uma das mais contundentes obras-prima pop deste século.

Já virou clichê elogiar "Blackstar", o epitáfio de uma vida estrondosa, como um estupendo tributo à própria vida, em que Bowie transformou a sua morte e sua luta dos últimos meses contra um câncer no fígado em obra de arte. Mais do que serenidade para fazer isso, é preciso muita coragem para se expor desta forma.

Com isso, o cantor virou o jogo e colocou em pé de igualdade o lançamento extraordinário com a notícia da própria morte. Uma saída de cena triunfal, em todos os sentidos.

Cinco anos sem David Bowie incomoda, e muito, em um 2020 em que perdemos gente como Neil Peart (baterista do Rush), Eddie Van Halen (guitarrista do Van Halen), Peter Green (guitarrista de blues britânico), Ken Hensley (ex-tecladista do Uriah Heep), Spencer Davis (guitarrista britânico) e muitos outros.

Mais do que um artista diferenciado e inigualável, Bowie teve o mérito de se tornar o primeiro astro internacional multimídia, dominando com competência várias modalidades, digamos assim. Músico performático e dramático, atuou no cinema e na TV com sucesso, assim como suas passagens pelo teatro, dança e mímica (no início de carreira). Diante disso, sua capacidade de surpreender era imensa.

Nunca se incomodou em criar personagens e matá-los sem cerimônia quando enxergasse novas possibilidades. Foi assim como Ziggy Stadust, o Thin White Duke, o revolucionário de Berlim e o modernoso astro pop antenado com as técnicas mais avançadas de estúdio nos anos 80. 

E, quando ninguém esperava, decidiu ser apenas o vocalista de uma banda de hard rock de vanguarda no início dos anos 90, para depois se tornar o artista mais experimental e inquieto do final do século passado.

David Bowie adotou a reclusão no século XXI depois de quase 35 anos de carreira onde a ousadia, a audácia e a inovação predominaram, assim como o espalhafato de suas várias personas. Contrariando – e surpreendendo – a trajetória, mas coerente com os últimos anos, partiu de forma discreta.

Em 2003, durante a turnê do disco "Reality", Bowie sofreu problemas do coração e teve de interromper a excursão. Foi o início de um longo período distante da mídia e dos estúdios. ]

O silêncio – ao menos musical, já que Bowie há anos não concedia uma entrevista – foi quebrado em 2013, com o lançamento surpresa da canção "Where Are We Now?", no dia de seu aniversário de 66 anos. 

Nascido David Robert Jones, em 8 de janeiro de 1947, no bairro de Brixton, em Londres, Bowie formou a primeira banda aos 15 anos, The Konrads. Ele adotou o sobrenome Bowie em meados dos anos 1960, já que seu sobrenome de registro gerava confusão com Davy Jones, do grupo The Monkees.  

O Bowie ser referia à marca de uma faca de sucesso nos primórdios do século XX. O primeiro single, "Liza Jane", saiu sob o nome Davie Jones with the King Bees, em 1964, sem sucesso. 

Bowie como vocalista da banda Tin Machine, seu projeto de hard rock. Ele queria voltar a ser só mais um em uma banda (FOTO: DIVULGAÇÃO)

A carreira do artista, que também se engajava no teatro, começou a tomar forma com o lançamento do álbum de estreia, "David Bowie", em 1967. O cantor penou bastante no rock até 1971, quando o álbum "Hunky Dory" foi lançado e finalmente rendeu alguma notoriedade. 

O cantor penou bastante no rock até 1971, quando o álbum "Hunky Dory" foi lançado e finalmente rendeu alguma notoriedade. "Space Oddity", de 1969, hoje cultuado segundo álbum, surpreendentemente recebeu menos atenção do que devia. 

Com "Ziggy Stardust and The Spiders From Mars" a carreira decolou, tornando-o um dos artistas mais festejados do rock e do pop. Frequentou os palcos de teatro e foi um cobiçado ator de cinema, elogiado por atuações em filmes como "O Homem que Caiu na Terra", "Labirinto" e "Fome de Viver".

É desnecessário repetir as qualidades que fizeram de Bowie um gênio pop. "Blackstar" é um epitáfio sombrio e meio lacônico de uma grande carreira. 

No entanto, reúne as principais características de seus trabalhos musicais – ousadia, inovação, surpresa e inteligência. Não é uma audição fácil, mas acaba por se tornar necessária para entender a genialidade do cantor e multiartista.

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