quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

O que a prisão de um cantor diz sobre a atitude de roqueiros preante a pandemia

 Marcelo Moreira



Demorou mais do que devia, mas felizmente as (poucas) fiscalizações com prisões efetivas dos seres inomináveis que desrespeitam o isolamento social estão surtindo efeito. E coube a um cantor a "honra" de ser o primeiro artista a ser exemplarmente detido.

Belo, um cantor de pagode que vive no Rio de Janeiro, passou os dois primeiros dias do carnaval que não houve cantando em várias festas na região metropolitana do Rio de Janeiro, seja em locais fechados, seja em áreas públicas de favelas. 

É claro que houve (muita) aglomeração em todos os locais por onde passou, fato que vai ajudar a disseminação da covid-19, em previsível explosão que ocorrerá daqui a duas semanas em uma cidade depredada, em todos os sentidos, e à beira do colapso médico-sanitário.

Belo foi preso pela Polícia Civil por violar as regras de isolamento social, mas também por fazer um show em uma escola pública no Complexo da Maré d forma ilegal - sem autorização para o evento, o local foi invadido e o cantor teria participado da "invasão".

Segundo a Polícia Civil, o cantor responde por quatro crimes: infração sanitária, crime de epidemia, invasão a prédio público e organização criminosa. 

Entretanto, a situação ganha contornos mais dramáticos quando se ouve o que o pagodeiro disse ao entrar na delegacia para a qual foi encaminhado após a prisão: "Estou sendo preso apenas por querer fazer música, por querer trabalhar..."

Eis aí o motivo de maior preocupação - e o maior crime cometido pelo artista, em nossa opinião. São quase 245 mil mortos pela pandemia, que resiste há quase uma no e só piora no Brasil e na Europa. E o cara vem falar que quer fazer música, mesmo que isso represente a desobediência civil de todas as normas de isolamento social?

Belo se acha no direito de fazer música e provocar/participar de aglomerações com milhares de pessoas irresponsáveis como ele? Gente que ignora os alertas e burla a lei de forma explícita e escandalosa, desprezando o uso de máscara e o distanciamento social?

E quem diria que o pagodeiro irresponsável, que não hesitou em incorrer em vários crimes e debochar dos mortos e das autoridades, ganhou o apoio de vários apreciadores de rock e de alguns pseudo-artistas roqueiros, gente negacionista que coloca a vontade de tocar acima da preservação de vidas?

A velha falácia fascista-liberal-bolsonarista entrou em cena para justificar os crimes sanitários e atacar quem luta pela vida e preserva a saúde: "as pessoas só querem trabalhar, fazer arte, e as autoridades comunistas não deixam, querem matar todo de fome e quebrar o país".

O argumento é tão estúpido - vindo de bolsonaristas, só poderia ser - que nem merece maior atenção, mas a adesão ao pensamento asqueroso e encharcado de mau-caratismo é triste e revoltante. É mais um sintoma de que a sociedade está muito doente, mas o meio roqueiro está muito mais.

Pode ser por desespero, por indigência intelectual ou mesmo por vilania, mas o fato é que mais músicos de rock e apreciadores do gênero estão saindo dos armários e assumindo as posições abertamente fascistas/negacionistas e abraçando as teses político-ideológicas do nefasto presidente da República.

O pretexto de que apenas protestam por não poderem trabalhar não cola. Pensar apenas no próprio bolso e na própria vida enquanto um quarto de milhão de brasileiros morreram pela covid-19 não só é indigno, mas de profunda nojeira.

Defender Belo e outros músicos que burlam as leis para tocar em qualquer lugar não é apenas conivência - é cumplicidade. É o cúmulo do cúmulo do desprezo à vida e às normas civilizadas de convivência em sociedade. É um crime monstruoso contra a humanidade.

Gente que pensa desse jeito e defende o "direito de Belo fazer música" não merece o mínimo respeito. Merece o banimento eterno de todas as possibilidades de convívio social decente.

Essa gente é incapaz de sensibilizar com o caos trágico de Manaus (AM) e de Araraquara (SP), cidades onde não há mais leito sequer para cuidar de um resfriado. 

É gente asquerosa que apoia o genocida que está na Presidência da República, o dejeto humano que se preocupa apenas com o derrame de armas pelo país, que ignora a pandemia e que não dá a mínima para a falta de vacinas. E tem gente do rock que apoia essa tragédia. 

"Estão me proibindo de ver shows de rock, escreveu um retardado nas redes sociais. Pois tomara que nunca mais tenha a oportunidade de ver um e que o vírus o faça sentir no pulmão toda a sua falta de empatia!

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