terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

Pandemia consolida a importância do rádio, que segue fossilizado e desrespeitando o ouvinte

Marcelo Moreira




Assim como os jornais em papel, que resistem ao tempo e às previsões de extinção, as emissoras de rádio ganharam fôlego durante a pandemia da covid-19. Mantiveram-se  no topo da preferência de quem está passando mais tempo em casa, com índice de audiência que variam, no geral, entre 70% e 80%.

É um soco na cara para quem considera esse um meio de comunicação arcaico e engessado, que aposta cada vez menos em jornalismo e prestação de serviços e mais e mais em porcarias apelativas e conteúdo religioso asqueroso.

É surpreendente porque imaginava-se que pudesse ter havido um avanço, ainda que tímido, mas sólido, das web rádios e podcasts detrimento das emissoras de rádio.

No segmento de rádios que se dedicam ao jornalismo, cada vez menor em quantidade, ao menos a audiência se manteve, o que é um alento para o jornalismo, uma área bastante depredada e precarizada em todos os sentidos.

Também é um alento pra as emissoras de rádio FM fossilizadas, que apostam no mesmo modelo de negócio há mais 30 anos, com produtos oferecidos completamente desasados e conteúdos pífios. Mesmo assim, a audiência não diminui.

O que explicita algo que é lamentável: o baixo nível de exigência do consumidor de rádio, que se contenta com notícias mal apuradas e checadas, fofocas diversas e músicas muito, muito ruins. Não dá para dizer que os ouvintes são ignorantes em sua origem, apenas que são pouco exigentes e e que se contentam com muito, muito pouco.

Para quem ouve as pouquíssimas rádios rock pelo Brasil, o panorama é desolador diante do conservadorismo e da falta de respeito ao consumidor/ouvinte. Nem o básico elas conseguem oferecer, como informar o nome da música que acabou de ser executada - um desrespeito gigantesco.

A programação musical é outro desrespeito, fazendo com que um desavisado ache que os Beatles gravaram apenas cinco músicas em sua carreira - e que Rolling Stones e Deep Purple, apenas quatro, Ozzy Osbourne, três, e assim por diante.

Em plena terceira década do século XXI, ainda há restos de gravadora e alguns artistas com algum nome que aceitam fazer a "promoção" de uma ou outra música, com a massificação da mesma, suscitando a suspeita de resgate do famigerado jaba/jabaculê, ou seja, a prática corrupta de pagar pela execução maciça de algumas músicas.

No raro deserto de programas específicos, onde o apresentador/produtor tem alguma liberdade, é possível encontrar boas ideias, mas é algo cada vez mais raro.

E assim esse sistema velho, antiquado e perverso, que zomba do ouvinte e o trata como um ser ignorante, vai se perpetuando, com investimento cada vez menos em inovação e em vida inteligente.

Há alguns anos redescobriram que os podcasts são o futuro da internet, assim como as web rádios. Até podem ser, mas o crescimento de sua audiência e sua disseminação, com poucas exceções, ainda está aquém do esperado e do previsto.

Infelizmente, diante do período de trevas em que vivemos, não surpreende que tenhamos um número expressivo de ouvintes bovinos que se contentam com quase nada, sem questionar as porcarias que são empurradas. 

É lamentável observar nas redes sociais dessas emissoras e em seus sites uma pobreza de ideias e de conteúdo, com discussões dominadas por gente ignorante de todos os tipos, que faz questão de ser ignorante e babar de raiva quando alguém questiona com mais propriedade, seja exigindo algo melhor, seja apontado a alta quantidade de bobagens que é dita.

Se havia alguma boa notícia quando ouvíamos que as rádios comerciais estavam perdendo espaço e o ouvinte, querendo se qualificar e ouvir coisa melhor, era de que realmente haveria espaço, e muito, para iniciativas de web rádios e podcasts, como o programa Combate Rock. A pandemia e o conservadorismo do ouvinte médio de rádio jogaram por terra essa ilusão.

Pesquisa

Uma das mais recentes pesquisas sobre audiência de rádio no Brasil foi divulgda em setembro de 2020 pelo Kantar IBOPE Media.  

A pesquisa Inside Radio 2020 reúne dados atualizados sobre o meio, como perfil e comportamento de ouvintes, novos formatos, entre outros temas. 

As informações colhidas reforçam a importância que o veículo consolidou durante a pandemia causada pelo novo coronavírus, segundo Melissa Vogel, diretora do instituto de pesquisa no Brasil, em declaração publicada no site da Abert (Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão).

Entre os ouvintes de rádio, 75% afirmaram ouvir o meio com a mesma intensidade, ou até mais, em comparação com o período anterior à crise sanitária. Destes, 17% afirmaram ouvir muito mais rádio após o início do período de isolamento social.

O levantamento pesquisou 13 regiões metropolitanas e apontou que cerca de 78% de seus moradores escutam rádio. A cada cinco, três afirmaram ouvir alguma emissora diariamente.

A pandemia transformou também a rotina dos ouvintes e, consequentemente, revelou novos hábitos. Em comparação com o ano passado, por causa do isolamento social, a audiência registrada no trânsito caiu de 23 para 18%. Por outro lado, aumentou de 70 para 78% o percentual de ouvintes sintonizados a partir de casa

Embora haja um crescimento no acesso às emissoras por plataformas digitais, a grande maioria, cerca de 81%, ainda utiliza seu aparelho de rádio para acompanhar a programação. Para 23% da audiência, o acesso é via celular. Nos meios digitais, há prevalência de jovens das classes A e B.

Além de potencializar o alcance do rádio, essas plataformas também permitem repercutir o conteúdo veiculado pelas emissoras. Entre janeiro e junho deste ano, foram registrado 3,5 milhões de tweets sobre o meio. 

Entre a primeira e a última semana de março, houve aumento de 77% na quantidade de tweets relacionados ao rádio. Outras tendências como veiculação de podcast, streaming e realização de lives também foram analisadas no documento.

“A rotina mudou e o rádio também se transformou para continuar fazendo parte dela, seja em novos horários ou locais de consumo”, afirma Melissa Vogel.

 

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