segunda-feira, 28 de agosto de 2023

Alex Lifeson, o pilar do Rush, chega aos 70 anos

O trio fez parte de um seleto grupo de bandas de rock que quase todo mundo amava odiar, seja pela voz fina e esquisita do vocalista, seja pela megalomania progressiva e pesada que acometeu a obra por mais de 40 anos. 

Alguns artistas costumam se incomodar com este estado de coisas. Outros se aproveitam e fazem marketing. E o Rush simplesmente ignorava e seguia em frente, lotando estádios pelo mundo desde 1978, época em que alguns medalhões do classic rock começavam a descer a ladeira.

O trio canadense não fazia concessões, como alguns artistas contemporâneos, que hora embarcavam na onda disco ou amenizavam o som para ficar mais acessível ao mercado norte-americano. A ideia era ter total controle sobre a obra e o direcionamento criativo, o que sempre aconteceu.

O Rush não existe mais, e coube ao seu pilar, o guitarrista Alex Lifeson, anunciar que a banda que criou em 1970 acabou oficialmente em 2018 após uma série de problemas de saúde que acometeram o baterista Neil Peart, que morreu em janeiro de 2020, aos 67 amos, em decorrência de um câncer no cérebro.

Lifeson chega aos 70 anos de idade como a referência histórica e sonora do Rush. Se Geddy Lee, o baixista, vocalista e tecladista - que também completou 70 anos neste 2023 - é o símbolo foi gigantismo do trio canadense, o guitarrista é o pilar de uma instituição das mais importantes do rock.

Depois de mais de 50 anos de sua fundação, o grupo saiu de cena por cima como um dos gigantes da história da música popular. Se a mídia insistentemente se recusava a colocar os canadenses no mesmo patamar de glória de um Queen ou um Metallica, os fãs se encarregaram disso com inúmeras demonstrações de veneração, como nas duas vezes em que fizeram turnê pelo Brasil.

Ao contrário de Deep Purple, Black Sabbath, Saxon e mesmo o Metallica, o Rush nunca experimentou o sabor da decadência e do questionamento antes de voltarem aos patamares mais altos. 

Com uma regularidade e clareza insólitas dentro do mundo do rock, o trio enveredou por um caminho preciso e reto, superando as críticas com uma coesão e uma ética de trabalho impressionantes, que foram muito responsáveis pelo fato de a banda nunca ter cometido um disco considerado ruim ou péssimo.

Do trio que tocou junto por quase 41 anos - de 1974, quando Peart entrou, até o último sow, em 2015 - Alex Lifeson era o "menos virtuoso e genial", segundo senso comum, por mais que sempre fosse elogiado como grande guitarrista. "Fica difícil se destacar quando se tem ao lado o melhor baterista de rock [Peart{ e um multi-instrumentista fantástico [Lee]", comentam vários "detratores".

 Que disse que Alecsandar Zivojnovic (nome verdadeiro de Lifeson, de ascendência sérvia) se preocupou com isso? 

Com trânsito entre os principais pares, considerado um estilista e ótimo compositor por gente como Brian May (Queen), Ritchie Blackmore (Deep Purple e Rainbow) e Steve Howe (Yes), o guitarrista do Rush nunca ultrapassou os lites da modéstia. 

Se sempre se sentiu lisonjeado com os elogios, também mostrou imensa gratidão pelo que se tornou e pelo patamar que atingiu - fez parte da maior banda canadense de todos os tempos.

Para muitos fãs e amigos, Lifeson encarnava o verdadeiro espírito do Rush, como comentaram várias vezes os amigos do Kiss. Era um espírito leve, maroto e bem humorado. "Nunca vi e nunca soube de um show ruim do Rush. Acho que são incapazes disso", declarou certa vez o guitarrista e vocalista Paul Stanley sobre uma turnê das duas bandas pelos Estados Unidos.

Para outros tantos, o Rush tem uma autossuficiência irritante; para outros a mais, a banda vestia um mero disfarce para os momentos de suposta falta de criatividade. O fato é o Rush nunca se preocupou as críticas negativas ao lançamento de cada trabalho, que vendiam cada vez mais.

No começo eles eram clones do Led Zeppelin, atacavam os críticos canadenses. Depois se tornaram pastiches progressivos, sempre na cola do Yes e do Emerson, Lake & Palmer, marretavam os norte-americanos. 

Desconfiados, os europeus reclamaram quando os teclados soterraram o som do trio nos anos 80. E a resposta vinha certeira: vendas cada vez mais altas, álbuns cada vez melhores e shows cada vez mais concorridos e lotados. 

Com uma carreira atípica em termos de performance, o Rush se despediu forma totalmente digna e por cima, respeitadíssimo em todos os meios musicais e admirado músicos dos mais variados gêneros e subgêneros. E Lifeson foi o grande artífice para articular essa imagem tão bem construída por mais de cinco décadas. 

Nada mal para três moleques feiosos de Toronto que tinham certeza de que venceriam no concorrido mercado norte-americano. Nada mal para quem se acostumou a atropelar aqueles que amavam odiá-los.

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