sexta-feira, 11 de agosto de 2023
Rock and Roll Circus, 55 anos: o dia em que Mick Jagger se sentiu derrotado
O dinheiro corria solto e a banda estava enferrujada, pois fazia dois anos que estava fora dos palcos. Depois que viram os Beatles partindo para fazer filmes e programas de TV, finalmente os Rolling Stones embarcavam na mesma onda, e tinham certeza que daria certo. Só esqueceram de combinar com os convidados pesos pesados.
"Rolling Stones Rock and Roll Circus" deveria ser um especial de TV com orçamento de longa-metragem de Hollywood. Seria veiculado no Natal de 1968 na Inglaterra e em janeiro seguinte nos Estados Unidos.
E, há 55 anos, deveria também ser um marco da história da música, já que reunia a realiza do rock britânico naquele 13 de dezembro de 1968. Mas nunca foi ao ar até ser editado em CD e DVD em 1006, ainda com cert resistência de Mick Jagger, o vocalista dos Stones.
Com certa inspiração no fracassado "Magical Mystery Tour", dos Beatles, exibido no Natal de 1967, os Stones resolveram criar o seu circo um ano depois, tendo o cuidado de evitar alguns dos erros dos concorrentes de Liverpool.
Só não contavam com um fato importante: eles mesmo não estavam preparados, e os convidados chegaram com a faca nos dentes. E eis então que Mick Jagger fica embasbacado e furioso quando The Who sobe ao palco para gravar a sua parte, a pequena ópera-rock "A Quick One, While He's Away", com seus quase 10 minutos.
Roger Daltrey, então no começo do seu auge como artista e como cantor, emula o deus louro do rock e tem uma performancde arrasadora, a ponto de correrem rumores de essa performance ter sido o motivo para o engavetamento das gravações do especial.
Seja como for, isso pode ser parcialmente verdade, pois a explicação oficial, à época, foi a de que os Stones não terem ficado satisfeitos com seu desempenho como um todo, seja como atores, seja como músicos.
Outra versão dá conta de que, ao fim do contrato dos Stones com a Decca Records, a gravadora e o gerente Allen Klein ficaram com os direitos totais sobre todas as obras produzidas pelos Stones até ali, o que incluía, este show.
Klein teria impedido o lançamento do disco e a exibição do especial na TV posteriormente. Tanto o áudio, em CD, quanto o DVD só foram lançados 28 anos depois, após muita discussão e convencimento a Mick Jagger e Keith Richards..
Deixando de lado o que se pode chamar de apresentações preguiçosas e cômodas dos Stones, o que podemos ver em "Rock and Roll Circus" é uma grande confraternização entre amigos, que "por acaso" eram celebridades do rock.
O americano Taj Mahal mandou bem em "Ain't That A Lot Of Love", assim como o novato Jethro Tull no blues folk "Song For Jeffrey" – e tendo Tony Iommi, futuro Black Sabbath, na guitarra. Marianne Faithfull, então namorada de Mick Jagger, não fez feio em "Something Better".
Como já dissemos, o Who detonou e foi o melhor das noites de gravações em 10 e 11 de dezembro, enquanto a decepção ficou por conta da banda The Dirty Mac – um ajuntamento de última hora que reuniu John Lennon (vocais e guitarra), Eric Clapton (guitarra), Keith Richards (baixo) e Mitch Mitchell (bateria, da banda Jimi Hendrix Experience).
Sem entrosamento e, ao que pareceu, quase sem ensaio, fizeram uma versão para "Yer Blues", dos Beatles. Não foi um desastre, mas tampouco foi memorável por conta dos nomes que compunham, o ajuntamento.
Quando aos Stones, as performances foram razoáveis nas cinco músicas, variando entre o desinteresse e o comodismo – ou mesmo a ferrugem, já que fazia tempo que não se apresentavam ao vivo.
A banda deu preferência ao então material mais recente, do álbum "Beggar's Banquet", lançado meses antes. Começaram bem com "Parachute Woman", um country blues pesado e psicodélico, para emendar a balada folk "No Expectations", anticlimática para o momento.
Surpreendentemente, tocaram em seguida a então inédita "You Can't Alway Get What You Want", que só seria lançada em single em meados de 1969 e no álbum "Let It Bleed", do final do mesmo ano – no entanto, ela foi gravada em novembro de 1968.
Na execução, mostram ainda pouca intimidade com a canção, que viraria um dos hinos da banda e do rock. No final, os Rolling Stones dão um pouco mais de gás e melhoram na icônica "Sympathy for the Devil" e na apoteótica "Salt of the Earth", com seu final festivo envolvendo todo mundo.
Após 5e anos, "Rolling Stones Rock and Roll Circus" precisa ser visto como uma grande celebração do rock inglês, reunindo astros de primeira grandeza e apontando para um futuro onde a TV e o cinema estariam cada vez mais interligados com a música pop.
Assisti-lo hoje, mais do que nostalgia, evoca um sentimento de que muitas outras oportunidades semelhantes foram perdidas ao longo dos 15 ou 20 anos seguintes, até que os grandes festivais beneficentes e os encontros musicais do Rock and Roll Hall of Fame resgatassem a tradição de juntar estrelas em um mesmo palco. É um dos grandes momentos da história da musica pop.
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