segunda-feira, 14 de agosto de 2023

Voz imponente da neosoul music, Flavia K experimenta e se sai bem em ' Universo Sspenso'

 Música sofisticada também pode ser pop. Fugindo de estereótipos enraizados há décadas, cantoras brasileiras buscam novas formas de expressão para trilhar caminhos menos saturados driblando o samba, a MPB e o funk estéril que dominam as plataformas digitais. E então é a vez do neosoul, gênero que está em ascensão no Brasil.

Depois de Juliane Hooper conseguir bons resultados com seu primeiro EP misturado canções e português e inglês, é a vez de Flavia K voltar com força pra divulgar seu último álbum, "Universo Suspenso", uma coleção de temas delicados e bem construídos que escapam do lugar comum.

A moça tem 24 anos, mas já se aproxima dos dez anos de carreira. Refinando um repertório com parcerias diversificadas, incluindo a mãe, Anete K, letrista talentosa, Flavia exala bom gosto e mantém firme o direcionamento musical sem medo de parecer "inacessível" aos olhos de certo público costumado com melodias fáceis. Trabalha a voz de registros não muito altos com habilidade e inteligência, abusando da suavidade na maioria das canções.

"Consigo exprimir meus sentimentos e minha bagagem musical de uma forma orgânica, o que reflete minhas influências", disse Flavia K em entrevista ao Combate Rock. "Muito do meu trabalho autoral tem raízes fortes na música brasileira, cuja diversidade permite misturar com várias coisas e alcançar resultados fascinantes."

O caldeirão sonoro no qual o som se baseia é orgânico, com o privilégio de instrumentação ambiente e captada no estúdio de forma simples e direta, com o apelo discreto a alguns beats de arranjos eletrônicos.

O som alcançado ultrapassa o rhythm and blues de inspiração norte-americana para avançar em direção ao jazz, apontando para um caminho já trilhado com sucesso por cantoras inglesas como Lisa Stansfiel e Amy Winehouse. 

Ótima melodista, constrói canções simples e diretas, mas que crescem com arranjos de piano e uma ambientação classuda que resgatam o jazz e a bossa nova um tanto esquecidos por aqui ultimamente.

Muito Soul" é moderna e traz o auxílio luxuoso do rapper Rashid, aqui menos rapper e mais repentista. "Float Away", a única em inglês, é pura sofisticação, com ares de soul britânico tão badalado na voz de Sade Adu.

"Serena Esperança" realça a qualidade de seu trabalho, diversificando temas e abordando outros aspectos da vida. "Tenho sido bem-sucedida em transitar por temas que vão além do romantismo e do simples relacionamento amoroso. Eu em propus a isso e meus parceiros compositores têm total responsabilidade nestes bons resultados."

A aposta deu certo e ela consegue transmitir mensagens positivas e interessantes mesclando todas as suas influências. E aqui observamos outra característica instigante de "Universo Suspenso": um engajamento-empoderamento feminino diluío de forma suave, mas eloquente e embalado de forma sofisticada.

"Serena Esperança" vai nessa linha, assim como a delicada "Novas Esquinas", com base uma boss nova em dueto mágico com o cantor Filó Machado. Com vocais jazzísticos à la Ed Motta, o cantor acrescenta um colorido extraordinário em cona de um tema escrito por Anete K.

"Esse clima e alto astral é uma forma também de passar uma mensagem contundente. "A ideia de 'Positive Soul' é isso, manter a alma positiva, trazer bons pensamentos e boas atitudes sempre, na vida", explica a cantora. "Na contramão de vários outros movimentos onde se romantiza a tristeza, eu procuro valorizar a alegria, e tentar levar palavras positivas para as pessoas e encorajá-las a se manterem firmes, e também a pedir ajuda se for preciso. E isso é uma forma de empoderamento."

"Dias Bons (Alright)" é o maior exemplo, trazendo o jazz pop para ilustrar o discurso mais sofisticado por trás de uma batida suave e uma letra habilidosa e densa. 

A nova versão de "Dias Bons (Alright)", agora com outros timbres e participação da rapper americana Ill Camille, vêm para fortalecer quem já não está tão fortalecido. "Sorria sempre", diz a principal mensagem na voz gostosa de Flávia e na imposição mais dura da declamação da americana.

Até a melancolia do dia a dia ganha contornos bastante delicados em "Longe dos Abrações", cujo destaque é a condução precisa de piano e guitarra acústica, em que jazz e bossa nova se misturam de forma esplêndida. 

"O Mundo Se Moveu" reflete sobre dias que parecem não se mover e você está paralisada, e só o tempo parece ter esse poder. "Lua Nova" é primeira faixa produzida inteiramente pela Flavia K, era inicialmente uma poesia de Flora Piquerobí, juntas transformaram poesia em cores e som.

As harmonias vocais, em muitas das canções, remetem aos grupos americanos que cantam à capella, como o Take 5, influência confessa da cantora. O trabalho tem um groove diferente, com boas doses de R&B alternativo, ritmos brasileiras e smooth jazz, o que confere um aspecto de novidade entre as artistas da atualidade. 

Os teclados e sintetizadores, ao contrário do esperado, não saturam, e percorrem as melodias em consonância com as linhas de baixo e bateria groovadas em sincronia. e os timbres de piano Fender Rhodes dão um aspecto de inovação. É uma obra diferente de uma artista que ostra ousadia e que não tem medo de experimentar.

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