sexta-feira, 20 de outubro de 2023

Excelência e capacidade de trabalho colocam dois brasileiros na banda Metalium

Não se trata de predileção, mas é cada vez maior o número de músicos sul-americanos ocupando ponto relevantes dentro do rock internacional, principalmente em bandas europeias de rock pesado. 

Brasileiros estão se dando bem nos Estados Unidos e na Inglaterra, enquanto que argentinos e chilenos crescem na música dos países escandinavos. 

O exemplo mais proeminente é a chegada de Kiko Loureiro, ex-Angra, ao Megadeth em 2015. Mais recentemente, outro brasileiro, o vocalista e guitarrista Guilherme Miranda, ex-Entombed A.D., se juntou ao baixista David Ellefson, ex-Megadeth, na banda Dieth.

Portanto, não foi surpresa - ainda que seja motivo de grande orgulho - que o ressuscitado gigante alemão Metalium anunciou dois brasileiros em sua nova formação - o baixista Fábio Carito e o baterista Marcus Dotta. 

Carito passou por várias bandas nacionais, como o SupremA, além de ser muito requisitado por músico estrangeiros em turnê pelo Brasil com gente local, como Warrel Dane, ex-Nevermore. Dotta também tocou com Dane e com a banda brasileira de metal progressivo Vikram, além do Addicted to Pain.

 Nas redes sociais, os dois comemoraram o anúncio de que são os novos integrantes da banda. "É absolutamente inacreditável fazer parte do Metalium, banda que foi diretamente responsável por me influenciar em inúmeros pontos dentro da música. Primeiramente, como fã incondicional, será uma enorme responsabilidade substituir seu fundador Lars Ratz, que tragicamente nos deixou muito cedo", escreveu Carito.

Já Marcus Dotta disse estar honrado. "É uma grande honra fazer parte desse ícone do power metal mundial. Assim como o Fábio, fui muito influenciado por eles. Comprei o primeiro disco da banda quando eu estava começando a tocar bateria e passava os intervalos das aulas na escola ouvindo-o. Então, foi surreal receber o convite para integrar o time."

Os dois músicos conversaram com o Combate Rock, por e-mail, sobre o ingresso na banda alemã hoje liderada pelo vocalista Henning Basse. O fundador do Metalium, o baixista Lars Ratz, morreu em 2021, aos 53 anos, em um acidente de ultraleve.

Vocês já conheciam o Metalium, que foi importante na virada do século e depois deu uma certa desaparecida?

CARITO - Sim, conheci a banda em 2002 através de uma coletânea de uma gravadora nacional que infelizmente não me recordo o nome. A música do Metalium que estava nesta coletânea era a "Revenge of Tizona", do terceiro disco da banda e, imediatamente após ouvi-la, virei fã. Hoje tenho os oito discos de estúdios e os dois DVDs ao vivo, bem como o flyer e pôster do show cancelado que fariam no Brasil

DOTTA - Eu conheci a banda no ano 2000. Eu estava no ensino médio e lembro claramente o momento em que um colega veio com um saudoso diskman e falou pra eu ouvir um disco que ele tinha descoberto e estava viciado. Era o primeiro disco do Metalium. Imediatamente fiquei viciado no disco também. Lembro de eu sempre ouvir Metalium no som mecânico do também saudoso Via Funchal no começo dos anos 2000.

Com a entrada de vocês, Metalium se torna quase uma banda de brasileiros-lusos, já que o guitarrista Bruno Nunes também colabora com a banda. Como será essa junção de metal alemão com o brasileiro, que tem características distintas?

CARITO - O Bruno é português, o que pelo menos torna o português a língua oficial da banda (risos), mas claro que todos nós nos comunicamos em inglês. Eu acredito que nós seguiremos com a essência alemã da banda, já que os fundadores (Matthias e Henning) estão lá.

DOTTA - Nossas influências não diferem muito do caminho tradicional da banda. Eu amo power metal, minha maior influência é o Uli Kusch, ex-batera da minha fase preferida do Helloween. Então a essência do Metalium continuará lá.

Como o vocalista Henning Basse chegou até vocês?

CARITO - Eu e o Dotta, juntamente com o Johhny Moraes (Warrel Dane/Hevilan), temos um projeto autoral, onde tive a ideia de contratar o Henning para cantar nessas músicas em 2021, já que era muito fã de sua voz. Após ele finalizar suas gravações, mantivemos o contato. Em julho deste ano, vejo no Facebook que o Metalium estava de volta à ativa, porém sem baixista e baterista. Retomei o contato com o Henning, gravei um vídeo tocando as principais introduções de contrabaixo do Metalium e mostrei para ele. Depois disso, começamos a conversar, acertar os detalhes, tirar algumas dúvidas já com o resto da banda e o resto felizmente é história. Na realidade, este vídeo já era uma ideia antiga minha de fazer, já que o intuito era homenagear o Lars, que sempre foi uma grande influência para mim.

DOTTA - No meu caso, o Fábio me indicou para o Henning logo após ele ter mandado o vídeo e iniciado as conversas. Imediatamente eu gravei um vídeo tocando uma das músicas da banda e também mandei pro Henning. No dia seguinte eles colocaram nós dois numa videoconferência com todos da banda e vimos que a coisa tinha ficado séria mesmo. Mas, como o Fábio disse, eu também já conhecia o Henning anteriormente do projeto que contratamos ele para cantar em algumas músicas.


Fábio tem um estilo de tocar que traz muito do que baixistas não europeus costumam imprimir em seus trabalhos, que é um groove geralmente associado aos seus locais de origem,. Lars Ratz, o fundador do Metalium, era um baixista alemão típico, com um estilo mais reto e duro de tocar. Como será para você tocar o repertório clássico da banda?

CARITO - Ele sempre foi uma enorme influência para mim pois seus arranjos e timbres me chamavam muito a atenção, justamente por ser um pouco fora do padrão do estilo. Na realidade, se hoje eu também toco com palheta, é justamente por "culpa" dele. Naturalmente, por já ser fã do Metalium a anos, eu toco um grande número de músicas da banda.

Já pensaram na logística necessária para ensaios, gravações e turnês? Há chance de Basse se tornar cidadão honorário de São Paulo?

CARITO - Os planos iniciais são de cada um finalizar suas partes das composições para o disco e depois ajustar a logística para a gravação. Para turnês, o mais coerente, devido à distância, é nos reunirmos alguns dias antes, talvez uma semana e fazer um intensivo no estúdio para acertar as músicas e ensaiar o show.

DOTTA - Provavelmente eu gravarei a bateria aqui no Brasil mesmo. Hoje em dia fica fácil de gravar remotamente e todos participarem da pré produção através da internet. E a vantagem de ter dois membros da América do Sul é que pra uma tour na América Latina, fica mais fácil e barato para eles virem pra cá e nos reunirmos aqui para os preparativos pré tour.

Vocês participarão da composição de novas músicas ou estas já estão prontas?

CARITO - As músicas já estão praticamente prontas, mas temos total liberdade para compor nossas linhas. Já sobre as letras, até onde eu sei, não estão todas finalizadas. Como eu adoro escrever, pedi para o Bruno a possibilidade de ajudar a banda com esta parte. Vamos ver.

DOTTA - As demos já estão bem adiantadas, mas vamos colocar nossa cara nas músicas no momento da gravação.

Metalium sempre foi uma banda associada ao power metal, embora alguns de seus trabalhos possam ser considerados algo com características de metal tradicional. Isso deve ser mantido com a entrada de vocês?

CARITO - A ideia da banda é remontar a essência dos dois primeiros discos, que são os preferidos dos fãs, então as músicas estão mais puxadas para aquela linha.

Das bandas que surgiram no boom do power metal alemão dos anos 90 - Metalium, Edguy, Primal Fear, Gamma Ray, Iron Savior, Sinner e mais algumas - somente o Primal Fear manteve uma carreira consistente e longa para concorrer com o Helloween. Esse tipo de som ainda tem espaço atualmente? Sabaton e Stratovarius ainda têm algum sucesso, mas bem menos do que antes...

CARITO - Eu acredito que sim. Este estilo teve seu auge no começo dos anos 2000, mas hoje você vê a volta de bandas resgatando o power/melódico. Vejo que um dos maiores exemplos é o Northtale, que reinventou o gênero com muito bom gosto.

DOTTA - O Metalium sempre colocou peso no seu jeito de fazer power metal. Nunca foi algo genérico ou parecido com outras bandas. O primeiro e o segundo discos, especialmente, tiveram um grande destaque na época justamente por serem muito diferenciados e inovadores dentro do estilo. O impacto que eu tive ouvindo esses discos foi o mesmo quando eu ouvi o "Better than Raw", do Helloween, pela primeira vez. O Helloween clássico está ali, mas ao mesmo tempo elevaram pra outro nível com músicas mais muito mais pesadas e técnicas. Essa força inovadora do Helloween da época também está muito no Metalium.

 Em relação à bateria, produtores alemães costumam ser rígidos em relação ao tempo e á precisão, o que eventualmente causa estranhamento a instrumentistas não europeus. O Angra e o Shaman tiveram algumas dificuldades quando gravaram seus discos na Alemanha. Isso chega a ser algo complicado para o Marcus?

DOTTA - Não, pois como falei, sou muito familiarizado com esse estilo. Já gravei outros discos que seguiam o mesmo rigor técnico. O disco póstumo que gravamos do Warrel Dane, "Shadow Work", foi gravado com muito cuidado nessa parte. E, inclusive, foi mixado por um alemão, o Lasse Lammert. Então, esse rigor não é novidade para nós e não será diferente agora no novo disco do Metalium.

Entre os músicos latino-americanos, os brasileiros são os que aparecem em maior número tocando em bandas internacionais, principalmente na Europa. E vocês corroboram isso. Conseguem identificar razões para que os brasileiros se deem melhor no rock pesado internacional ao ocupar postos em bandas importantes? 

CARITO - Eu acredito que na verdade neste caso a nacionalidade pouco importa. Falando por nós, somos músicos profissionais que topamos os desafios e aceitamos as oportunidades. Parece besteira, mas o simples fato de você ser uma pessoa fácil de lidar e de convívio tranquilo já são 70% do as bandas pedem.

DOTTA - E também tem a questão da vontade, da gana, de perseguir essa carreira e seguir esse sonho. Muitos músicos daqui agarram com todas as forças esse tipo de oportunidade concreta de carreira internacional, pois estamos acostumados de como as coisas aqui são muito mais difíceis para quem quer ser um músico profissional, principalmente nesse estilo.

Até que ponto tocar com artistas estrangeiros que vêm tocar no Brasil sem banda própria os ajudou a ter a preferência no Metalium?

CARITO - Se o americano Warrel Dane não tivesse passado em nossas vídas, com certeza não teríamos entrado no Metalium. Tocar com músicos estrangeiros exige um grau de atenção maior, porque lá eles tem os melhores equipamentos, as melhores estruturas e os melhores músicos, e quando eles vêm para cá, o mínimo que eles esperam é ter o mesmo nível que estão acostumados a receber.

DOTTA - Esse tipo de oportunidade te prepara para um nível de cobrança maior, de lidar com mais pressão, pois vc está no mesmo palco que ícones mundiais do estilo. E também a questão de aprender a trabalhar com pessoas de outros países e culturas.


 

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