José Celso Martinez Correa não era uma pessoa fácil. Luminar e luminoso, preenchia todos os ambientes com sua sabedoria e verborragia, e não gostava de ser contrariado. Entretanto, quando decidia ouvir o interlocutor, tinha uma capacidade imensa de aprender e transformar qualquer isa em arte.
O dramaturgo e teatrólogo paulista morreu aos 86 anos de idade em decorrência das consequências do incêndio que ocorreu no quarto de dormir em seu apartamento. Uma tragédia bizarra provocada, aparentemente, por um aquecedor defeituoso.
Ele era também ator e escritor, tudo em uma personalidade incandescente e transbordante capaz de produzir leituras e releituras instigantes de textos clássicos da dramaturgia nacional, de dar estofo a movimento culturais e de criar uma instituição cultural de vanguarda como o Teatro Oficina, em São Paulo, que existe há 65 anos.
A figura multicultural tem uma importância gigantesca na vida cultural brasileira no teatro, mas também na música - e, dd cert forma, para o rock, se considerarmos o tropicalismo e a Tropicália como moimentos musicais de vanguarda associados ao rock.
Zé Celso foi o primeiro intelectual e artista de renome a abraçar aquele "esboço" de movimento cultural lançado por músicos baianos e maestros paulistas lá em 1968 como forma de chacoalhar a cultura e o entretenimento, além de confrontar, de certa forma, o conservadorismo da MPB e a ditadura militar.
Com suas montagens irreverentes e violentas, como "Roda Viva", baseado em texto e músicas de Chico Buarque, era considerado subversivo e iconoclasta - o que realmente ele era -, o que enfurecia os poderosos de plantão e atiçava o conservadorismo anticomunista.
Para coroar o comportamento subversivo, já era militante LGBTQIA+ antes mesmo disso existir, já que nunca escondeu homossexualidade.
Ao se inserir no tropicalismo enquanto ideia nem tanto na estética -, Zé Celso se agigantou ainda mais, ganhando lugar cativo entre os intelectuais de um Brasil encalacrado entre o moderno e o arcaico. Foi um apoio fantástico e decisivo para a consolidação do tropicalismo e o surgimento de uma música popular brasileira contemporânea, rica e contestadora.
Para quem se acostumou apenas a vê-lo protestar e esbravejar nos últimos anos, ele não passava de um idoso chato que insistia em brigar com o empresário e apresentador Silvio Santos, que queria construir um shopping e um centro comercial ao lado do Teatro Oficina, no bairro da Bela Vista, na região central da cidade.
Essa cruzada lhe garantiu mais visibilidade e o rótulo de agitador cultural e ativista urbano progressista, um intelectual que se insurgia contra a voracidade capitalista que devora patrimônios históricos e que depreda a vida cotidiana das cidades.
A cultura nacional perde um personagem fascinante e um ser que tinha uma urgência em viver e criar arte o tempo todo. Que o Teatro Oficina continue sendo um bastião de resistência e luta inspirado sempre em seu criador.
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