sexta-feira, 11 de junho de 2021

Crypta estreia com álbum avassalador e calcado no poder de duas guitarras

 Marcelo Moreira



Destruição, violência, e dor, tudo embalado em uma urgência para quem precisa mostrar a desgraça. Tudo isso era esperado, mas que bom quando a surpresa vem e te derruba. E assim "Echoes of the Soul", da banda brasileira-holandesa Crypta chega para derrubar as paredes.

É inegável que havia um climão à espera do disco. "Perpetual Chaos", da Nervosa, chegou no comecinho do ano e impressionou pela porra e da pela pancadaria. Na inevitável disputa entre as duas bandas femininas, estava claro que as apostas estavam altas. E não é que todo mundo ganhou?

Fernanda Lira (vocais e baixo) e Luana Dametto (bateria) sabiam que estavam dando um passo arriscado e grande ao deixarem a Nervosa em meados do ano passado, em plena pandemia e no auge do trio feminino brasileiro. 

A ruptura foi civilizada, mas Lira nunca escondeu as coisas estavam bem complicadas, como contou recentemente em entrevista ao site Metal Injection. 

"Lamentei muito a saída da Nervosa, tinha comigo que era a minha meta de vida, mas aconteceu. A Crypta era um projeto paralelo que se tornou um recomeço para minha carreira e da Luana, o que amenizou o trauma e facilitou a retomada", disse a baixista e vocalista.

Se Prika Amaral optou por correr contra o tempo, reformular a Nervosa e soltar um álbum em no máximo seis meses, a banda Crypta, ciente das comparações que começaram no primeiro minuto do anúncio da separação, decidiu por fazer as coias com mais calma, o que incluiu a opção por ter duas guitarras, o que foi o maior acerto do novo projeto.

Tainá Bergamaschi e a holandesa Sonia Anubis criaram um pesadelo sonoro em dose dupla em todas as canções de "Echoes of the Soul", um traço que, em alguns momentos falta a (e falta) ao som da Nervosa, principalmente ao vivo.

"Starvation", tempestade furiosa que desaba na abertura (após a climática intro chamada "Awakening"), entrega logo o que a Crypta tem a oferecer: som vigoroso, alguns duelos de guitarra e um baixo pulsante e cavernoso, tudo suportado por uma bateria veloz e intensa.

É death metal na veia, com as guitarras explodindo nos alto-falantes de forma reta e direta. Neste disco, mais uma vez a opção foi a correta, evitando qualquer associação com um death mais melódico ou intrincado. Já se sabia que o quarteto feminino trataria de colocar uma declaração de guerra neste trabalho.

"Possessed" e "Shadow Within" parecem músicas gêmeas, unidas por sua fúria e devastação. É uma dobradinha poderosa que estremece qualquer ambiente e aqui fica evidente a diferença no baixo em relação à Nervosa: Fernanda Lira não tem mais aquela necessidade de preencher certos espaços e consegue percorrer um caminho paralelo substancial. As linhas de baixo esto mais soltas e incluem caminhos diferentes e que enriquecem o som da banda, que está sólido e contundente com duas guitarras.

Crypta (FOTO: DIVULGAÇÃO)

"Under the Balck Wings" é um passo adiante em relação às anteriores, já que aposta muito no peso, mas nem tanto na velocidade, quase resultando em um thrash metal old school em que as guitarras percorrem caminhos distintos, mas trabalhados e intensos.

O primeiro single divulgado, "From the Ashes", tem muitas das características de "Starvation", e encerra o trabalho pisando no acelerador, naquela que certamente é a melhor faixa.

Mas tem ainda "Kali", que é uma tentativa de variar o som, com solos cortantes e afiados em cima de uma base melódica bem pesada. Aqui o instrumental é destruidor, com uma intensidade de tirar o fôlego, ao que se repete em "Blood Stained Heritage", com seu ótimo riff e vocais mais estridentes e poderosos. Os vocais também são o destaque da tenebrosa e violenta "Dark Night of the Soul, possivelmente a mais climática do disco.

"Echoes of the Soul" correspondeu às expectativas geradas desde a formação da banda e da implosão da Nervosa. é uma obra poderosa de metal extremo e de qualidade alta. 

Em uma eventual comparação com o CD "Perpetual Chaos", da Nervosa, um álbum mais cru e voltado para o thrash metal, tem a vantagem de ter uma produção mais redonda, já que houve mais tempo para ajustes e eventuais correções. No mais, são dois discos que elevaram bem a qualidade da música extrema brasileira, assim como o EP "Parasite", do trio feminino The Damnnation.

O jogo agora é nos palcos, para quando a pandemia deixar. Com duas guitarras, a Crypta certamente vai ensurdecer as plateias com seu metal avassalador e sua parede de guitarras.

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