sábado, 12 de junho de 2021

Na parte internacional, In-Edit destaca Phil Lynnot, Suzi Quatro e o heavy metal

 Marcelo Moreira



Imponente, grandioso e eloquente. Mesmo que não quisesse, o baixista e cantor irlandês Phil Lynnot, da banda Thin Lizzy, ocupava todos os espaços por onde circulava. Era esfuziante e espalhafatoso, um modo de mascarar a timidez e a falta de traquejo para lidar com a fama.

Esse personagem controverso é um dos destaques do panorama mundial do In-Edit - Festival Internacional de Documentários Musicals, em cartaz no Brasil, online, de 16 a 27 de junho.

"Phil Lynott: Songs For While I'm Away" tem a direção segura de Emer Reynolds, um admirador do músico irlandês, a quem considerava um cara diferenciado. Filho de pai guianês (há controvérsias, pois alguns biógrafos dizem que seu pai era venezuelano ou até mesmo brasileiro) e mãe irlandesa. 

Nasceu em Birmimgham, na Inglaterra, onde a mãe trabalhava, mas cresceu na Irlanda, com sua família materna, depois de ter sido abandonado pelo pai quando tinha apenas três semanas de vida.

Negro rodeado de brancos por todos os lados, Phil viveu na juventude a febre dos anos 1960 e se entregou ao rock and roll. À frente do grupo Thin Lizzy, emplacou grandes sucessos, como “The boys are back in town”, “Dancing in the moonlight”, “Whiskey in jar”, entre tantos outros.

"Songs For While I’m Away" conta sua história por meio de entrevista com amigos, familiares e parceiros musicais e está recheado de material inédito.

Outro destaque da mostra também vem da Irlanda. "Crock of Gold: A Few Rounds with Shane MacGowan" é um filme do premiado diretor Julian Temple, com produção do ator e músico Johnny Depp. 

Assim como Lynnot, Shane MacGowan é uma lenda da música irlandesa, sendo um dos primeiros a unir música celta folclórica com o punk, transformando a sua banda, The Pogues, em uma instituição de um subgênero chamado celtic punk.

Entre litros de bebidas, imagens de arquivo e algumas entrevistas, eles repassam a vida do músico e uma carreira que sempre oscilou entre o êxito e o fracasso. Sua trajetória foi marcada pelo sucesso e pela dependência ao álcool. Hoje, enfiado em uma cadeira de rodas e abraçado a uma garrafa de gin, Shane conta o que lembra. 

"All I Can Say", de Danny Clinch, Taryn Gould, Colleen Hennessy e Shannon Hoon, é uma espécie de homenagem ao Blind Melon, banda de um só sucesso nos anos 90 mas que ralou muito no underground antes de estourar, em 1995.

Shannon Hoon, o vocalista da banda, gravou o dia a dia do grupo entre 1990 e 1995  com uma filmadora e reúne uma impressionante crônica em primeira pessoa da vida daquele garoto de Indiana que chegaria ao estrelato. 

Restos de sua família e vida sentimental, a mudança para Los Angeles, o sucesso repentino, as turnês exaustivas, sua paternidade, as drogas pesadas, a fita é uma espécie de confessionário de um jovem inquieto e impulsivo em um mundo em transição. Ele morreria pouco depois do sucesso de overdose.

Da série "arqueologia do rock" surge "Fanny: The Right to Rock", de Bobbi Jo Hart. A primeira banda eminentemente feminina de rock a conseguir algum sucesso, no final dos anos 60, Fanny tinha como centro as irmãs filipinas Jean e June Millington, que se mudaram para a Califórnia com os pais.

Elas compunham, tocavam e produziam suas próprias canções, lançadas por uma gravadora independente no início dos anos 1970. 

Seu rock sofisticado e suave chamou a atenção de David Bowie, que quis apadrinhá-las, mas isso não aconteceu. Sofrendo com a falta de apoio e preconceitos, a banda acabou por volta de 1975, mas a lenda das meninas talentosas sobreviveu.

Para os fãs de metal a dica é "Metal: A Headbanger's Journey", de Sam Dunn, Scot McFadyen e Jessica Joy Wise, baseado em umaa pesquisa do antropólogo canadense Dunn. Por que milhões de pessoas ouvem um determinado estilo de música, se vestem de uma forma determinada e tem seus próprios códigos de comportamento?

Deste longa de investigação nasce um dos filmes mais celebrados do universo metaleiro. Sua história e sua evolução musical se confundem com a história do rock e da juventude das últimas cinco décadas.

Tom Araya (Slayer), Alice Cooper, Bruce Dickinson, Ronnie James Dio entre tantos outros falam sobre a música e o estilo de vida que influenciou gerações e gerações.

A devoção ao metal também é assunto de "Pakko Huutaa", filme da finlandesa Kaati Grönholm. O gênero musical é considerado patrimônio imaterial da Finlândia, já que se popularizou por seu caráter forte e facilmente identificável com traços da cultura local.  

O classic rock está presente na fita "Rockfield: a fazenda do rock", de Hannah Berryman, que conta a história de uma família de fazendeiros no interior do País de Gales que conseguiu montar - enquanto ordenhava vacas e ovelhas - um estúdio de gravação capaz de competir com o lendário Abbey Road, de Londres.

Com um grande senso de humor, os Ward e os músicos que por ali passaram contam esta divertida história. Lá aconteceu de tudo: Ozzy Osbourne correndo desenfreado com uma espingarda na mão, Freddy Mercury dando os toques finais em “Bohemian Rhapsody”, Lemmy Kilmister , do Motorhead, fazendo muita bagunça, as anedotas do Oasis encontrando seu “Wonderwall”, entre outras coisas.

Para reforçar a presença marcante das mulheres no rock, duas fitas merecem destaque. "Suzi Q", de 
Liam Firmager, repassa a carreira de Suzi Quatro, cantora e baixista que se tornou ícone do rock dos anos 70 depois de tocar em uma banda com suas irmãs. 

Pioneira como líder da banda num gênero infestado de machões, o rock pesado, ela apontou o caminho para Joan Jett, Kathleen Hanna entre tantas outras que a reverenciam até hoje.

"The Go-go’s", de Alison Ellwood, é uma deliciosa vagem à new wave americana que tem as Go-Go's como pilar, banda liderada por Belinda Carlisle. De origem punk, em pouco tempo, estavam dividindo palco com grandes nomes da cena californiana.  
 
O ponto alto do festival é a homenagem ao documentarista D. A. Pennebaker, talvez o melhor de todos os cineastas que se dedicaram aos documentários musicais. Serão exibidos os seguintes filmes do mestre:

** "Dont Look Back" - D. A. Pennebaker, Estados Unidos, 1967, 90 min. - Dont Look Back (sim, sem apóstrofe) é considerado um dos documentários musicais mais revolucionários de todos os tempos. Aqui, o diretor D. A. Pennebaker acompanha Bob Dylan durante sua turnê pela Inglaterra em 1965 e capta momentos da intimidade do artista que nunca mais voltaríamos a ver. Entre camarins, hotéis, entrevistas e deslocamentos, a câmera registra momentos espontâneos e retrata situações inusitadas que viraram uma referência no mundo do cinema. Com apenas 23 anos na época das filmagens, Dylan já tinha desenvolvido seu estilo próprio de lidar com a imprensa e com o público, o que rende muito pano pra manga.

** "Monterey Pop" - D. A. Pennebaker, Estados Unidos, 1968, 78 min. - O festival Monterey Pop realizado em 1967 é considerado por muitos o precursor dos festivais de música tal como os conhecemos hoje em dia. Com uma escalação de fazer suspirar qualquer amante da música pop, o evento reuniu 50 mil pessoas para ver artistas que estavam aparecendo naquele momento, como Jimi Hendrix e Janis Joplin, e estrelas já estabelecidas no cenário do rock, como The Who, entre tantos outros. Neste filme, o diretor D. A. Pennebaker registra os incríveis shows e conversa com o público para captar a emoção desta experiência pioneira.

** "Alice Cooper" - D. A. Pennebaker, Estados Unidos, 1970, 15 min. O registro da lendária banda Alice Cooper no início de sua carreira. Um show comovente e selvagem que virou uma de suas marcas registradas.

** "Daybreak Express" - D. A. Pennebaker, Estados Unidos, 1953, 5 min. - Um passeio na agora demolida IRT Third Avenue Line ("Third Avenue El"), na cidade de Nova York, em 1953. Filmado em 16mm por D. A. Pennebaker, com música de Duke Ellington, é uma das primeiras obras da carreira do diretor.

** "Lambert and Co" - D. A. Pennebaker, Estados Unidos, 1964, 15 min. - Dave Lambert era um músico jazz mais velho e muito independente. Quando Pennebaker o conheceu, ele tinha uma sessão marcada com a RCA e o cineasta foi acompanhá-lo. No fim das contas, a gravadora decidiu não ir em frente com o projeto e limpou as fitas. Mas o registro ficou para a posteridade e ajudou a manter viva a chama de músico que morreu pouco depois da gravação.

** "Little Richard" - D. A. Pennebaker, Estados Unidos, 1970, 28 min. - Depois da dissolução dos Beatles, John Lennon montou um grande show em Toronto com alguns dos seus ídolos. Entre eles, estava o verdadeiro rei do rock, Little Richards. Nesta performance extasiante, vemos por que sua lenda nunca parou de crescer.


 

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