Circularam imagens sem comprovação no final de agosto de pessoas gritando contra o fato de terem sido barradas em um show da cantora Demi Lovato no Brasil.
Uma das meninas que bradava contra os seguranças da bilheteria afirmava que a meia entrada, no evento, só era aceita para quem apresentava documentos emitidos pela UNE (União Nacional dos Estudantes) e Ciee (Centro de Integração empresa-Escola). Carteirinhas de faculdade, escolhas privadas de ensino médio, de escolas de inglês ou de cursos de pós-graduação não estariam sendo aceitas.
Policiais militares foram chamados, mas nada puderam (ou não quiseram) fazer. Restou o encaminhamento de denúncias a Procon da cidade de São Paulo.
O mesmo órgão registrou queixas de que, no mesmo show, ao menos dez pessoas tentaram entrar, com meia entrada, obtida por meio de ingressos destinados a idosos - e também foram barradas.
Oportunismo de um lado, desonestidade intelectual do outro: entidades adormecidas que supostamente reúnem empresas de entretenimento e produção de eventos saíram da hibernação para rugir contra a própria lei que estabelece a disponibilização da meia entrada.
Já tinham investido contra o benefício em 2020 quando participaram de evento sertanejo no Palácio do Planalto, em Brasília, em apoio ao nefasto presidente Jair Bolsonaro. Pediram explicitamente o fim do benefício, ganhando a simpatia do presidente inimigo da cultura. Essa gente parece estar se mobilizando novamente para atacar a meia entrada no Congresso Nacional.
Desde a sua criação, a legislação da meia entrada e suas variantes estaduais e municipais sofreram contestações por quem faz e promove os espetáculos - algumas delas justas, mas a maioria oportunistas e exageradas.
Aprovadas a toque de caixa e sempre a soldo de um oportunismo nojento por parte de políticos de todos os partidos, o conceito da criação do benefício foi engolido pelo "jeitinho" brasileiro, e dos dois lados.
Como as leis eram malfeitas e davam margem, deliberadamente, a muitas interpretações, cada um deu o seu jeito de aproveitar como pôde, desde as instituições estudantis do tipo UNE (União Nacional dos Estudantes), que tinha uma espécie de monopólio para a expedição das carteirinhas, até promotores de eventos que a quantidade de lugares para estudantes, já que a lei não fazia especificação.
Como o oportunismo é um traço marcante da sociedade brasileira, a lei não poderia dar certo. Ao longo do tempo, muitas empresas e promotores fecharam as portas ou mudaram de ramo depois que eventos tiveram 90% de vendas exigidas por estudantes portadores da carteirinha de meia entrada - qualquer carteirinha, de qualquer escola, de qualquer instituição.
O prejuízo era certo, ao ponto de shows serem cancelados e o dinheiro, devolvido. Como é possível um espetáculo ter 90% de ingressos requisitados por estudantes, que foram à Justiça para garantir tal direito?
Como exigir uma fiscalização rigorosa no momento em que um cidadão que alega fazer pós-graduação ou um caríssimo MBA exigir o desconto? Afinal, o benefício não foi criado para estudantes carentes?
A coisa ficou tão fora de controle que pessoas portando carteirinha de escolas de música ou de inglês pleiteavam descontos nos cinemas.
A coisa ficou tão fora de controle que pessoas portando carteirinha de escolas de música ou de inglês pleiteavam descontos nos cinemas.
Nos anos 2000, uma rede de cinemas foi obrigada a vender para uma sessão 70% dos ingressos, em um sábado, para estudantes portando a carteirinha da meia entrada. Nem mesmo as frequentes decisões judiciais que tentavam limitar os ingressos a 30% da capacidade do evento deu jeito na questão, já a decisão era frequentemente ignorada.
No capitalismo predatório que predomina no Brasil, o efeito colateral foi desastroso, tipo promoção de "black friday" (metade do dobro, como diz a piada): de uma hora para outra, os preços de ingressos triplicaram em shows nacionais e internacionais, impulsionados pela absurda taxa de conveniência e a compensação por conta da falta de limites na venda para estudantes.
No capitalismo predatório que predomina no Brasil, o efeito colateral foi desastroso, tipo promoção de "black friday" (metade do dobro, como diz a piada): de uma hora para outra, os preços de ingressos triplicaram em shows nacionais e internacionais, impulsionados pela absurda taxa de conveniência e a compensação por conta da falta de limites na venda para estudantes.
As muitas distorções que a lei da meia entrada criou, no entanto, não podem servir de argumento para empresários predadores e inescrupulosos que defendem simplesmente o fim do benefício, pura e simplesmente – típico de gente que é indigente intelectualmente e abomina o debate. Não é coincidência que isso se dê em tempos bolsonaros obscuros.
O então presidente presidente da Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (Abrape), Doreni Caramori Junior, foi um dos que endossou a campanha contra a meia entrada no evento no Palácio do Planalto, em 2020. Um dos seus argumentos é que o benefício é uma "injustiça histórica".
O então presidente presidente da Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (Abrape), Doreni Caramori Junior, foi um dos que endossou a campanha contra a meia entrada no evento no Palácio do Planalto, em 2020. Um dos seus argumentos é que o benefício é uma "injustiça histórica".
"Meio livro não existe, meia bicicleta não existe. Não pode o Estado brasileiro intervir na economia e tomar 50% sem nenhum tipo de compensação", reclamou o presidente da Abrape em declaração reproduzida pelo jornal O Globo.
É o tipo de reivindicação que soa como música para o autoritário Bolsonaro, em guerra cultural permanente com todos, e para os incompetentes da Secretaria de Cultura do Ministério do Turismo, loucos para ceifar benefícios para agradar ao inacreditável ultraliberal ministro da Economia, Paulo Guedes, e aos empresários predatórios do setor.
É o tipo de reivindicação que soa como música para o autoritário Bolsonaro, em guerra cultural permanente com todos, e para os incompetentes da Secretaria de Cultura do Ministério do Turismo, loucos para ceifar benefícios para agradar ao inacreditável ultraliberal ministro da Economia, Paulo Guedes, e aos empresários predatórios do setor.
É claro que se trata de um vespeiro, mas é necessário rever muitos pontos da lei da meia entrada justamente pra evitar que oportunistas e inimigos da cultura e dos pobres saiam dos esgotos para pleitear o fim de algo que é, essencialmente, tão bom para a cultura e para o país.
Os desvios e distorções da lei nunca foram revisados ou corrigidos porque muita gente se beneficiava das brechas. Politicamente, também era interessante para vários nichos parlamentares e instituições sociais que ganhavam muito dinheiro com monopólios na emissão de carteirinhas.
Os desvios e distorções da lei nunca foram revisados ou corrigidos porque muita gente se beneficiava das brechas. Politicamente, também era interessante para vários nichos parlamentares e instituições sociais que ganhavam muito dinheiro com monopólios na emissão de carteirinhas.
Neste ponto, a esquerda tem enorme culpa, já que nem o PT, nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, quiseram mexer no caso para não "melindrar" aliados de dentro e fora do partido.
O resultado: precedentes abertos para todo o tipo de oportunismo no intuito de acabar com o benefício. A meia entrada precisa de novos e urgentes debates para evitar a sua extinção. Essa é uma tarefa que precisa ser encampada por todos os agentes que trabalham com entretenimento para barrar os arautos do atraso e das trevas.
O resultado: precedentes abertos para todo o tipo de oportunismo no intuito de acabar com o benefício. A meia entrada precisa de novos e urgentes debates para evitar a sua extinção. Essa é uma tarefa que precisa ser encampada por todos os agentes que trabalham com entretenimento para barrar os arautos do atraso e das trevas.
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