Marcelo Moreira
Pete Townshend (FOTO: DIVULGAÇÃO)
Quando Pete Townshend, guitarrista do Who, lançou o clipe para sua música solo "Rough Boys", foi questionado a respeito de cultura masculina da violência e da "irmandade" que brota em muitos ambientes, às vezes se confundindo com uma "ambientação homoerótica".
Era 1980 e o músico não fugiu da pergunta, admitindo de certa forma que a tal interpretação era possível e assumindo, veladamente, que teve certas "inclinações" a sentimentos por "pessoas do mesmo sexo". Algum tempo depois, desmentiu o que disse e afirmou que eram apenas reflexões sobre a sexualidade.
Na sua autobiografia, "Who I Am", lançada por aqui em 2015, menciona suas "impressões" sobre o tema de leve, afirmando que entendia o desejo "pansexual" por Mick Jagger e dá a entender, sem ser explícito, que tinha uma "quedinha" pelo amigo no fim dos anos 60 e que o via como o "máximo símbolo sexual do rock".
Não chega a surpreender a sua declaração desta semana a respeito de que "provavelmente foi um pansexual" nos anos 70, "mas hoje não mais". "Acho que provavelmente iria para a cama com qualquer um que me aceitasse", disse o músico à revista Rock Cellar.
Nada contra a declaração em si, ainda mais nestes tempos em que o preconceito e a homofobia são combatidos de forma veemente, como sempre deviam ter sido. O que irrita é a ambiguidade e as insinuações.
Iria para a cama com homens? Foi ou não foi? É bissexual, como muita gente do rock inglês dos anos 60 e 70 insinuou por décadas? Já que desandou a falar besteiras nos últimos tempos, qual a dificuldade em assumir que teve relações homossexuais?
Lembrando que ele foi casado por 26 anos com Karen Astley, com quem teve três filhos - Emma, de 52 anos, Armintha, de 50, e Joseph, de 33, além de uma neta de 10 anos. Está casado desde 1995 com a pianista Rachel Fuller, de 47 anos.
Será que isso pode ter algo a ver com as acusações de pedofilia de 2003 que sofreu (foi inocentado tempos depois)? Ou com os abusos sexuais que contou ter sofrido na infância?
São declarações que precisam ser lidas com cuidado para não dar palanque a um idoso de 76 anos que parece estar necessitado de atenção em tempos de pandemia.
Quem não se lembra das declarações de 2018 quando afirmou que sentia certo alívio por não ter mais de tocar com Keith Moon (bateria) e John Entwistle (baixo), ex-integrantes do Who mortos respectivamente em 1978 e 2002?
A explicação? "Era difícil que seguissem o que a música pedia, especialmente ao vivo, com suas variações e improvisações. Hoje é mais fácil com os caras ótimos que temos na banda, a coisa flui como tem que ser."
Claro que isso caiu como uma bomba e Townshend sofreu críticas pesadas até mesmo do único companheiro original de banda vivo, o vocalista Roger Daltrey. Tentou consertar algum tempo depois dizendo que tinha sido mal interpretado, que é "claro que sentia muito a falta dos amigos mortos". Quis apensa comparar dinâmicas musicais e estilos de performance...
Também não foi convincente a tentativa de explicar os motivos de não cancelar ou mesmo adiar a turnê americana de 2002 quando da morte de Entwistle três dias antes do primeiro show.
A primeira providência que tomou, quando soube do ocorrido, foi ligar para o País de Gales e convocar o amigo Pino Palladino para substituir o baixista morto.
Sites de fofoca britânicos publicaram á época que Townshend deixou escapar em uma entrevista que se sentia meio "traído" por Entwistle ter exagerado na bebida e nas drogas - a causa da morte foi ataque cardíaco por excesso de consumo de cocaína. Ele desmentiu que tivesse dito tal coisa, mas esse depoimento acabou soando sem convicção.
Pode ser inconsciente, mas o guitarrista repete as travessuras de David Bowie na época do personagem Ziggy Stardust, quando afirmava abertamente que era bissexual, depois homossexual, para bem depois desmentir tudo e insinuar que tudo não passava de marketing.
Ao insistir neste comportamento ambíguo e sem sentido em 2021, Townshend acaba colocando lenha em uma fogueira fadada à extinção, como se houvessem mil implicações e obstáculos para admitir uma bissexualidade ou mesmo algumas relações homossexuais. Soa anacrônico e fora de contexto.
Por fim, existe a questão musical em si, que certamente ficará em segundo plano diante de mais rodeios e estímulo a boatos por conta de sua sexualidade. Parece que viria mais um disco do Who em breve, mas quem se importa com as fofocas e sensacionalismo extra-palco?
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