Marcelo Moreira
O improvável músico que se juntou a uns moleques estúpidos apenas para ganhar dinheiro. Um veterano que só foi aceito por ter um bom equipamento. Um baixista quietão que só tinha interesse em viajar pelo mundo.
Bill Wyman brinca com essas "definições" a seu respeito no documentário "The Quiet One", sobre a sua longa carreira como baixista dos Rolling Stones e sua aposentadoria meio que precoce, em 1992.
Aos 85 anos de idade, é o decano do rock ainda vivo. Mais velho do que ele, só dois bluesmen que se aproximam dos 90 - John Mayall e Buddy Guy.
Discreto, sereno e inteligente, Wyman nunca fez questão de ser símbolo de nada, por mais que espante a sua nvitalidade. Foram 30 anos dedicados aos Stones, com muita balbúrdia, aventura e boas histórias, mas ele não troca sua vidinha atual de velhinho aposentado em bisca da vacina contra a covid-19.
Fora da vida musical, com dinheiro no bolso e esposas sempre mais novas, deu-se o direito de ficar tomando conhaque em casa e se divertindo com seu enorme arquivo musical e visual relativo a sua carreira. Passa semanas remexendo nas películas e em fitas cassete mofadas em busca de raridades.
William Perks, seu nome verdadeiro (nunca se deu bem com o pai), realmente era um improvável músico a se juntar aos iniciantes stones em 1962. Sete anos mais velho do que os garotos, já era casado, com filhos e tendo de batalhar duro em empregos maçantes, embora mantivesse impecável suas roupas e seus equipamento.
Todo mundo estranhou em ver o tiozão tocando com os furiosos garotos amantes do blues, mas seu baixo casou também com o som deles que a banda seria menos sólida sem ele e o baterista Charlie Watts, também mais velho que os garotos da linha de frente e com uma promissora carreira como designer gráfico na publicidade.
O tiozão encarou com serenidade e resignação os seus 30 anos de Rolling Stones. A fama proporcionou vida boa e dinheiro, além de alguns escândalos, como o de namorar uma menina de 13 anos quando tinha 51. Mandy viria a ser sua esposa anos depois, mas apenas por alguns meses.
Diante do sucesso da banda, teve de engolir o fato de que não haveria espaço para suas composições - foram apenas duas, sendo que cantou em uma delas, "In Another Land".
Capa do primeiro álbum dos Rolling Stones, de 1964: Wyman é o primeiro sentado à esquerda (FOTO: REPRODUÇÃO) |
Em um acordo bom para todos, foi o primeiro stone a lançar um disco solo, em 1974, sem grande repercussão, e foi assim ao longo da vida com a banda. Ninguém o perturbava, e ele não se metia nas brigas entre Mick Jagger e Keith Richards.
A solidez que conferi às músicas dos Rolling Stones era tanta que ninguém o direcionava nos ensaios. Fazia o que queria em arranjos de baixo para novas músicas e nunca era contestado. Todo mundo gostava.
Essa foi a maior razão para que houvesse uma grande comoção em 1992, quando houve o anúncio de sua saída do conjunto depois de 30 anos. Ele havia alertado os companheiros, nas gravações de "Steel Wheels", de 1989, que aqueles seriam seus últimos momentos com o grupo. Ninguém levou a sério.
Ao fim da "Urban Jungle Tour",pela Europa, em 1990, ele cumpriu a promessa. Avisou que estava se retirando e desejou boa sorte. Não atendeu aos telefonemas dos empresários meses depois para que gravasse duas músicas inéditas pra a versão em CD de "Flashpoint", o disco ao vivo da turnê mais recente. Teve de ouvir desaforos ao telefone de Keith Richards - "um stone só sai da banda demitido ou em um caixão". Wyman apenas riu.
Apesar de uma aposentadoria precoce para os padrões atuais, o baixista não se importou. Abriu um restaurante temático chamado "Sticky Fingers" em Londres (nome de um álbum dos Stones, o que irritou ainda mais Richards) e de vez em quando chama alguns amigos da pesada do rock e do blues da Inglaterra para gravar discos sob o nome Rhythm Kings, que faz shows esporádicos.
Restauranteur, baixista ocasional e memorialista dos Stones, Wyman quer paz e sossego. Teve a melhor vida que poderia esperar ter para um garoto que teve de suportar problemas familiares sérios e situações difíceis, como os bombardeios alemães sobre Londres na II Guerra Mundial. Mais do que um sobrevivente, tornou-se uma lenda do rock, e de forma literal, para sua suprema contrariedade.
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