quarta-feira, 2 de junho de 2021

Ódio e preconceito: ataques a Júnior Groovador revelam o pior do rock

 Marcelo Moreira

Uma sociedade que precisa constantemente fazer campanhas e alertas antirracistas e contra vários tipos de preconceitos é uma sociedade com nível profundo de deformação da caráter e ética e moralmente deficiente nas relações pessoais.

O mais novo e nojento exemplo ocorrido no Brasil em um final de semana prolífico de cenas asquerosas tem a ver com a música e, infelizmente, com o rock.

Uma mera brincadeira, uma enquete realizada por um site bacana de informação, análise e eventos, se transformou em uma saia justíssima por conta do ódio de um imbecil que destilou ódio e preconceito contra um músico nordestino.

Júnior Groovador é um músico amador potiguar que ganhou o mundo quando aparecendo nas redes sociais tocando seu baixo gordo e trovejante em versões inusitadas de clássicos do rock, entre eles do Nirvana. 

Chamou tanto a atenção que acabou convidado a tocar com a banda Foo Fighters no Rock in Rio 2019, e foi ovacionado pela multidão, além de ser reverenciado pelo guitarrista e vocalista Dave Grohl. 

O seu sucesso foi tão grande que decidiu abandonar a profissão de segurança patrimonial e investir em uma carreira musical em banda de forró e MPB, além de produtor.

O site Wikimetal aproveitou o fato de que o baixista Dave Ellefson foi demitido do Megadeth para afzer uma enquete para saber qual músico poderia ocupar a vaga, mas em tom de brincadeira. Na lista, Junior ganhou destaque, angariando o "apoio" de Kiko Loureiro, guitarrista do Megadeth, que meio que entrou na onda.

Júnior Groovador (FOTO: ARQUIVO PESSOAL/REPRODUÇÃO INSTAGRAM)

Júnior ficou lisonjeado pela lembrança feita pelo Wikimetal e por dezenas de outros sites e resolveu brincar nas redes sociais ao gravar um vídeo, em um estúdio, tocando uma música do Megadeth em ritmo nordestino, misturando forró e axé.

E não é que um dejeto humano apareceu nas redes sociais próprias e do Wikimetal atacando pessoalmente Júnior Groovador e a iniciativa da enquete, utilizando termos preconceituosos contra nordestinos e, de certa forma, músicos brasileiros?

Nós, do Combate Rock, não chegamos a ver a mensagem ofensiva. Mas outros veículos denunciaram a fala preconceituosa: "O lugar desse Paraíba é na Paraíba, de onde nunca deveria ter saído".

Ficamos indignados com o fato de o Wikimetal ter de vir a público, por meio de nota na internet, pedindo desculpas pela mensagem ofensiva publicada - e prontamente deletada. 

De forma elegante e serena, o baixista do Rio Grande do Norte respondeu ao ataque - clique aqui para ler o que ele escreveu nas redes sociais.

A doença moral que afeta a nossa sociedade ficou mais exacerbada com a eleição de 2018, quando o fascismo e o autoritarismo ganharam destaque de forma negativa e absurda, culminando com a eleição do nefasto presidente Jair Bolsonaro e uma série de deputados federais e senadores de extrema-direita, representando o que de pior existe em nosso país.

Preconceito, ódio e discriminação ganharam a ordem do dia e parcela expressiva da população brasileira passou a manifestar orgulho de sua própria ignorância, fazendo uso de toda a sorte de ignomínias para apoiar políticos fascistas de todos os naipes.

Nunca, na história de nossa sociedade, ocorreram tantos casos, e de forma tão explícita, de homofobia, racismo e discriminação contra nordestinos pobres como nos últimos dois anos - coincidentemente, período que compreende o governo nojento e asqueroso de um presidente absurdo que se orgulha da própria ignorância e que ataca a democracia, o conhecimento, a ciência, a cultura e as artes. 

Se tudo isso ocorre quando se trata apenas de uma enquete feita na brincadeira, o que não ocorrerá de foma mais séria e objetiva em assuntos importantes? Como deixamos a doença avançar a tal ponto de apodrecer moralmente a nossa convivência?

Júnior Groovador é um típico personagem/celebridade de redes sociais e de internet. Não passava de um meme viralizado que ganhou a sorte grande ao ter reconhecido desempenho até certo ponto impressionante em seus vídeos. Teve a vida mudada por conta dis so e tenta aproveitar a bonança. Nem de longe está fazendo algo errado ou ilícito e não merece os ataques racistas e preconceituosos que hora aparecem nas rede sociais.

Como músico, é divertido e demonstra certa habilidade n baixo, por mais que abuse dos "exageros", digamos assim. Se John Entwistle, do Who, o melhor baixista de rock de todos os tempos, era criticado pelos companheiros de banda por conta do "excesso de notas" ao vivo, podemos dizer que Júnior Groovador peca pelo excesso de firulas nas versoes roqueiras que produz,

Por outro lado, põe a criatividade para funcionar quando resolve misturar as levadas regionais com o rock e dar uma cara curiosa a clássicos da música em geral. Nem sempre el acerta ao descaracterizar certas canções, mas quando acerta, como no caso das canções do Nirvana, chama a atenção pela criatividade.

Não há como prever que uma simples enquete em tom de brincadeira possa desencadear uma torrente de lixo preconceituoso, por mais que devêssemos estar precavidos com as frequentes correntes do ódio que dominam a nossa sociedade atual.

Assim sendo, parabéns ao Wikipedia pela postura ética diante do lamentável ocorrido e pela grande ao tratar o músico Júnior Groovador após os ataques.

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