domingo, 23 de maio de 2021

Discriminação, abusos e assédio: o acidentado caminho das mulheres na música



Uma pesquisa muito interessante feita com mulheres que fazem música mostra uma triste realidade: a discriminação e o abuso em todos os sentidos são uma constante na vida delas no exercício da atividade.

O levantamento foi lançado em março, junto com a apresentação da edição 2021 do relatório Por Elas Que Fazem a Música - uma iniciativa da União Brasileira de Compositores para medir a participação feminina entre os associados.

Foram ouvidas 252 mulheres dispostas a contar em mais detalhes sua realidade num meio que é silenciosamente hostil a elas. Prova disso é que 79% disseram ter sofrido discriminação de gênero em algum momento da sua carreira. 

Muitas deixaram depoimentos sobre pequenos e grandes embaraços ligados ao simples fato de serem mulheres. Vamos ler alguns deles:

"Em uma entrevista de rádio me perguntaram por que eu, cantora sertaneja, não chamo um homem para fazer dupla comigo. O entrevistador disse que, ao estar acompanhada de um homem, seria mais fácil vender show e até mesmo um empresário investir em mim."

"Em inúmeros eventos, eu sou a única mulher trabalhando no backstage".

"Basta você dizer que é compositora para ser desacreditada. Mulher cantando é até aceitável, mas compondo, acham que não temos competência".

"Em algumas entrevistas, as perguntas técnicas acerca da composição de música ou de dificuldades da banda eram direcionadas apenas aos meus companheiros de banda. Minhas perguntas eram mais relacionadas ao que eles consideravam do ''mundo feminino".

"Colegas músicos frequentemente não escutam minhas opiniões por acharem que não tenho muito a acrescentar, apesar de eu ser graduada em música pela Universidade Federal da Bahia e ter vasta experiência no mercado".

"Já fui chamada de puta enquanto cantava".

"Nasci como artista no meio gospel, onde o machismo ainda não é tão condenado e as próprias mulheres reforçam atitudes que diminuem a mulher. Sempre que meu esposo viajava comigo, mesmo apenas me acompanhando, a presença e a figura dele eram muito valorizadas, e os líderes sempre o mencionavam e falavam dele".

"Fui tirada de uma banda por crerem que mulher não sabe tocar bem."

"Recebi o cachê mais baixo que o combinado pelas gravações de voz de um disco completo. Eu era a única mulher da banda e atuava como cantora/intérprete. Até hoje não recebo pelos direitos conexos."

"Em várias ocasiões, na hora de dirigir a minha banda, enfrento desconfiança e questionamentos à minha autoridade. Depois, passa, mas sempre há uma resistência inicial."

"Sempre me perguntam se sou mesmo a compositora e a arranjadora das minhas músicas. Frequentemente ficam muito surpresos quando digo que produzo."

"Um rapaz, perguntou, uma vez, ao olhar minha composição: 'você escreveu isso?'."

"Trabalhei em um estúdio de música, e, por eu ser técnica de som, a maioria dos artistas não respeitava meu trabalho, sempre era 'o ver para crer'."

"Antes do show, houve um problema técnico com o som. Pedi explicação. Na hora de explicar, não olhavam para mim, responderam a todos os outros homens que estavam lá, menos a mim, que fiz a pergunta."

"Dentre várias situações, me lembro de uma vez que fui ensaiar em um estúdio com a minha banda, na qual todas somos mulheres. Demos de presente ao dono do lugar nosso primeiro EP. Ele perguntou quem tinha gravado os instrumentos."

"Já ouvi tantos absurdos, mas alguns dos que mais me marcaram foram falas do tipo 'além de bonita, ainda canta'; e 'é bom ela ficar na frente, enfeita o palco'. Também já fui descartada por um produtor quando descobriu que eu não estava solteira."

"Produtores já interromperam a minha fala várias vezes."

"Homens tentaram aproximação afetiva quando minha abertura foi apenas para relação profissional."

"Homens já tentaram me explicar como regular meu próprio instrumento, querem nos ensinar a tocar, fazem comentários de cunho sexual e, muitas vezes, acham que estamos acompanhando alguém da banda, e não que somos a própria banda."

"Nas rodas de samba, fui discriminada. Ali, os homens se sentem a grande atração."

"Sinto também discriminação por ter iniciado a minha carreira aos 60 anos."

"Já fui excluída de projetos pelo simples fato de ser mãe sola."

"Já vivi situações de não ser levada a sério. Ser ignorada por técnicos de som, na passagem de som para um show. Já fui assediada e tratada sem a devida importância, por ser mulher e ser negra."

"Fui impedida de acessar o meu próprio equipamento porque o cara do festival que estava responsável por vigiar não sabia que era uma mulher que ia usar, estava esperando um homem que jamais chegou."

"Comecei cantando hip hop em 1998, no Rio, não havia muitas mulheres nesse cenário. Os homens não nos deixavam subir ao palco, desligavam o som... Chegaram a me tirar do palco à força porque continuei cantando mesmo depois de terem apagado o som."

"Nos festivais, em sua grande maioria, o corpo de jurados é formado em sua totalidade por homens."

"Faço parte de uma banda com quatro homens, já me senti mal por ser chamada de 'patroa' e 'chata' ou 'mandona' por simplesmente expor meu ponto de vista, administrar a banda como qualquer sócio. Já senti uma pressão para usar certos tipos de roupa e me colocar mais como um sex symbol, na visão deles."

"Quando o contratante é um homem, ele já cresce pra cima de você."

"Em um barzinho, enquanto um cantor se apresentava, eu pedi o microfone e cantei um pedaço da minha música que fala sobre empoderamento feminino. Todos aplaudiram muito, e ele, ao final, tentou me convencer a ceder minha música para ele gravar. Disse que faria muito mais sucesso na voz dele."

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