Marcelo Moreira
Keith Merson, Greg Lake e Cozy Powell em 1986 (FOTO: DIVULGAÇÃO) |
São raros os artistas que percebem a situação de esgotamento criativo e admitem que passam por tal problema. E mais raros ainda aqueles que tomam decisões radicais para mudar.
O tecladista inglês Keith Emerson teve essa sabedoria e reuniu coragem para convencer os colegas Greg Lake (baixo e vocal) e Carl Palmer (bateria) a encerrar o trio Emerson, Lake and Palmer no fim do auge da trajetória do grupo em 1980.
Quando houve a volta, seis anos depois, os fãs foram surpreendidos. O ELP voltava à ativa, mas o P não era Palmer, mas um certo senhor Powell – Cozy Powell, um dos melhores bateristas da história do rock, um substituto à altura para a lenda Carl Palmer.
E o trio virou Emerson, Lake and Powell, que lançou apenas um trabalho, em 1986. No entanto, o acordo mesmo ocorreu um ano antes, quando os ensaios começaram na Inglaterra, há 35 anos.
E surge um grande P como opção
Na época em Keith Emerson reunia forças para ao menos discutir a separação ou eventual hiato prolongado do trio, em 1980, Lake e Palmer tinham a mesma impressão, mas cada um deles estava reticente em abrir o jogo com os colegas, com medo de errar feio.
Emerson tomou a iniciativa de colocar o assunto na mesa. Aliviados, todos admitiram que era hora de parar por ali, após o os resultados decepcionantes do apenas mediado álbum “Love Beach”, de 1979.
Felizes, os três encerram o grupo sem dramas e partiram para novos projetos. palmer montou o Asia com John Wetton (ex-Uriah Heep e King Crimson), Steve Howe (ex-Yes na época) e Geoff Downes (tecladista com passagem pelo Yes). Emerson e Lake iniciaram carreiras solo.
Cinco depois, uma onda de nostalgia assolou o mundo do rock progressivo com o surpreendente sucesso da nova formação do Yes, ressuscitado em 1983 com pegada um pouco mais pop e totalmente estourado nas paradas com o álbum “90125″, puxado pelo megahit “Owner of a Lonely Heart”.
Greg Lake achou que seria uma boa ideia reativar o antigo trio, já que sua carreira solo não decolara. Não foi difícil convencer Keith Emerson, até então o mais reticente com a reunião.
Embora com carreira solo relativamente bem-sucedida e enfronhado na área de composição de trilhas sonoras para cinema, adorava os holofotes e estava ressentido por estar “esquecido” em um tempo onde o heavy metal cru e barulhento e o hard rock de cabelos de laquê dominavam tudo.
O problema era Carl Palmer, então líder do Asia, que se tornara um sucesso monstruoso com sua música pop derivada do rock progressivo, mas com bom gosto.
O baterista ficou tentado a se reunir com os antigos companheiros, mas não conseguiu se desincumbir dos compromissos com sua banda à época. ele tentou várias soluções, mas Howe e Downes pediram para que não saísse.
O jeito foi improvisar e achar outro P para reativar o ELP. A opção foi encontrada de fomra muito rápida e de forma consensual: Cozy Powell, um virtuoso da bateria com pegada forte e tendência a se envolver com projetos de música pesada. O currículo era impressionante: o obscuro mas ótimo Bedlam, Jeff Beck Group, Rainbow, Whitesnake, Roger Daltrey, Black Sabbath, Michael Schenker Group, Gary Moore…
O entrosamento não foi difícil, já que Powell era muito profissional e excelente músico. No final de 1985 o acordo foi selado e o trio logo entrou em estúdio para gravar o único álbum da banda, “Emerson, Lake and Powell”, de grande repercussão e bom desempenho nas emissoras de rádio de paradas de sucesso, ancoradas na música power progressiva “Touch and Go”, sucesso imediato.
Outras ideias muito boas estavam no disco, como a excelente “The Score”, totalmente progressiva, com ares setentistas, mas com sonoridade moderna e um show de exibicionismo de Emerson.
Para compensar a dispensável balada “Lay Down Your Guns”, um monumento erudito em forma de rock pesado e progressivo: “Mars, The Bringer of War”, do compositor austríaco Gustav Holst e parte integrante da sinfonia “The Planets”. Os três brilham na música, mas fica nítido que Powell foi o que mais se divertiu.
Tudo muito certo, tudo correndo bem. Só que o espírito nômade de Powell se manifestou novamente. Por mais que trabalhasse com dois músicos excelentes, sentiu que sua criatividade estava limitada. Por outro lado, Emerson ficou incomodado com o peso adicionado por Powell ao trio. Sentia saudades dos fraseados mais complexos e inventivos de Carl Palmer.
Lake compartilhava da opinião do tecladista, mas, ao contrário, estava curtindo a nova fase e a pegada pesada do substituto de Palmer. O baixista sempre foi o mais chegado ao mundo pop. De certa forma, era o menos erudito, o que não quer dizer mais fraco – muito pelo contrário.
O fato é que havia muito respeito profissional e musical entre os membros, houve profissionalismo ao extremo e a realização de um álbum muito bom e uma turnê bem-sucedida. Só que a química não era a ideal. Powell disse tempos depois que curtiu cada segundo trabalhar com os dois, mas que definitivamente o rock progressivo não era a praia dele. A separação foi consensual e inevitável.
A carreira dos músicos desde então foi tortuosa. Emerson tentou reunir o Emerson, Lake and Palmer em 1988, já que Carl Palmer havia deixado o Asia. O problema foi Greg Lake, que já tinha se comprometido com outros projetos – e também não mostrou muito interesse em voltar.
O jeito foi montar algo parecido com a parceria com Powell de dois anos antes. Para o lugar de Lake, foi convidado o multi-instrumentista norte-americano Robert Berry, em um projeto batizado de 3 (ou Three, em alguns países). Um único álbum surgiu, “The Power of the 3″, creditado na primeira prensagem, na Inglaterra, a Emerson, Berry and Palmer.
Mesmo com o fracasso completo do álbum, houve uma pequena e interessante turnê pelos Estados Unidos em 1989. Fim de turnê, fim de grupo. A reunião do trio original só ocorreria em 1992, com turnê mundial (que passou pelo Brasil) e um novo álbum, “Black Moon”.
Deu tão certo que o grupo manteve a pegada até 1998, quando nova separação ocorreu, desta vez não de forma muito amigável. Emerson reclamava na internet que Lake não se dedicava à banda e à evolução musical como ele e Palmer.
Todos retomaram suas carreiras solo, com Lake tocando com Ringo Starr em 2001 e depois paulatinamente diminuindo suas atividades. Em 2004 tocou baixo na música “Real Good Looking Boy”, a primeira música inédita do Who desde 1988.
Palmer criou a sua Carl Palmer Band e foi o cabeça da reunião da formação original do Asia em 2007. Emerson voltou-se para o jazz e para o blues em sua carreira solo.
O trio fez uma última aparição no High Voltage Festival em 2010, em Londres, quando comemorou os 40 anos de criação do trio. Os três disseram que nunca mais o ELP vai se reunir. Acertaram na previsão: Emerson se suicidou aos 71 anos de idade no começo de 2016, e Lake morreu de câncer, aos 68 anos, no final do mesmo ano.
Já Cozy Powell manteve-se altamente produtivo após a colaboração com Lake e Emerson. Fez parte do Black Sabbath entre 1989 e 1991. Deveria fazer parte da formação da banda que resgatou Dio, a que gravaria o álbum “Dehumanizer”, lançado em 1992, mas caiu de um cavalo às vésperas da gravação e quebrou a bacia. Voltaria a tocar o grupo em 1995, mas só no álbum “Forbidden”. Na turnê, quem tocou foi Bobby Rondinelli.
Após dois anos tocando com uma nova encarnação da banda pop Fleetwood Mac, mudou radicalmente e se tornou o baterista do guitarrista sueco de heavy metal Yngwie Malmsteen, mas tocou pouco na turnê daquele ano, pois teve uma lesão séria no pé e teve de abandonar o barco.
Apaixonado por velocidade, tinha uma pequena coleção de carros esportivos. Foi a bordo de um deles, um modelo Saab, que morreu na hora ao espatifá-lo em 1998 contra um guard-rail em uma estrda nos arredores de Bristol, na Inglaterra. Segundo sua namorada, ele estava ao telefone celular com ela na hora da colisão. Powell tinha 51 anos de idade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário