domingo, 9 de maio de 2021

Ronnie Lane, 75 anos: o bardo moderno do rock inglês

 Marcelo Moreira



De astro do rock a referência na música folk até ter a carreira abreviada por conta de uma doença degenerativa. 

Poderia ser uma história edificante de superação, mas não passou de uma luta pela sobrevivência por quase 20 anos. E então o inglês Ronnie Lane ficou maior do que a própria vida ao virar referência na busca por recursos para estudos e tratamento de várias doenças degenerativas.

Só que era tão querido e gente boa que conseguiu reunir no mesmo palco, por vários shows, os guitarristas Eric Clapton, Jimmy Page e Jeff Beck, que sempre foram amigos, concorrentes e rivais. Ninguém mais teve essa capacidade.

Lane morreu em 1998, aos 51 anos de idade, de problemas cardíacos decorrentes da esclerose múltipla, doença degenerativa descoberta em 1979. 

Diante das limitações se do avanço da doença, engajou-se em ma série de campanhas de esclarecimentos e de de busca de tratamentos para amenizar os efeitos da degeneração. Se estivesse vivo, completaria 75 anos neste mês de abril.

Apesar de ser gente boa, tinha personalidade forte e gostava de controlar seus projetos e grupos com mão de ferro e os olhos na contabilidade. Também, odiava a irresponsabilidade dos companheiros de banda, bem como egos inflados.

Essa foi a maior de todas as razões para a implosão dos Small Faces em 1969. Banda influente e prestes e entrar em nova fase, mas séria e mais pesada, não resistiu aos embates entre Steve Marriott, guitarrista, vocalista e figura de maior proeminência na banda.

Pesou a inexperiência de todos, já que banda foi formada em 1965 quando os integrantes não tinham mais do que 20 anos de idade - Kenney Jones, o baterista, tinha 17. 

Resistindo aos contratos ruins e à tirania de empresários pouco preocupados com a música, o quarteto seguiu em frente enfileirando hits, a maioria associada ao movimento mod, do qual The Who se livrou rapidamente. 

Os Small Faces não tiveram tanta sorte, mas conseguiram bastante destaque com "All or Nothing", "Lazy Sunday", "Tin Soldier" e mais um punhado de singles bem bacanas.

Só que o mundo foi avançando e evoluindo e os Small Faces ainda estavam empacados naquela coisa de singles mais simplesinhos e alguns namoros com a psicodelia. Os concorrentes, no entanto, já estavam voando e lá na frente.

A vertente mais pop de Lane e do tecladista Ian McLagan começou a se chocar com as ideias psicdélicas encharcadas de soul e funk de Marriott, que começou a ficar cada vez mais distante da banda após o lançamento do excelente disco "Ogden's Nut Gone Flake", de 1968.

Na virada daquele ano houve o quebra-pau definitivo no camarim após um show e Marriott decidiu que estava fora. Não perdeu tempo e tratou de criar o Humble Pie ao lado do guitarrista Peter Frampton, do Herd, que seria uma banda mais pesada, mas hard, com todos os pés no blues.

O trio remanescente ficou perdido sem o guitarrista e vocalista. Sem líder, sem gravadora e sem uma carreira, pensaram em se tornar um trio com Lane nos vocais, mas então dois amigos recém-desempegados apareceram nos ensaios do Small Faces desfalcados.

Era um porão imundo no centro de Londres de propriedade dos amigos Rolling Stones e ali nasceu The Faces, com a inclusão de Rod Stewart nos vocais e Ron Wood na guitarra, ambos dispensados da primeira formação do Jeff Beck Group.

Stewart já tinha iniciado uma carreira solo ue estouraria em 1970, mas isso não foi um problema. The Faces gravou quatro álbuns até 1973 e outros cinco como banda de apoio à carreira solo do vocalista no mesmo período.



A mistura de rock, blues e boogie deu tão certo que The Faces integrava o grupo das quatro maiores bandas do mundo na primeira metade dos anos 70, ao lado de Stopnes, Led Zeppelin e The Who.

Curiosamente, no auge dos Faces, Ronnie Lane decidiu que era o suficiente de rock and roll para ele. No final de 1972 ele saiu do grupo para encarar a sua persona de bardo do folk rock, trocando o baixo pelo violão e liderando uma banda que era apenas sua, o Slim Chance.

A fama aos poucos foi sumindo, mas o dinheiro que amealhou foi o suficiente para construir um estúdio móvel e comprar um ônibus de turnê bem equipado. E assim passou os seis anos seguintes rodando pela pela Inglaterra e pela Europa com sua banda de "ciganos", enquanto gravava discos em dupla com Ronnie Wood e Pete Townshend.

Com a descoberta da doença, dedicou-se ao tratamento para amenizar seus efeitos e se engajou em diversos empreendimentos de busca de recursos para estudos de combate à esclerose múltipla.

Amigo de todos, juntou uma enorme banda em 1983 para uma série de concertos na Inglaterra e nos Estados Unidos para arrecadar fundos para o combate à doença. Em quase todos o trio Clapton, Beck e Page encerrava a noite tocando "Layla" (Derek and the Dominos) e "Stairway to Heaven" (Led Zeppelin). Também participaram da turnê na íntegra ou tocando em alguns shows Joe Cocker, Steve Winwood, Bill Wyman (Rolling Stones) e Charlie Watts (Rolling Stones).

Lane nunca se destacou como virtuose do baixo, já que a guitarra era o seu instrumento original, mas sempre foi reconhecido como um dos grandes compositores pop ingleses. O disco "Rough Mix", de 1977, em que o divide com Pete Townshend, é um dos principais exemplos de sua maestria como compositor.

Nenhum comentário:

Postar um comentário